Resumo:
Definitivamente, o direito é força cultural e dotada de notária função histórica que é o de impor normas de conduta ou padrões de comportamento social sobre a vontade individual. Cada norma isolada tem de ser explicada e elucidada: porque é comum aparecer de forma obscura. A despeito das escolas metodológicas, e do método científico de François Geny e Planiol, que surgiu uma resposta supostamente equilibrada aos excessos do racionalismo das correntes legalistas e conceitualistas, já que não marginaliza a razão, mas, procura articulá-la com elementos enraizados na realidade social. A lei não é a única fonte de direito embora se reconheça ser notoriamente a mais relevante, acrescentando que somente se deve recorrer as demais fontes, quando a lei não soluciona expressamente o caso.
Palavras-Chave: Positivismo Jurídico. Pós-positivismo jurídico. Pós-modernismo jurídico. Interpretação jurídica. Hermenêutica jurídica. Ciência do Direito.
Entender o Direito contemporâneo é, essencialmente, entender o neoconstitucionalismo e, toda a nomenclatura para indicar novo direito constitucional que possui pensamentos e tendências ora coincidentes e, ora até mesmo, antagônicos em relação ao constitucionalismo clássico. E, uma da primaz característica do neoconstitucionalismo é edificar-se sob a perspectiva filosófica pós-moderna e do pós-positivismo[1].
É a busca de identidade para esse pensamento jusfilosófico contemporâneo é problema que necessita e exige requintada investigação. O pós-positivismo foi basilar e orientador para a nobre tarefa de interpretação e concreção da legislação constitucional e, sendo identificado por doutrinadores contemporâneos que estudaram e compararam os mais diversos sistemas jurídicos.
Observa-se que muitas vezes o direito é responsável por sacrificar um de seus grandes objetivos – a justiça – em nome da segurança jurídica. E, a justificativa, se dá pelo contexto histórico que notabilizou a transição da Idade Média para a Idade Moderna, de meados do século XVIII ao início do século XIX, quando a sociedade humana reclama a imposição de limites ao poder concentrado e ilimitado do soberano.
Enfim, buscou-se impor barreiras aos arbítrios dos reis absolutistas. E, alguns deles, até encarnaram o próprio Estado, ao ponto de enunciar: Le Etat c’est moi[2].
Os movimentos constitucionais modernos de origem que remonta às criações da Constituição francesa de 1791 e da Constituição dos EUA de 1787 que trouxeram em seu bojo um mito do sistema jurídico: a lei. Esse majestoso instrumento conformador da liberdade dos cidadãos que passou a ser considerado o único a realmente legitimar a limitação dos seus direitos e, do Estado.
Somente a lei válida seria capaz de impor obrigações aos cidadãos e, se erigiu o primado da soberania popular[3] que ganhou extrema relevância e que são promovidos ao patamar de dogma. Um dogma composto de preceito e sanção.
O pensamento da época ao aduzir que a colocação da lei no patamar de um comando estratificado, abstrato e totalmente coercitivo, e atendia certamente ao reclamo da sociedade da época, em repúdio aos desmandos e extravagâncias produzidos pelo absolutismo.
E, qual era o reclamo da sociedade era a prover a limitação do soberano, a imposição de balizas às suas arbitrariedades. E, a lei passou a ser considerada a expressão máxima da soberania popular, soberania essa que é considerada a fundamental central para a criação dos Estados modernos.
O povo não poderia ser apenas o autor da Constituição, mas também tinha de ser o soberano, sem se deixar travar pela Constituição. A visão radical da soberania popular ganhou espaço e concretude.
A representação política, nesse contexto, tem como premissa a teoria da soberania nacional e a soberania nacional conduz a um governo representativo. os quais seriam então os únicos legitimados para confeccionar a maior expressão da vontade popular – a lei.
Esse pensamento foi imortalizado no art. 6º da Declaração francesa de 1789, o qual dispunha que a lei “é a expressão da vontade geral”. E continuava: “Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através dos seus representantes, para a sua formação”.
A lei, instrumento majestoso e conformador de toda liberdade dos cidadãos e que passa a ser o único meio a legitimar a limitação de seus direitos. Somente a lei válida[4] é capaz de impor obrigações aos cidadãos.
É a lei e o primado da soberania popular ganham tamanha importância que são alçados a um patamar de dogma. A lei é um dogma composto de preceito e sanção.
E, o pensamento da época informa que a colocação da lei no patamar de comando estratificado, abstrato e totalmente coercitivo atendia ao reclamo da sociedade da época, em repúdio aos desmandos e extravagâncias produzidos pelo absolutismo.
E, qual era o reclamo da sociedade: a limitação do soberano, a imposição de balizas às suas arbitrariedades. A lei passou ser considerada a expressão máxima da soberania popular, a soberania essa que é considerada o fundamento central para a criação dos Estados modernos.
O povo não poderia ser apenas o autor da Constituição, mas tinha de ser o soberano, sem, contudo, se deixar travar pela Constituição. A visão radical da soberania popular ganha espaço. E, neste contexto, a representação tem como ponto de partida a teoria da soberania nacional que conduz a um governo representativo.
A titularidade do poder passa a ser atribuída ao povo, mas para o seu exercício era necessária a delegação desse poder aos seus representantes, os quais seriam então os únicos legitimados para confeccionar a maior expressão da vontade popular, isto é, a lei.
Esse pensamento foi imortalizado no artigo 6º da Declaração francesa de 1789, o qual dispunha que a lei é a expressão da vontade geral. E, continuava: Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente, ou através dos seus representantes, para sua formação.
Com esses fundamentos, criou-se um ambiente extremamente favorável à supervalorização desse diploma legal. A lei adquire, assim, novo status, nunca visto na história da humanidade. Afinal, a sociedade necessitava afastar a abertura do sistema jurídico aos valores jusnaturais, uma vez que muitas atrocidades eram realizadas em nome do Direito e dos seus princípios naturais.
Assim munido desses fundamentos, criou-se um ambiente extremamente favorável à supervalorização do diploma legal. A lei adquire, então, novo status, jamais visto na história.
A sociedade realmente necessitava afastar a abertura do sistema jurídico aos valores jusnaturais, uma vez que muitas atrocidades eram realizadas em nome do Direito e de seus princípios naturais (religiosos ou não). Nesse contexto, buscava-se segurança jurídica[5] e objetividade do sistema, e o Direito positivo cumpriu fielmente bem esse papel.
Essa mudança, decorrente também da estruturação do Estado moderno, ocorreu sobre três pilares, a saber, o primeiro referente à posição da norma jurídica no sistema[6].
Como já foi mencionado, a lei passa a ganhar maior relevância jurídica que os postulados principiológicos ao ponto de afastar os princípios não positivados. Ou, pelo menos, retirar-lhe a força normativa. As normas de conduta passam a ser adstritas à lei, pela qual passa a ser o ponto central do Direito. O segundo trata de modo de confecção desse diploma normativo.
Antes desse momento, a lei não se formava a partir de construções teóricas, mas sim, de um estudo de casos concretos, resultante do legado romano. A formulação das leis passava por ciosa análise de casos concretos e das soluções aplicáveis aos mesmos.
Já na modernidade, as leis adquirem caráter mais denso de abstração, passando a expressar padrão de comportamento contido em uma relação obrigatória entre uma hipótese abstrata e sua consequência.
Numa cadeia social de causa e efeito. Passa a ser um comando estratificado, abstrato e totalmente coercitivo, não permitindo soluções criadas a posteriori de sua confecção, ou seja, os efeitos decorrentes da aplicação da norma são conhecidos anteriormente a sua concreção, o que atendia a uma necessidade de proteção dos indivíduos em face dos desmandos dos soberanos absolutistas. Enfim, ganha-se em segurança jurídica e objetividade.
Foi nesse contexto que surgiu o positivismo jurídico[7] em contraponto ao jusnaturalismo. Para aprofundamento na área filosófica, a origem histórica e espécies do positivismo jurídico, conforme aduz Norberto Bobbio[8] intitulada O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito.
O jusnaturalismo possui as seguintes características: 1) por valer apenas em alguns lugares, ao contrário deste, que vale em toda parte; 2) por ser mutável, enquanto este é imutável no tempo; 3) por ter fontes distintas deste; 4) por ser conhecido “através de uma declaração de vontade alheia (promulgação)”, em contrapartida a este, que é conhecido através da razão; 5) porque, em seu objeto, os comportamentos são por si mesmos indiferentes, “assumem uma certa qualificação apenas porque (e depois que) foram disciplinados de um certo modo pelo direito positivo”, enquanto neste os comportamentos são bons ou maus em si mesmos; e, por último, 6) em face do critério da valoração das ações: aquele estabelece aquilo que é útil, enquanto este, aquilo que é bom
O direito natural é empurrado para a margem da história pela ascensão do positivismo jurídico, no final do século XIX. O positivismo surge, portanto, em contrapartida ao jusnaturalismo com vistas a buscar a objetividade do sistema e, para tanto, equipara o direito à lei.
