Machado de Assis, seu nome verdadeiro era Joaquim Maria Machado de Assis, ganhou a alcunha de “Bruxo” por conta de queimar num caldeirão cartas em sua casa que se situava exatamente no Cosme Velho[1], bairro do Rio de Janeiro.

Apesar de que o referido apelido só se efetivou realmente quando o poeta Carlos Drummond de Andrade fez o poema “Ao um bruxo, com amor”, quando reverenciava o escritor.

Afinal, o bruxo tinha mesmo dotes mediúnicos, pois em sua obra intitulada “Anjo Rafael” previu a existência de doença mental filie à deux ou delírio a dois, antes mesmo de ser descrita pela medicina.

A referida obra narra a história de uma filha que é, por assim dizer, contagiada pela loucura do pai, vindo também a enlouquecer. Muitos anos depois, a doença fora descoberta por estudiosos. Machado ainda propôs que a terapia adequada seria afastar o ente saudável do paciente que sofre de doença mental.

Machado de Assis era notável enxadrista, tanto que participou do primeiro campeonato brasileiro de xadrez, galgando o terceiro lugar. Sem dúvida, Machado era um homem de múltiplo talentos. E, era reconhecidamente galante.

Abordou o xadrez em 1864 no conto “Questão de Vaidade”[2] o que em razão da data faz supor que seu professor de xadrez provavelmente fora Arthur Napoleão que era pianista, compositor, e chegou a acompanhar ao Brasil, de volta de uma de suas viagens à Europa, a futura esposa de Machado, Carolina Xavier de Novais.

Aliás, sua esposa, Carolina apaixonou-se exatamente por seu charme e verve intelectual. E, a senhora era uma dedicada estudiosa dos grandes nomes da língua portuguesa. E, alguns pesquisadores apontam que ela efetivamente o ajudava na revisão gramatical de seus originais.

Machado ficou casado por trinta e cinco anos com Carolina Machado que era quatro anos mais velha do que ele, e não teve filhos. Com a morte da mulher, o escritor entrou em profunda depressão, tendo mesmo confidenciado isso em carta dirigida ao Joaquim Nabuco, in litteris: “Foi-se a melhor parte da minha vida, e aqui estou só no mundo”.

 

Inspirado pela Academia Francesa[3], organizou a fundação da Academia Brasileira de Letras e, em janeiro de 1897 fora eleito o presidente da instituição, mas não ocupou a cadeira número um. Por modéstia, ficou com a cadeira 23, José de Alencar é quem fora escolhido como patrono da Academia, indicado pelo próprio Machado.

Em 30 de setembro de 1933, o escritor Humberto de Campos traçou o perfil de Machado, in litteris: “Era miúdo de figura, mulato de sangue, escuro de pele, e usava uma barba curta e de tonalidade confusa, que dava ares de antigo escravo brasileiro, filho do senhor e criado na casa de boa família. Era gago de boca, límpido de espírito e manso de coração. E tornara-se pelo estudo e pelo trabalho o mais belo nome, e a glória pura e mais legítima, das letras nacionais”.

Aliás, em sua certidão de óbito, o escrivão Olímpio da Silva Pereira anotou, após sua morte que era um homem branco. Filho de pintor de paredes mulato Francisco José de Assis e da lavadeira portuguesa Maria Leopoldina Machado, nasceu na parte conhecida como a “Pequena África”, pois era local de forte presença de africanos, cujo denominação fora dada pelo sambista Heitor dos Prazeres, que era filho de uma das famosos tias baianas que habitavam o local.

Morreu em 29 de setembro de 1908 com sessenta e nove anos de idade com uma úlcera cancerosa na boca e, também de arteriosclerose generalizada, incluindo esclerose cerebral, o que, para alguns, é dado questionável pelo motivo de mostrar-se lúcida em suas derradeiras cartas já relatadas. Foi Rui Barbosa o encarregado de lhe fazer o elogio fúnebre em nome do governo, representado pelo Ministro do interior Tavares de Lyra.

Quanto ao embranquecimento dele, esclareceu Simone da Conceição Silva, em sua monografia intitulada “O preto-e-branco do escritor brasileiro. Machado de Assis, no plural ou singular?” apresentada no Instituto de Ciências Humanas e Filosofia da UFF (2001) que esclareceu que era comum no Brasil Imperial, o fotógrafo alterar a cor dos olhos e a cor da pele, segundo o gosto do freguês ao receberem encomendas para renovação química no laboratório de fotografias antigas, já amareladas. Tanto que a foto oficial do escritor aparece com a pele bem clara e barba e cabelos brilhosos.