O Direito passa a ser produção da vontade humana a partir de sua criação pelo Estado através da lei. Conforme alerta Gustavo Biscaia de Lacerda (2009), esse pensamento teve o condão de embasar a superação do jusnaturalismo, a separação do Direito do divino e a limitação do poder soberano pela lei, bem como afastar a abertura do sistema jurídico aos valores jusnaturais, uma vez que muitas atrocidades tais como a caça às bruxas, a perseguição aos cientistas, e, etc. e, eram realizadas em nome do Direito e de seus princípios naturais (religiosos ou não).
Modernamente, é o direito centrado nas ideias de Augusto Comte e tem em Hans Kelsen e, posteriormente, em Hart o seu apogeu. Comte, é considerado por alguns doutrinadores, como o fundador do positivismo, abandona a busca de causas religiosas ou metafísicas para se concentrar na busca empírica nos próprios fenômenos observáveis, propondo a separação entre a Igreja e o Estado. E, o ponto principal de sua obra representa a tentativa de separar a religião de aspectos racionais.
E, Hans Kelsen, mais tarde, vem a coroar o positivismo iniciado por Comte, com sua Teoria Pura[9], estabelecendo o juspositivismo ou positivismo jurídico. Para Kelsen, o direito deveria ser considerado como tal, independente de outras ciências ou da moral.
As fontes do Direito têm que ser buscadas apenas no próprio Direito, excluindo-se as chamadas fontes extrajurídicas, tais como hábitos e costumes compartilhados, além de valores disseminados socialmente.
O estudo de Direito deveria ser desprovido de valores, a moral seria extrínseca ao ordenamento jurídico, mas, Kelsen não ignorou a carga valorativa que informa o fato jurídico, mas, simplesmente ressaltou a necessidade de o fenômeno jurídico[10] ser analisado como tal, inerentemente de outras áreas do conhecimento.
É de grande importância a posição dos valores na concepção de Direito em Kelsen[11]. E, para o filósofo, a norma superior sustenta a validade das normas inferiores, mas até onde? Questiona-se.
Esta cadeia de validade precisa encontrar o elemento de validade em uma última norma superior. Então, o fundamento de validade de todo o sistema se baseia na norma fundamental, que se mostra como fato produtor de normas, cuja essência é dinâmica, pressuposta, na qual todo conteúdo pode ser inserido no direito, e não se confunde com a Constituição, que é conteúdo estático desta norma.
A norma fundamental, pressuposta e dinâmica, insere-se no sentido lógico-jurídico de Constituição, enquanto a Constituição vigente, em sentido jurídico-positivo.
E, assim, a justiça estaria na própria lei, cabendo ao aplicador do direito aferir tão apenas a validade formal da norma e não a justiça ou correção de sua aplicação, uma vez que a norma fundamental que valida todo sistema é condição lógico-transcendente, desprovida de conteúdo valorativo.
A positivação da norma jurídica que fosse identificada como válida seria a forma de aferição do conteúdo material do direito, a verificação da validez da norma ocorre por meio de sua compatibilidade com a Constituição. Se determinado conteúdo do positivado, deve ser entendido como reto e justo (segundo Kelsen).
Sob essa perspectiva, o conteúdo valorativo de uma norma era dado pelo legislador, não cabendo ao hermeneuta a identificação do substrato axiológico da norma quando de sua aplicação concreta.
O ordenamento jurídico, para Kelsen, não contemplativa uma aplicação valorativa da norma, ou qualquer pauta de correção. A questão se limitava ao aspecto de validade da lei e não de seu conteúdo.
Se fosse válida, deveria ser aplicada conforme o legislador a concebeu. Alfonso García Figueroa (2009) destaca que, para Kelsen, “o direito pode ter ‘qualquer conteúdo’”, uma vez que a aferição de legitimidade tem um caráter formal.
Herbert Hart (1996)[12] contribui com o positivismo jurídico no que se refere à análise do critério de verificação da validade da norma – ponto central do positivismo. Em seu pensamento, que ganhou a análise e crítica de Dworkin (2002), informa que a validade da norma passa por sua aceitação como obrigatória pelo grupo por ela regido.
Outra inovação do autor é considerar duas espécies de regras: as primárias, de obrigação, dizem respeito ao que as pessoas devem ou não fazer, como formas de controle social; e as secundárias, em que se inclui a regra de reconhecimento, asseguram que as regras primárias possam ser criadas – se uma norma é válida, significa que ela satisfez aos critérios da regra de reconhecimento; categorias complexas não previstas por seus antecessores. Mas continua a entender o direito distante das questões valorativas ou morais.
Após a sua morte, Joseph Raz, seu discípulo, passa a ser o maior expoente vivo do positivismo jurídico.
Carl Schmitt[13] também advogou contrário a admissão da moral na concreção do Direito e, em sua obra intitulada “A Tirania dos Valores”, ou no título original, Die Tyrannei der Werte de 1960, o autor defende a ideia de que não é possível ordenar o direito e a política pelos valores, uma vez que estes têm uma forte expressão subjetiva.
Schmitt criticou o crescimento da relevância de valores excludentes e de flutuação livre nos contextos jurídicos, políticos e ideológicos.
Em síntese, a questão central para o positivismo jurídico orbita em torno da segurança jurídica[14], enquanto o ponto relativo à justiça da aplicação de uma norma restringe-se ao aspecto de sua validade, sob prisma formal (Kelsen, Joseph Raz, Hart, em sua visão anterior).
O aplicador do direito não realiza a verificação se os efeitos, quando da concreção, são bons ou ruins, justos ou injustos, há somente a aferição de sua validade, o sistema não adota uma pretensão de correção. Portanto, ratifica-se que os aspectos morais são extrínsecos ao direito.
E, na dicção de Dworkin[15], o positivismo pode ser resumido em três preceitos-chave: acreditar no direito como conjunto de regras especiais utilizado direta ou indiretamente pela comunidade com o propósito de determinar qual o comportamento será punido ou coagido pelo Poder Público., regras essas que são aferidas quanto a sua validade (pedigree); caso não se encontre uma solução dentro do direito (conjunto de regras) para um determinado fato, o aplicador da norma deve ir além do direito na busca de algum outro caso não se encontre uma solução dentro do direito (conjunto de regras) para uma determinado fato, o aplicador da norma deve ir “além do direito na busca de algum outro tipo de padrão que o oriente na confecção de nova regra jurídica ou na complementação de uma regra jurídica já existente”; e dizer que “alguém tem uma ‘obrigação jurídica’ é dizer que seu caso se enquadra em uma regra jurídica válida que exige que ele faça ou se abstenha de fazer alguma coisa. (…) Na ausência de tal regra jurídica válida não existe obrigação jurídica”.
O positivismo jurídico é então entendido como ciência da legislação positiva, que “pressupõe uma situação histórica concreta: a concretização da produção jurídica em uma só instância constitucional, a instância legislativa” (ZAGREBESLKY, 2007). Seu significado supõe uma redução de tudo o que pertence ao mundo jurídico, à lei, incluindo os direitos e a justiça, simplificação que concebe o trabalho dos juristas como mero serviço da lei, com a busca pura e simples da vontade do legislador
Aduz-se que o que se modifica com a transposição do direito natural para o direito positivo é o título da legitimação; já não é a autoridade dos doutores, senão a autoridade da fonte de produção, legislador como único legitimado à produção jurídica; não a verdade, senão a legalidade; não a substância, é afirmar, a intrínseca justiça[16], senão a forma de atos normativos.
Qual seria o papel dos princípios segundo essa vertente jusfilosófica? No positivismo, possuem natureza supletiva ou interpretativa, diferentemente, da fase jusnaturalista anterior, onde eles poderiam regular a conduta das pessoas. Sendo eminentemente supletiva, integradora sua natureza na medida em que se admite que o sistema de leis positivas é incapaz de regular e disciplinar todas as situações havidas na vida cotidiana.
Os princípios, como vetores axiológicos detinham outras funções: eram utilizados para dirigir a interpretação dos operadores do direito, orientar o legislador e, também como uma espécie de lex legum, garantindo homogeneidade na sucessão das leis.
Dessa forma, os princípios entram nos textos legais como fonte normativa subsidiária e são inseridos nas normas positivas, bem como em textos teóricos, mas com posição supletiva ou interpretativa.
Nessa perspectiva, os princípios são autênticos “tapas buracos” do sistema jurídico. Zabrebelsky demonstra com clareza qual era a posição dos princípios segundo essa corrente.
As normas de princípio, seria contenedoras de fórmulas vagas, de referências ético-políticas, formulavam promessas não realizáveis no momento, esconderiam, pois, um vácuo jurídico e produziriam uma contaminação das verdadeiras normas jurídicas como afirmações políticas, proclamações de boas intenções e, etc.
Estas normas não poderiam ser alegadas perante um juiz, pois aumentaria a desconfiança no direito. Sua operatividade como autêntico direito estaria sujeita uma intermediação legislativa. Ou seja, não se portavam como direitos subjetivos. Portanto, não poderiam ser vindicadas em juízo. E, essas normas teria uma relevância exclusivamente política ou virtual.
Enfim, o positivismo jurídico experimentou algumas glórias ao criar consistentes fundamentos para o direito se estabelecer como ciência e para a efetivação da segurança jurídica e da liberdade diante dos desmandos de reis absolutistas, criou limites racionais aos arbítrios do poder.
Porém, não conseguir encontrar soluções diante da fraqueza da norma para, em dados momentos e sob certas circunstâncias, promover e garantir a justiça”.
Restou superado o positivismo acrítico presente no século XIX que tanto pregava sua vinculação mesmo quando existia distância entre a representação da realidade e a própria realidade, que hoje só está presente como um resíduo, na opinião que, pelo inconsciente geral, têm de si mesmos os juristas práticos, sobretudo os juízes.
Em verdade, as severas críticas dos não-positivistas fizeram com que alguns doutrinadores e teóricos do positivismo jurídico tentassem adotar sua teoria ao mundo atual. E, com isso, ao lado do positivismo exclusivo de Joseph Raz[17], para muitos o derradeiro positivista puro.
Criou-se também o positivismo débil, inclusivo ou includente como os de Hart, e Luis Cruz, cuja regra de reconhecimento permitiu a possibilidade de abertura ao sistema moral, relativizando o parâmetro de validade unicamente formal da norma.[18]
Existem também outras vertentes como o positivismo crítico de Luigi Ferrajoli que desenvolveu teoria particular de direito baseado também no direito constitucionalizado, mas ao mesmo tempo, defende que não existe uma vinculação conceitual necessária entre direito e moral.
O positivismo exclusivo[19], de acordo com Alexandre Garrido da Silva é aquele que não admite nenhuma relação conceitual entre direito e moral ou entre o direito tal como ele é, e o direito tal como el deve ser, cujos representantes são Kelsen, Raz e Hart (antes de se tornar inclusivo[20] com seu Pós-escrito).
Foi a inexistência de alguma abertura axiológica na aplicação da norma fez com que normas absolutamente injustas fossem aplicadas pelos juízes sem a possibilidade de sua correção, como as já citadas leis de Nuremberg, ou na Itália, as leis fascistas, ou no Brasil, os Atos Institucionais no golpe de Estado pós-1964.
Para Luís Roberto Barroso[21] foram as barbáries sobre a proteção da legalidade que promoveram a decadência do positivismo após a Segunda Guerra Mundial.
As leis de Nuremberg[22], em nome da lei o direito foi utilizado para a realização de barbáries e atrocidades. O mundo não mais aceitava o império de uma lei tirânica e, alguns parâmetros morais de justiça precisavam ingressar no direito, visto que somente os critérios formais de validade não eram suficientes.
E, assim, surge o movimento de aproximação do Direito com a Moral, o pós-positivismo. Importante é frisar as diferenças entre os conceitos de neoconstitucionalismo e de pós-positivismo. O primeiro é uma característica comum do constitucionalismo ocidental que tem início no segundo pós-guerra e apogeu na contemporaneidade, enquanto o segundo é o embasamento da filosofia do direito para aquele.
O primeiro traduz a ideologia ou metodologia constitucional que abrange o segundo como pilar de sustentação de algumas de suas posições, mas com ele, não se confunde; o pós-positivismo é, portanto, a matriz jusfilosófica que embasa as ideias neoconstitucionais.
Para o Ministro Barroso, o marco filosófico do novo direito constitucional é o pós-positivismo que pode ser encarado como a concepção teórica do neoconstitucionalismo, pois permite repensar alguns alicerces jurídicos, como a teoria da norma, a teoria das fontes, a teoria da interpretação e etc.
Diversas nomenclaturas são usadas para esse novo paradigma[23] filosófico como pós-positivismo, antipositivismo, neopositivismo e, etc. Há, ainda versões do positivismo jurídico que pretendem justificar o neoconstitucionalismo, entre as quais soft-positivismo, ou positivismo inclusivel, flexível, ético, dúctil e, etc. Então duas correntes podem ser identificadas: o neoconstitucionalismo pós-positivista ou não-positivista e o neoconstitucionalismo positivista.
Existem doutrinadores e estudiosos que argumentam no sentido de que o pós-positivismo ou não-positivismo seria, em verdade, uma variação do jusnaturalismo. Manuel Atienza é um destes, no seu artigo intitulado Es el positivismo juridico uma teoria aceptable del derecho? mostrando uma conexão entre algumas teses jusnaturalistas e as teorias de Dworkin, Alexy, Carlos Nino e, em alguma medida, Ferrajoli.
Luis Prieto Sanchís[24] (2009) qualifica expressamente Dworkin de jusnaturalista. Alfonso García Figueroa (2009b) também tangencia essa conclusão demonstrando dois tipos de antipositivismo: o interno positivismo jurídico que pretendem justificar o neoconstitucionalismo, entre as quais, soft-positivismo[25], positivismo inclusivo, flexível, ético, dúctil, etc. Então, duas correntes podem ser visualizadas: o neoconstitucionalismo pós-positivista ou não-positivista[26] e o neoconstitucionalismo positivista.
O (pós-positivismo/jusnaturalismo[27]) e o externo (que criticou a própria dialética que mantém positivistas e não positivistas). A outra corrente, que é adotada no presente artigo, é a de que o pós-positivismo é uma corrente eclética que pretende unir os pontos positivos de ambas as correntes e afastar suas inconsistências.
É oposto ao positivismo por não sustentar a “separação do direito com a moral e a política”; afasta-se do jusnaturalismo por ser fundado “em propostas de incremento da racionalidade, como a festejada ponderação”[28] (MOREIRA, 2009).
Pelo pluralismo[29] e a complexidade da sociedade pós-moderna[30], que fazem sucumbir a ideia de completude do sistema positivo (codificado) pelas dificuldades de mitigar a aplicação das normas positivas mesmo diante de soluções absurdas ou desproporcionais, como no exemplo do sacrifício de seres humanos na Alemanha nazista.
Em 1967, o norte-americano Dworkin[31] foi o primeiro doutrinador e autor da teoria do direito recente a apresentar os princípios jurídicos de uma forma oposta ao pensamento positivista.
É o próprio doutrinador que, ao iniciar o capítulo sobre a diferenciação entre regras e princípios, demonstra de pronto sua posição antipositivista ao afirmar: 1) pelo pluralismo e a complexidade da sociedade pós-moderna, que fazem sucumbir a ideia de completude do sistema positivo codificado, e 2) pelas dificuldades de mitigar a aplicação das normas positivas mesmo diante de soluções absurdas ou desproporcionais, como no exemplo do sacrifício de seres humanos na Alemanha nazista.
O positivismo jurídico tradicional passa a não ser capaz “de explicar adequadamente a realidade do direito”.
Doutrinadores como Robert Alexy[32] (2008), Ronald Dworkin (2002), Gustavo Zagrebelsky (2007), García Figueroa (2009) e, entre os nacionais, Paulo Bonavides (2009), Luís Roberto Barroso (2007), André Rufino do Vale (2009), Humberto Ávila (2009), entre muitos outros, entendem o direito segundo essa nova perspectiva. Apesar de não serem linearmente coincidentes seus pensamentos, pode ser identificada uma série de características comuns em suas ideias.
Segundo André Rufino do Vale (2009), há um ponto de convergência entre os doutrinadores citados: eles “relativizam a separação entre Direito e Moral, admitindo critérios materiais de validade das normas”.