Nas retrospectivas machadianas organizadas por entidades literárias da época e pelo governo Getúlio Vargas, o passado oculto de Machado saiu da obscuridade e ganhou atenção.

Machado de Assis escreveu cinco livros de poesias, sete de contos e dez de romances ao longo de seus sessenta anos. Também fora autor de mais de seiscentas crônicas, tornando-se um dos responsáveis pela popularização do gênero no Brasil. Também escreveu nove peças para teatro, entre 1860 a 1906.

 

Sua primeira fase literária é constituída por obras como Ressureição, A Mão e a Luva[4] e Iaiá Garcia[5], onde se identificam as características do Romantismo ou convencionalismo. Influenciou grandes autores como Olavo Bilac, Lima Barreto, Drummond de Andrade, Donald Barthelme entre outros.

Depois, assumiu posição mais madura e compôs sucessivamente o que viriam a ser suas principais obras. Introjeta-se no realismo na literatura brasileira através de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. A brusca mudança de Machado que foi estudada por biógrafos é entendida como suposta crise espiritual dos quarenta anos e da estadia que tivera que fazer para Nova Friburgo após a morte de sua esposa.

É considerado um dos grandes gênios da literatura bem ao lado de Dante Alighieri, Shakespeare e Camões. Consta ainda que utilizou pelo menos vinte e um pseudônimos, ao longo de sua vida. Mas, no final de sua carreira, publicou crônicas apócrifas em “A Semana”, porém não enganou ninguém, pois seu notável estilo era reconhecido pelos leitores.

Os estudiosos acadêmicos notaram cinco características fundamentais na obra machadiana, os elementos clássicos são o equilíbrio, concisão, contenção lírica e expressional, os resíduos românticos presentes nas narrativas convencionais ao enredo, as aproximações realistas compostas por atitude crítica, objetividade e temas contemporâneos, procedimentos impressionistas, tais como a recriação do passado através da memória e, anda, as antecipações modernas como o alusivo engajamento a um tema que admite diversas leituras e interpretações.

Há uma gafe histórica cometida na segunda edição de suas “Poesias Completas” publicada em 1902, quando a palavra “cegara” fora substituída pela expressão “cegara o juízo”, por um inusitado “cagara”. Reza a lenda que o próprio autor teria pessoalmente participado ativamente na maratona de revisão dos exemplares.

No entanto, alguns exemplares escaparam e foram vendidos antes da troca manual. Assim, um segundo lote chegou ao Brasil já retificado, originando três versões distintas, a saber: a original, uma contendo a correção manual e, ainda, outra com correção tipográfica. Todos os exemplares são considerados muito raros, sendo mesmo disputados como ouro por bibliófilos e antiquários.

Em 1888 fora condecorado pelo Imperador Dom Pedro II com a Ordem Rosa, sendo indicado para integrar a Secretaria de Agricultura e, anos mais tarde, chegou a ser diretor-geral da viação da Secretaria de Indústria, Viação e Obras Públicas.

A origem humilde Machado evidencia-se por seu avô que fora escravo de uma chácara do morro do Livramento, onde aliás, o escritor nascera e fora batizado pela dona da casa, D. Maria José de Mendonça Barroso. Foi na casa dessa senhora onde também aprendeu a lei.

Machado de Assis era epilético e apresentava sinais de gagueira, o que contribuíra para a formação de uma personalidade insegura e reclusa. Por ser mulato sofria muito preconceito na época, tenho sofrido também um embranquecimento proporcionado pela sociedade acadêmica da época e pela cultura brasileira.

Em 30 de setembro de 1933, o escritor Humberto de Campos traçou o perfil de Machado, in litteris: “Era miúdo de figura, mulato de sangue, escuro de pele, e usava uma barba curta e de tonalidade confusa, que dava ares de antigo escravo brasileiro, filho do senhor e criado na casa de boa família. Era gago de boca, límpido de espírito e manso de coração. E tornara-se pelo estudo e pelo trabalho o mais belo nome, e a glória pura e mais legítima, das letras nacionais”.

Aliás, em sua certidão de óbito, o escrivão Olímpio da Silva Pereira anotou que era um homem branco. Filho de pintor de paredes mulato Francisco José de Assis e da lavadeira portuguesa Maria Leopoldina Machado, nasceu na parte conhecida como a Pequena África, pois era local de forte presença de africanos, cujo denominação fora dada pelo sambista Heitor dos Prazeres, que era filho de uma das famosos tias baianas que habitavam o local.