Foi visto que uma das principais críticas ao modelo positivista foi a falta de critérios valorativos para a aplicação da norma, a qual favoreceu, muitas vezes, decisões distantes da justiça ou mesmo absurdas. O pós-positivismo tenta firmar bases filosóficas para sanar essa problemática, com o escopo de implementar direitos constitucionais a partir da verificação axiológica das normas aplicáveis concretamente.
Nesse ponto, é importante frisar que, apesar do fato de Dworkin ter se destacado como o primeiro autor recente a discutir essa temática, a reflexão sobre a posição dos princípios no ordenamento não deixou de existir anteriormente a ele. André Rufino do Vale (2009) ressalta a contribuição.
O primeiro trabalho de Ronald Dworkin sobre o tema foi “The model of rules” publicado em 1967. Sua teoria foi aprimorada no texto Taking rights seriously de 1977. A tradução deste para o português ocorreu em 2002 pela Editora Martins Fontes com o título “Levando os direitos a sério”.
Robert Alexy foi posterior; seu primeiro trabalho sobre a temática foi publicado em 1979, Zum Begriff des Rechsprinzips, trabalho que foi incorporado à obra “Theorie der Grundrechte”. O título original de sua obra sobre o tema, publicada em 1992, é Il Diritto mitte. Legge, diritti, giustizia. A tradução para o espanhol se deu sob a rubrica El derecho dúctil, cuja primeira edição é de 1995. Não há tradução para o português.
De Josef Esser[33], ainda em 1961, para a discussão. Tanto ele quanto Karl Larenz, este com os princípios do direito justo, tiveram forte influência nas ideias de Alexy. Também destaca que Roscoe Pound[34] traz nítidas influências sobre o pensamento de Dworkin (VALE). Contudo, ante a delimitação do objeto do presente trabalho, a contribuição desses autores não será analisada.
No presente artigo, serão analisados centralmente os dois doutrinadores mais influentes sobre o que se convencionou chamar de pós-positivismo, Alexy e Dworkin.
A presente análise, sem a pretensão de completude, frise-se, tomará como base o pensamento de Alexy, por entender que sua teoria é mais completa que a de Dworkin, sobretudo ao não identificar uma única resposta correta como decisão jurídica.
Para Barroso[35] (2007), o pós-positivismo é a corrente que perpetrou a “confluência das duas grandes correntes de pensamento que oferecem paradigmas opostos para o Direito: o jusnaturalismo e o positivismo”.
Da mesma forma, para Manuel Atienza (2004), o neoconstitucionalismo combina aspectos do positivismo, do jusnaturalismo e do realismo jurídico em uma só corrente. É, pois, uma posição eclética que tenta conciliar as duas correntes antagônicas anteriores.
Sobre a confluência das duas correntes doutrinárias anteriores, chega-se a duas conclusões: 1) a complexidade das normas constitucionais não pode ser explicada exclusivamente a partir do positivismo ou do jusnaturalismo, tampouco do realismo jurídico; e 2) aspectos diferentes de cada uma das teorias são imprescindíveis para poder compreender as normas jusfundamentais no fenômeno constitucional contemporâneo.
Assim, conclui-se que “a compreensão das normas de direitos fundamentais pressupõe uma teoria ao mesmo tempo integradora de aspectos relevantes do positivismo, do jusnaturalismo e do realismo jurídico – e superadora – de tratamentos isoladamente positivistas, jusnaturalistas e realistas”.
Então, na contemporaneidade, a longa discussão entre positivistas e jusnaturalistas não tem mais razão de ser. Antônio Cavalcanti Maia (2009) aduz que o pensamento jurídico contemporâneo está além da querela entre jusnaturalismo e positivismo jurídico.
Assim, o foco central da filosofia do direito não é mais a verificação de qual das teorias passadas deva prevalecer. O que se busca, atualmente, são as bases de uma nova teoria: o pós-positivismo.
As principais características do pós-positivismo[36] podem ser identificadas, resumidamente, como: a) a abertura valorativa do sistema jurídico, e, sobretudo, da Constituição; b) tanto princípios quanto regras são considerados normas jurídicas; c) a Constituição passa a ser o locus principal dos princípios; d) o aumento da força política do Judiciário em face da constatação de que o intérprete cria a norma jurídica.
Eis o grande desafio: o de buscar a justiça dentro da sociedade pluralista e, na dicção de Inocêncio Mártires Coelho apud Vale, se a sociedade é plural, a Constituição deve ser pluralista, a qual tem na justiça seu referente principal.
Eis a essência do pensamento do neoconstitucionalismo, cuja matriz filosófica será adiante comentada.
Por trás de toda norma jurídica, há valor. Na configuração do dever ser positivado em uma norma jurídica há um plexo de valores que lhe deram origem. O que não significa dizer que direito se confunde com a moral.
Aliás, Miguel Reale (2006) ao exibir a teoria do mínimo ético[37], informou que o direito representa apenas o mínimo de moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver e conviver. O direito é, portanto, parte da moral, devidamente armada de garantias específicas.
Porém, existem atos juridicamente lícitos que não pode ser da premissa moral, podem ser imorais ou no mínimo, amorais. Portanto, apesar de ser influenciado pela moral, com o acréscimo de garantias e sanções que lhe conferem o caráter obrigatório, há que se distinguir um campo de direito que não se confunde com a moral. O primeiro é deontológico enquanto o segundo é axiológico.
Questiona-se como a moral se interrelaciona com o direito? Alguns valores socialmente relevantes são recepcionados pelo direito e, a partir de então, ganham coercibilidade e todas as suas demais características. Esse processo se dá, em regra, segundo ações racionais de escolha do legislador, as quais apresentam margens de decisão livre, isto é, pode não haver identidade com a moral, como nos casos das leis injustas já citadas.
Mesmo assim, Reale (2006) assevera que a obrigatoriedade do direito vem banhada de exigências axiológicas, uma vez que os valores sociais fizeram parte da confecção da norma jurídica, isto é, toda norma enuncia algo que deve ser, em virtude de ter sido reconhecido um valor com razão determinante de um comportamento declarado obrigatório.
Enuncia que é uma trama de valores sociais que reflete nas normas jurídicas. A coletividade expressa opiniões comuns sobre os valores relevantes para si, os quais servem como fundamento para si, os quais servem como fundamento para a produção de textos normativos.
A produção normativa, contudo, não decorre de fatos, ou de mero recorte de condutas, mas antes de valoração que é estabelecida sobre os fatos, então, as normas jurídicas são decorrência de valorações comuns sobre fatos/condutas, reputados valiosos (…) e, aí a sua inserção no ordenamento (Borges, 2009).
Dessa forma, os valores jurídicos indicam, igualmente, as finalidades a serem alcançadas pelo ordenamento jurídico, uma vez que expressam valores sociais como justiça, segurança, igualdade e paz (Castilhos, 2009).
Visto que os valores integram o direito no momento de usa constituição, é relevante a busca por um significado de valor para, então, verificar como de passa a ingressar no ordenamento, em um segundo momento, por meio dos princípios.
Robert Alexy, embasando-se nas lições de Von Wright, afirma que os conceitos axiológicos são aqueles que giram em torno do que é bom, do que tem valor. São usados quando algo pode ser qualificado como bom, como bonito, corajoso, seguro, econômico, democrático, social, liberal ou compatível com o Estado de Direito[38] (Alexy, 2008).
O valor é dado pela vivência que dele temos, daquilo que é valioso, por isso, os valores são relações de adaptação, em que se estabelece o valor positivo e o valor negativo. Então, reconhecer algo como valioso, é emitir juízo de valor sobre alguma coisa, é dar valor a alguma coisa, de forma a polarizá-la seja como boa ou ruim. Relaciona-se com o complexo de sensações decorrente da relação do sujeito com os objetos que o circundam.
Trata-se de juízo sobre se algo tem ou não valor para determinado agente. Assim, o valor é relacional, depende da relação do sujeito com o objeto. É nessa relação que se descobre o que é bom, ou é justo ou tem valor.
Valor é qualidade da coisa registrada para uma determinada pessoa, o sujeito. Identificar o que seja bom ou justo para determinada sociedade em seu turno, é exatamente aferir os valores que integrantes.
Com apoio de Pontes de Miranda[39], concluiu que os valores são escalas de ajustabilidade em relação ao mundo, dos sentimentos do sujeito, numa escala que algo tem valor para alguém, no momento que algo tem valor para alguém, no momento em que a influência a existência de outo, torna-se representação e a ajustabilidade objetiva.
Portanto, os valores sociais são estimativas de objetos feitas por vários atores da sociedade, somadas às valorações dos demais atores. Esse plexo de valores é internalizado no direito, em um primeiro momento, pelo Constituinte/legislador. Logo, os valores sociais são os fundamentos do dever ser.
O debate Hart-Dworkin[40] inicia, como visto, com as críticas formuladas pelo segundo doutrinador, que delineou três principais preceitos comuns que fundamentam o positivismo jurídico na sua concepção.
Primeiro, o Direito seria “um conjunto de regras especiais utilizado direta ou indiretamente pela comunidade com o propósito de determinar qual comportamento será punido ou coagido pelo poder público”. Essas regras poderiam ser identificadas e distinguidas com o auxílio de critérios específicos, de testes que dizem respeito ao seu pedigree, também revelando-se coextensivas ao Direito.
E, portanto, chega-se ao segundo preceito: se algum caso não estiver coberto por uma das regras, ele poderá ser decidido por alguma autoridade pública, a partir de seu discernimento pessoal, oportunidade em que dispensada a aplicação do Direito.
Finalmente, como terceiro preceito, na ausência de uma regra jurídica válida, não existiria obrigação jurídica, tendo em vista que a última apenas existe na ocorrência da primeira,
Para Hart, o sistema jurídico é composto pela combinação de regras primárias (que estabelecem o que é proibido e o que é permitido), e secundárias, que se referem às próprias normas primárias, especificando a forma como podem ser determinadas, introduzidas, eliminadas ou alteradas (e que também conferem poderes às autoridades).
Entre as regras secundárias está a regra de reconhecimento, que confere o fundamento e a validade de um sistema jurídico, porque ela possui como função a identificação das regras primárias e secundárias.
Nesse sentido, também ela está relacionada com a validade da norma jurídica, porque oferece às autoridades públicas os critérios válidos para a identificação das normas primárias de obrigação. Funciona, portanto, como um padrão unificador e garantidor da identidade jurídica e é aceita como um fato social.
No entanto, Hart adverte que existe um problema especialmente relacionado à questão de linguagem (ponto que pode ser considerado o mais criticado por Dworkin).
Para Hart[41], a linguagem faz parte da constituição do Direito, na medida em que se trata de um fenômeno cultural. No entanto, ela é, naturalmente, imprecisa nas orientações, possuindo o que ele chama de cânones interpretativos, que sugere incertezas, vaguezas e ambiguidades. Assim, a sua visão é a de que a própria linguagem, dada a sua imprecisão, confere ao intérprete discricionariedade.
É sabido que o Direito é uma ciência social axiológica e normativa (prescritiva) e, Reale já ressaltava, em sua Teoria Tridimensional do Direito, a relação dos fatos com valores e com as normas.
Tanto no positivismo como no pós-positivismo, não se modifica a noção de que os valores ingressam o direito de alguma forma. A diferença entre as duas correntes, no que se refere ao ingresso de valores no sistema, é que no primeiro os valores ingressam nas normas tão somente por meio da atividade legislativa, ou seja, a valoração entre o que é bom ou não para determinada sociedade em determinado contexto social é aferida pelo legislador. Isto é, a moral é elemento externo ao direito, uma vez positivada não mais interage com este.
Não estou a afirmar que os valores são intrínsecos ao direito segundo a visão positivista, pois não o são. Nessa corrente, os valores são externos ao direito. Contudo, no momento da escolha de qual conduta será permitida e qual será proibida são os valores que norteiam o legislador.
Cabe uma observação, o legislador não tem a obrigação de se pautar nesses valores para construir a norma jurídica. O legislador pode confeccioná-la independentemente destes, pois a regra de reconhecimento não contém um referencial valorativo, visto utilizar critério formal de validez.
Mesmo em descompatibilidade com os valores sociais, se a regra tiver sido posta, deve ser aplicada. Conclui-se, portanto, não é cabível ao juiz, no momento de sua atividade de interpretação/aplicação, aferir a compatibilidade de normas com os valores sociais.
O julgador somente aplica a lei, buscando a vontade do legislador, sem verificar se ela é boa ou não, se é justa ou injusta, posto que não estaria aferindo o conteúdo valorativo pelo aplicador da norma.
Enfim, trata-se da velha máxima de Montesquieu de que o juiz é a “boca da lei” se impõe. E, com tal concepção, o positivismo jurídico não foi capaz realmente de propiciar a justiça às relações sociais, produzindo um vácuo de justiça entre a confecção da norma e sua aplicação, o que se tornou o crucial problema dessa argumentação filosófica. Só uma forma tosca de positivismo, uma forma que até foi repudiada por Hebert Hart[42], o maior positivista do nosso século que poderia produzir esse tipo de isolamento. (Dworkin, 2006.)
O pós-positivismo, ao contrário, cria sustentação jusfilosófica para que se possam buscar parâmetros de justiça ou equidade quando da aplicação concreta do direito. Isso se dá com a abertura valorativa do sistema.
Nessa nova corrente, a forma e o momento da isenção dos valores no sistema são alterados; os valores permeiam o sistema tanto no momento da confecção da norma como durante sua aplicação. Os princípios são os carreadores dos valores nessa concretização.
Aquilo que, no modelo de valores, é prima facie o melhor é, no modelo de valores, definitivamente o melhor é, no modelo de princípios, definitivamente devido”. (ALEXY, 2008).
Assim, os valores servem-se dos princípios para oxigenar o sistema jurídico e, com isso, o direito passa a conter uma pretensão de correção. Até mesmo as regras, sobretudo as que contenham conceitos jurídicos indeterminados, mas não somente elas, necessitam de um juízo de valor prévio do magistrado para a sua concreção (LARENZ, 2003).
Com isso, o operador do direito pode identificar princípios norteados em valores relevantes e aplicá-los concretamente, mesmo que a lei não os contemple de pronto ou lhes seja contrária. Assim, é possível afastar determinada norma quando de sua aplicação em concreto com o escopo de se buscar uma solução justa. Os princípios jurídicos são aceitos, então, como “pautas axiológicas, abertas e indeterminadas” (MENDES et al., 2007).
Sobre o tema, o posicionamento de Luís Roberto Barroso, in litteris:
“O pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas. A interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma teoria de justiça, mas não podem comportar voluntarismos ou personalismos, sobretudo os judiciais” (BARROSO, 2007).
Está posta a abertura valorativa do sistema jurídico. Robert Alexy (2008), ao enfatizar a necessidade de uma teoria dos princípios, afirma que um dos objetivos de sua pesquisa “é a reabilitação da tão depreciada teoria valorativa dos direitos fundamentais”.
Assim, o novo pensamento se afasta das decisões que tentam negar um mínimo de valoração quando da concreção das normas. Não se admite mais o isolamento do aplicador do direito em relação aos valores que respaldam e sustentam o direito.
A leitura axiológica do direito em busca de ideais de justiça é admitida e necessária na atual conjuntura. Decisões desprovidas de qualquer identificação de justiça, ao argumento da pura e simples vontade do legislador, não mais podem ser aceitas, sobretudo as opressoras da dignidade do ser humano.
Assim, a lei dá espaço aos princípios e estes, aos valores. Os princípios passam ao centro dos sistemas constitucionais e levam consigo os valores que lhes dão sustentação. A letra fria da lei não pode mais ser aceita incondicionalmente. Os valores oxigenam o sistema jurídico quando necessário; oxigenação o sistema quando necessário; e ocorre quando da aplicação concreta da norma jurídica.
Ressalte-se que, como será reforçado adiante, a Constituição que representa a sede natural dos princípios e, por isso, a abertura do sistema jurídico se dá principalmente através desta.
Não obstante, o sistema jurídico não abarca os princípios somente na Carta Magna, por isso o pós-positivismo se aplica também aos demais ramos do direito. Porém, sua principal sara continua sendo o constitucional.
Segundo Alexy, a positivação dos direitos fundamentais representa “uma abertura do sistema jurídico perante o sistema moral, abertura que é razoável e que pode ser levada a cabo por meios racionais.
Adiante, ressalta o doutrinador que o conteúdo axiológico dos princípios é mais facilmente identificável que o das regras; como razões decisivas para inúmeras regras, os princípios têm uma importância substancial fundamental para todo o ordenamento jurídico. Assim, o direito se abre os valores e se aproxima da moral.
Impende trazer à lume o entendimento de Dworkin (2006) de que a leitura moral (axiológica) da Constituição evidentemente não é adequada para a interpretação de tudo quanto uma constituição contém.
As Constituição são permeadas por normas-regras e normas-princípios. A título de exemplificação, no artigo 5º, inciso XXXV, do texto constitucional que espelha o princípio de que qualquer direito ameaçado ou lesado poderá ser discutido em juízo.