Quanto ao embranquecimento dele, esclareceu Simone da Conceição Silva, em sua monografia intitulada “O preto-e-branco do escritor brasileiro. Machado de Assis, no plural ou singular?” apresentada no Instituto de Ciências Humanas e Filosofia da UFF (2001) que esclareceu que era comum no Brasil Imperial, o fotógrafo alterar a cor dos olhos e a cor da pele ao gosto do freguês ao receberem encomendas para renovação química no laboratório de fotografias antigas, já amareladas. Tanto que a fotografia oficial do escrito aparece com a pele bem clara e barba e cabelos brilhosos.

Nas retrospectivas machadianas organizadas por entidades literárias da época e pelo governo Getúlio Vargas, o passado oculto de Machado saiu da obscuridade e ganha o proscênio.

Num quadro onde fora retratado e pintado por Henrique Bernardelli, em 1905, há nítido embranquecimento de suas feições. Seus estudos sobre a sexualidade e a psiquê humana, trouxe o surgimento do existencialismo, consagrado principalmente em “O Alienista”, que pode ser comparável as obras de Freud e Sartre.

Harold Bloom o posicionou entre os cem maiores gênios da literatura mundial e, o considerou o maior literato negro surgido até o presente. Machado de Assis, enfim, preferiu ser como o sábio Conselheiro Aires, seu autorretrato e personagem dos seus dois últimos livros, pacífico, conciliador, anfitrião, observador, crítico ou neutro na maior parte dos assuntos.

Novamente sábio Machado de Assis, enxergava que tudo tinha sua mudança e, em uma de suas crônicas, escreveu: “Os dias passam, e os meses, e os anos, e as situações políticas, e as gerações, e os sentimentos, e as ideias”.

Nesse último 21 de junho, Machado de Assis comemoraria cento e oitenta um anos, senão tivesse sido eterno simplesmente por suas obras e estilo.

Aguardem o lançamento da obra intitulada Bruxo Jurídico, de minha lavra onde utilizarei como casos concretos as obras machadianas e discutiremos vários conceitos e valores do direito brasileiro.

Referências:

Machado de Assis. Biografia. Disponível em: http://www.academia.org.br/academicos/machado-de-assis/biografia#:~:text=Biografia&text=Machado%20de%20Assis%20(Joaquim%20Maria,da%20Academia%20Brasileira%20de%20Letras.  Acesso em 24.6.2020.

Machado de Assis. Vida e Obra. Disponível em: http://machado.mec.gov.br/ Acesso em 24.06.2020.

MARINHO, Fernando. “Biografia de Machado de Assis”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/biografia/machado-de-assis.htm . Acesso em 24 de junho de 2020.

Nova tradução de Machado de Assis nos EUA esgota em um dia. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2020/06/nova-traducao-de-machado-de-assis-nos-eua-esgota-em-um-dia.shtml  Acesso em 24.6.2020

[1] O nome do bairro é homenagem a Cosme Velho Pereira que era comerciante português da antiga Rua Direita, atual rua Primeiro de Março. E, no século XVI, o referido comerciante habitava a parte mais alta do Vale do Carioca, no caminho para o Corcovado, sendo sua chácara banhada pelo Rio Carioca, o que ocorre até os dias atuais.

[2] In: https://machadodeassis.ufsc.br/obras/contos/avulsos/CONTO,%20Questao%20de%20vaidade,%201864.htm

[3] Criada no ano de 1635 pelo Duque de Richelieu e de Fronsac, durante o reinado de Luís XIII, a Academia Francesa (Académie française) é uma das organizações mais tradicionais do país. É formada por quarenta membros e teve forte influência sobre a fundação da Academia Brasileira de Letras.

[4] A mão e a luva, escrito por Machado de Assis é o segundo romance do autor. Publicado em folhetim em 1874, encaixa-se no estilo de época do Romantismo e narra um caso de namoro complexo para os padrões burgueses.

[5] Iaiá Garcia foi o último romance de Machado de Assis.Com personagens femininas marcantes, o livro Iaiá Garcia apresenta: Dona Valéria, mãe de Jorge, que é apaixonado por Estela. Contrária ao romance entre os dois, manda o filho para a Guerra do Paraguai para acabar com o relacionamento.