Os princípios fundamentais são mandamentos nucleares do sistema constitucional e possuem funções de estruturar o ordenamento jurídico, conferindo-lhe coerência e lógica ao sistema jurídico, além de nortear a interpretação normativa e subsidiar as lacunas jurídicas.
Segundo Alexy, a positivação dos direitos fundamentais representa “uma abertura do sistema jurídico perante o sistema moral, abertura que é razoável e que pode ser levada a cabo por meios racionais.
Adiante, ressalta o doutrinador que o conteúdo axiológico dos princípios é mais facilmente identificável que o das regras; como razões decisivas para inúmeras regras, os princípios têm uma importância substancial fundamental para todo o ordenamento jurídico. Assim, o direito se abre os valores e se aproxima da moral.
Impende trazer à lume o entendimento de Dworkin (2006) de que a leitura moral (axiológica) da Constituição evidentemente não é adequada para a interpretação de tudo quanto uma constituição contém.
As Constituição são permeadas por normas-regras e normas-princípios. A título de exemplificação, no artigo 5º, inciso XXXV, do texto constitucional que espelha o princípio de que qualquer direito ameaçado ou lesado poderá ser discutido em juízo.
Os princípios fundamentais são mandamentos nucleares do sistema constitucional e possuem funções de estruturar o ordenamento jurídico, conferindo-lhe coerência e lógica ao sistema jurídico, além de nortear a interpretação normativa e subsidiar as lacunas jurídicas.
O estudo das regras e princípios de Robert Alexy tem grande utilidade para resolver a colisão de direitos fundamentais. Exemplificando, um jornalista investigativo descobriu que uma notória autoridade pública opera poderoso esquema ilícito entre seus familiares, no interior de seu domicílio.
Descortina-se que há de um lado, o direito à liberdade de imprensa que garante a publicidade da informação, e de outro lado, o direito de privacidade da referida autoridade pública de não ser molestado em seu ambiente privado. Se ambos os direitos seguissem a lógica das regras, a opção pela liberdade de imprensa afastaria em absoluto o direito à privacidade. Mas, não é assim.
Por mais que exista a liberdade jornalística, essa deverá respeitar os direitos personalíssimos envolvidos, evitando-se dar publicidade para aqueles que não estão envolvidos no caso concreto, ou trazendo à público os fatos íntimos desabonadores dos sujeitos. Se a convivência entre as normas é possível, apesar de sua eventual colisão, estamos cogitando de princípios e não de regras.
Verifica-se outra definição de princípio, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, os princípios seriam mandamentos nucleares do sistema jurídico. E, são os fundamentos dos quais decorrem as demais disposições normativas, traduzindo o espírito do sistema e servindo de critério para a sua correta interpretação e harmonia.
O complexo conceito vem a ilustrar as diferentes funções dos princípios. A saber, fundamentadora, de balizar todo o ordenamento jurídico; harmonizadora, a fim de conferir coerência e lógica ao sistema complexo; interpretativa, segundo a qual os princípios devem nortear a interpretação da norma, sempre que for ambígua; e, por derradeiro, a função subsidiária, servindo os princípios como fonte jurídica para o preenchimento de lacunas.
Havendo duas possíveis definições de princípios, defende-se que a Constituição brasileira de 1988 tenha acolhido a segunda linha de entendimento, mandamentos nucleares do sistema jurídico, para inaugurar todo o texto constitucional.
Os princípios fundamentais[43] são o núcleo de todo nosso direito. O Título I da Constituição, intitulado “Dos princípios fundamentais” é dividido em quatro tópicos. O art. 1º cuida dos fundamentos da República Federativa do Brasil, também conhecidos como princípios fundamentais propriamente ditos.
O art. 2º trata da divisão horizontal de Poderes, separando as funções do Estado em legislativa, executiva e judiciária. Por sua vez, o art. 3º elenca os objetivos da República, estabelecendo os fins do Estado. Finalmente, o art. 4º se preocupa em enunciar os princípios das relações internacionais envolvendo o Brasil e os demais países soberanos.
Para as regras é que o autor afirma não ser adequada a leitura moral, uma vez que não há que se cogitar em análise valorativa de uma norma-regra como a que especifica a idade mínima para a elegibilidade de um Presidente em trinta e cinco anos. Nesse caso a leitura moral já foi feita pelo legislador.
As normas-regra constitucionais caracterizam-se por serem fechadas, casuísticas, com reduzido grau de abstração. Quando da criação dessas regras, pelo Constituinte, é que se analisam e ponderam os valores sociais envolvidos. Com as regras, a verificação valorativa se dá previamente.
Não cabe, em regra, ao intérprete essa aferição, porque todos os critérios para subsunção do caso concreto foram objetivamente delineados pelo legislador.
Mais à frente será demonstrado que, por exceção, também é possível a leitura valorativa das regras. Por hora, essa ideia geral de que a leitura moral não se faz necessária à interpretação das regras é bem-vinda.
Então, a ampliação valorativa da aplicação do direito ou a interpretação moral da Constituição (Dworkin) restringe-se, em regra, às normas abertas e com maior abstração denominadas princípios ou normas-princípio.
Nesse cenário, há a inclusão, nos textos constitucionais contemporâneos, “de vários standards morais, na forma de princípios, valores e direitos fundamentais, já que tais standards realizam uma plasmação jurídica de conteúdos de natureza moral nos ordenamentos jurídicos hodiernos” (MAIA). É por isso que “os princípios constitucionais abriram uma via de penetração moral no direito positivo”.
Cumpre frisar o destaque de André Rufino do Vale (2009) no sentido de que as normas constitucionais contêm duas faces; “além dos elementos deontológicos”, possuem um caráter axiológico, “de conteúdo valorativo”.
É afirmar: essas normas, além de seu caráter normativo a ser verificado no mundo do dever ser (deontológico), apresentam um forte conteúdo valorativo (axiológico).
É essa forte carga axiológica que acarreta a inevitável submissão de sua aplicação aos processos de argumentação jurídica, conforme se verá mais à frente. Os princípios, com sua grande carga valorativa, são os que se sujeitam de maneira mais evidente a sua interpretação/aplicação por meio da influência dessa argumentação.
Portanto, os princípios constitucionais “constituem uma ponte entre direito e moral” (COMANDUCCI, 2009).
Gustavo Zagrebelsky ao explicar a noção de ductibilidade constitucional, afirma que atualmente uma Constituição deve basear-se necessariamente na coexistência de valores e princípios para não renunciar a sua unidade e integração e, ao mesmo tempo, não se fazer incompatível, com sua base material pluralista, e para tanto, exige que cada um de tais valores e princípios se assumam com caráter não absoluto, compatível com aqueles outros com os quais devem conviver.
E, para o doutrinador, existiria somente um valor, mais precisamente um metavalor, que teria caráter absoluto, qual seja, a suprema exigência constitucional de toda sociedade pluralista de se preservar como tal.
E, adiante apresenta a aspiração de convivência dos princípios e valores. Apesar de apenas aparentar ser conceitualmente impossível, por ser altamente desenhado na prática, atualmente se aspira não à prevalência de um valor ou princípio, mas à salvaguarda de vários simultaneamente.
Os Tribunais devem, portanto, buscar uma concordância prática da diversidade valorativa com prudentes soluções acumulativas, combinatórias, compensatórias, que conduzam os princípios constitucionais a um desenvolvimento conjunto e não a um decréscimo conjunto.
Gustavo Zagrebelsky ao explicar a noção de ductibilidade constitucional, afirma que atualmente uma Constituição deve basear-se necessariamente na coexistência de valores e princípios para não renunciar a sua unidade e integração e, ao mesmo tempo, não se fazer incompatível, com sua base material pluralista, e para tanto, exige que cada um de tais valores e princípios se assumam com caráter não absoluto, compatível com aqueles outros com os quais devem conviver.
E, para o doutrinador, existiria somente um valor, mais precisamente um metavalor, que teria caráter absoluto, qual seja, a suprema exigência constitucional de toda sociedade pluralista de se preservar como tal.
E, adiante apresenta a aspiração de convivência dos princípios e valores. Apesar de apenas aparentar ser conceitualmente impossível, por ser altamente desenhado na prática, atualmente se aspira não à prevalência de um valor ou princípio, mas à salvaguarda de vários simultaneamente.
A grande discussão entre jusnaturalistas e juspositivistas girava em torno da relação entre direito e moral. Apesar de a pendenga entre essas correntes ter sido apartada, essa relação é uma das questões mais complicadas, se não a mais, da filosofia jurídica.
Mas o neoconstitucionalismo modifica um pouco esse cenário, a ponto de Alfonso García Figueroa (2009) constatar que “o direito já não é mais o mesmo desde que se consumou certa constitucionalização do ordenamento e nosso universo moral já não é mais o mesmo desde a consolidação de teorias construtivistas e especificamente discursivas”; as transformações substanciais experimentadas tanto pelo direito como pela moral dissociaram a lógica da discussão que era mantida até hoje. É nesse cenário que a teoria não-positivista entende a convivência entre direito e moral.
Precisamos enfocar as normas jurídicas sejam os princípios e regras. Antes de tudo, faz-se necessário diferenciar os princípios hermenêuticos dos princípios jurídicos. Os primeiros, segundo Canotilho[44] (2003), desempenham uma função argumentativa na busca da revelação de normas expressas em enunciados legislativos. Os segundos são os que ora serão tratados.
Qual é a posição dos princípios jurídicos no ordenamento jurídico? Essa é a pergunta que os filósofos do direito tentam explicar na atualidade. Paulo Bonavides (2009), ao respondê-la, ressalta que “não há distinção entre princípios e normas, os princípios são dotados de normatividade (…) a distinção não é como nos primórdios da doutrina, entre princípios e normas, mas entre regras e princípios, sendo as normas o gênero, e as regras e princípios a espécie”.
Para o pensamento positivista clássico, princípios não eram considerados normas; quando muito, fórmula integradora do sistema ou critério de hermenêutica. A partir dos estudos dos teóricos e doutrinadores citados acima, sobretudo de Dworkin de 1967 e Alexy de 1979, o pós-positivismo logrou trazer os princípios à sua atual configuração: espécie de norma jurídica, ao lado das regras.
Foi reconhecida aos princípios densidade normativa suficiente para reger diretamente as relações intersubjetivas.
Os autores estudados têm um pensamento comum no sentido de entender os princípios como normas jurídicas. As distinções e compatibilidades entre o pensamento de cada um deles serão apresentadas a seguir com o intuito de demonstrar, principalmente, a coesão e proximidade nas linhas centrais de seus estudos.
De acordo com Robert Alexy (2008) “tanto regras quanto princípios são normas, porque ambos dizem o que deve ser”. Os princípios podem, como as regras, ser formulados no plano deôntico como premissas básicas do dever, da permissão ou da proibição. São, pois, razões para regulação da conduta concreta dos cidadãos, uma vez que estabelecem fórmulas de dever-ser.
Segundo Dworkin (2002), as duas espécies de normas podem ser entendidas como conjuntos de padrões que “apontam para decisões particulares acerca da obrigação jurídica em circunstâncias específicas”
Mas regulam situações restritas, específicas de cada um deles, como no direito tributário, administrativo, empresarial, etc.
Não obstante, os valores fundamentais da sociedade, como, por exemplo, a dignidade da pessoa humana ou a presunção de inocência, este, sim, expressa ou implicitamente, têm sede constitucional por meio dos princípios que os contêm.
Nota-se, contemporaneamente, um aumento do foco político no Judiciário. A norma jurídica não se confunde como texto da norma, mas reflete os sentidos decorrentes da interpretação de seu texto.
Normas são “os sentidos construídos a partir da interpretação sistemática de textos normativos” (ÁVILA, 2009). Os dispositivos normativos (texto) são o objeto da interpretação, enquanto a norma é o seu resultado.
Em suma, o texto da norma não se confunde com a própria norma, a qual surge com a interpretação. A norma jurídica se extrai, pois, do processo interpretativo.
Por isso, Eros Roberto Grau (2005) observa que a atividade do intérprete consiste em construir o significado da norma.
O significado das palavras não é intrínseco ao seu signo, mas depende precisamente de sua interpretação. Surge a partir da relação do sujeito que tem a função de interpretá-la. A norma, da mesma forma, surge a partir de sua aplicação/interpretação.
Ou seja, a atividade do intérprete – quer julgador, quer cientista – não consiste em meramente descrever o enunciado previamente existente dos dispositivos” (ÁVILA, 2009). É dizer, interpretação é ato de decisão e não de descrição de um significado previamente dado. O intérprete constrói o significado da norma, pois seu texto tem “un sentido, todavia por precisar” (ALEXY, 2008)
Humberto Ávila (2009) acrescenta que a “transformação de textos normativos em normas jurídicas depende da construção de conteúdos de sentido pelo próprio intérprete”. É o intérprete da norma que fixa a sua extensão e abrangência. Quanto mais abertos forem os termos das disposições normativas, mais nítida se mostra essa qualidade. Portanto, é na interpretação dos princípios, que se apresentam em regra com densidade normativa, que o intérprete é mais exigido.
Com isso, na atual configuração da filosofia do direito e do direito constitucional, cabe ao aplicador do direito a fixação do conteúdo das normas constitucionais, sejam princípios ou regras. Além disso, até mesmo a identificação de princípios passa a ser função do intérprete, uma vez que alguns princípios podem não ser expressos.
Alexy (2008) ressalta “a desnecessidade de que os princípios sejam estabelecidos de forma explícita, podendo decorrer de uma tradição de positivação detalhada e de decisões judiciais que, em geral, expressam concepções difundidas sobre o que deve ser o direito”.
A atividade de interpretação de textos normativos deve ser entendida como um processo. Esse processo, ensina André Rufino do Vale (2009), é dividido em fases.
A primeira constitui-se da verificação do significado linguístico das disposições de direito fundamental (texto), com a identificação das palavras e seus significados. A segunda refere-se à identificação do conteúdo das normas expressas pelos seus dispositivos (texto). A terceira se restringe à configuração da norma como regra ou princípio.
Em casos fáceis, essa fase é suficiente para a identificação de respostas à interpretação; sem maiores controvérsias interpretativas, o “significado das disposições normativas resta claro, fora de dúvidas ou controvérsias interpretativas (zona de certeza)” (VALE, 2009).
Para os casos difíceis, há uma quarta fase, na qual o conteúdo da norma depende de uma atividade interpretativa de atribuição de significado à regra ou princípio a partir da análise valorativa do intérprete, portanto, discricionária.
Esse é o procedimento que é utilizado para a construção do significado da norma.
Não mais é plausível o entendimento de que um simples critério de subsunção é capaz de identificar o significado da norma. Não há “significado algum antes do término desse processo de interpretação” (ÁVILA, 2009).
Outro ponto é que a fixação do conteúdo dos direitos constitucionais passa pela análise histórica de sua estruturação. Nesse cenário, a atividade dos Tribunais Constitucionais é de essencial relevância, uma vez que o conteúdo das normas constitucionais, notadamente dos princípios, é delimitado a partir da interpretação da norma e sua aplicação ao caso concreto.
Por isso, a jurisprudência do Tribunal Constitucional[45] dos países que o criaram é de suma importância para a delimitação da abrangência dos direitos constitucionais, neles inseridos os fundamentais. Como frisou Alexy (2008), os direitos fundamentais são o que são, sobretudo, por meio da interpretação.
É a interpretação realizada pelos aplicadores do direito, mais precisamente pela Corte Constitucional, que delimita a amplitude dos direitos constitucionais. O processo de interpretação é, pois, indispensável à aferição do conteúdo exato da própria Constituição.
Os dispositivos abertos dos princípios não se mostram capazes de sozinhos, estabelecer seu conteúdo, pois têm uma característica prima facie – o conteúdo exato de sua abrangência e de seus efeitos somente se verifica quando de sua interpretação e concreção. Nesse caso, é a ponderação que demonstrará, a cada caso concreto, o real conteúdo e abrangência das normas constitucionais.
O conteúdo dos direitos fundamentais é retirado, primeiramente pelo Constituinte, dos valores centrais para a sociedade; porém, é somente em um segundo momento, quando da ponderação dos princípios concorrentes no processo interpretativo, que são fixados o real conteúdo e a abrangência de seus termos.
Por isso, os estudos de Peter Häberle (2002) são de tamanha importância para o direito contemporâneo. Se a Constituição se molda em concreto, a sociedade deve participar o máximo possível da discussão judicial sobre sua aplicabilidade (Sociedade Aberta de Intérpretes).
A interpretação constitucional é uma função que cabe aos intérpretes formais (Estado: Legislativo, Executivo e Judiciário) e aos intérpretes não formais (toda a sociedade).
Assim, a sociedade deve participar do processo de concreção dessas normas, visto que a interpretação constitucional é “uma atividade que, potencialmente, diz respeito a todos. (…) A conformação da realidade da Constituição torna-se também parte da interpretação das normas constitucionais pertinentes à realidade” (HÄBERLE, 2002).
Nessa configuração ganha relevância o papel do Poder Judiciário45, com ênfase na função de Corte Constitucional. Cabe ao Judiciário e à doutrina a construção de significados das normas (ÁVILA, 2009).
A ciência do direito evoluiu no sentido de entender que ao Judiciário é afeto um papel muito mais relevante e criativo que a simples “boca da lei”. Há, pois, uma transferência de poder político do Legislativo para o Judiciário. Luiz M. Cruz (2006) cogita em “deslocamento do centro de gravidade dos parlamentos para os Tribunais Constitucionais”. Prieto Sanchís (2000) chamou esse fenômeno de onipresença judicial. Isso somado ao fenômeno de constitucionalização do direito e da judicialização demonstram uma supervalorização desse poder na atual conjuntura.
É por isso que se discute tão calorosamente na atualidade o ativismo judicial[46]. Mas, vale a constatação de Inocêncio Coelho (MENDES et al., 2007) de que essa opção juridiciarista não decorreu de uma construção teórica ou de um projeto de engenharia política, “antes se consolidou ao sabor da própria experiência constitucional”.
As definições do conteúdo de princípios[47] constitucionais como da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), do solidarismo social (art. 1º, II, CF), da eficiência (art. 37, CF), entre outros, são exemplos de participação ativa da doutrina e, sobretudo, do aplicador do direito na formulação do exato conteúdo da norma.
Princípios como os citados, ante a sua baixíssima densidade normativa, refletem mais avidamente o caráter conteudista do aplicador do direito.
Humberto Ávila (2009) afirma que “a conclusão trivial é a de que o Poder Judiciário e a Ciência do Direito constroem significados, mas enfrentam limites cuja desconsideração cria um descompasso entre a revisão constitucional e o direito constitucional concretizado”.
Antes de finalizar, é preciso apresentar um alerta. Alguns excessos de correntes extremadas do pós-positivismo: um alerta necessário
Como visto, no quadro atual, impera como uma quase unanimidade na doutrina a prevalência de normatividade dos princípios e a distinção entre estes e as regras.
Humberto Ávila (2009) chega a informar que essa concepção “virou moda”. Nesse contexto, a concretização do direito enfrenta um processo de subsunção das regras e de ponderação dos princípios em sua existência conflituosa, submetendo-os a padrões de peso e qualidade, não mais de validade. Mas, como tudo em excesso, faz mal!
Até mesmo Canotilho (2005), doutrinador consagrado pela defesa dos direitos fundamentais, assevera críticas à “panfundamentalização objetivista” ou à “hipertrofia jusfundamentalista”. Se tudo é direito fundamental, então nada é realmente fundamental.
Em relação ao pós-positivismo, a crítica também é bem-vinda. Se tudo se transforma em ponderação, a margem de subjetividade se mostra tão grande que a segurança jurídica e a objetividade do sistema desaparecem por completo. Nessa linha, Daniel Sarmento (2009) chega a falar em panconstitucionalização e “oba-oba” constitucional.
Por isso, é preciso tomar cuidado para não alargar demasiadamente os horizontes da principiologia constitucional a ponto de se afirmar que toda norma é princípio e, assim, toda a Constituição pode ser ponderada. Uma adequada compreensão do que são princípios e do que são regras é necessária.
A Carta contém princípios jurídicos e regras jurídicas que convivem em harmonia. Cada um deles deve ser entendido como tal; regras são regras, princípios são princípios. Por mais que pareça óbvio, o alerta é importante.
Passar por esse tema sem lembrar seu grande crítico seria um impropério. A forte crítica de Habermas à teoria trazida por Alexy diz respeito à falta de racionalidade na tomada de decisões, ou à falta de parâmetros racionais para o sopesamento.
A afirmação de Habermas de que a aplicação dos princípios é uma “qualificação orientada por finalidades”, o que retiraria força dos direitos fundamentais diante da escolha dessas finalidades, é respondida por Alexy (2008) em seu posfácio escrito em 2002.
Segundo essa resposta, sua teoria se sustenta não por encontrar a resposta racional em todos os casos, o que é possível, mas diante da racionalidade encontrada no conjunto dos casos, o que “é interessante o suficiente para justificar o sopesamento como método” (ALEXY, 2008).
Paulo Ricardo Schier apud Godoy (2005) alerta que, se um sistema em que só existem regras é temeroso pela baixa capacidade de ajuste e evolução, um sistema formado apenas por princípios “também seria indesejável diante da baixa densidade normativa que teria, determinando, destarte, uma espécie de corrosão da própria normatividade constitucional”.
O sistema atual, em face do processo de ponderação (sopesamento) da interpretação/criação/ aplicação da norma, ganha em justiça, por permitir uma proximidade com os valores socialmente relevantes, mas perde em objetividade; o que necessariamente resulta em aumento de subjetividade, até porque o processo de ponderação tem um grande viés subjetivo.
É diante desse cenário que Coleman e Leiter (2000) defendem a objetividade modesta para o sistema atual, considerando-a a que se encontra “em vigor em boa parte do debate[48] doutrinário atual” e a que mostra uma razoável forma de legitimar as decisões judiciais.
Com essa objetividade, seria possível tentar, ao menos hipoteticamente, visualizar uma condição ideal, distante das pré-compreensões dos julgadores, em que se pudesse verificar a correção da decisão proferida. Segundo os autores, essa visão afastaria a subjetividade do julgador.
Por fim e retomando o argumento anterior, há de se considerar que o sistema jurídico é composto de regras e princípios, cada qual com sua função, e não somente por princípios, ou seja, as normas não são todas principiológicas, somente algumas delas são. Schier (2005) ainda ressalta que “a exacerbação do processo de principiologização não pode atingir o ponto de tornar tudo ‘subjetivo’ (no sentido arbitrário)”.
Essa crítica tem o objetivo de demonstrar que também essa forma de ver o direito precisa de um olhar sereno e crítico dos cientistas jurídicos para que não se permita sua corrosão – como ocorreu com o positivismo clássico.
A maneira de pensar o direito mudou. Diversos foram os fatores que desencadearam essa mudança, entre eles identificam-se os massacres de seres humanos na segunda grande guerra, o pluralismo e a complexidade da sociedade contemporânea, a derrocada da pretensão de concretude dos códigos, a concreção de normas formalmente válidas que levavam a resultados materiais absurdos, entre outros. O positivismo não mais foi capaz de construir uma resposta lógica para as questões jurídicas contemporâneas, principalmente as mais complexas ou difíceis.
A justiça, em muitos momentos esquecida, não mais pode ser deixada para segundo plano. A sociedade exigiu a compatibilização da segurança jurídica (ponto forte do positivismo jurídico) com a justiça (ponto de busca incessante do pós-positivismo, sem o esquecimento daquela).
Com isso, surge um novo pensamento jusfilosófico denominado pós-positivismo, o qual é a base estrutural do pensamento constitucional atual, o neoconstitucionalismo. O novo constitucionalismo é estruturado filosoficamente, então, sobre os pilares do pós-positivismo.
Os valores ingressam no sistema jurídico, por intermédio dos princípios, com o intuito de permitir a tomada de decisões com base em parâmetros de justiça. Mas a fixação de critérios lógicos e racionais para a tomada de decisões nos casos difíceis é uma das críticas mais correntes em relação ao modelo apresentado.
O modelo pós-positivista (aproximação do direito com a moral, distinção entre princípios e regras, fixação do conteúdo da norma constitucional pelo aplicador do direito) é proposto com o objetivo de buscar compatibilidade do sistema jurídico com os anseios sociais, sobretudo nas questões difíceis.
Muitos critérios têm sido apresentados para a solução dessas questões difíceis como a tese da única decisão correta de Dworkin, a tese de Alexy que engloba a otimização (princípios como mandamentos de otimização a serem realizados na maior medida possível), compatibilizada com a lei da colisão e com os critérios de ponderação como uma pretensão de correção do direito, as teses argumentativas de MacCormick, entre diversas outras. Mas o presente trabalho não teve a pretensão de esgotar o tão discutido tema do novo paradigma[49] filosófico do direito constitucional.
Para a delimitação do objeto, não foram nele contempladas as discussões ressaltadas no parágrafo anterior quanto aos critérios para a busca de respostas racionais na aplicação desse modelo, solução que parece estar na argumentação jurídica – mas isso é tema para um próximo estudo.
Neste, buscou-se a apresentação do pós- -positivismo como parâmetro filosófico para o neoconstitucionalismo, destacando suas diferenças em relação ao positivismo e, sobretudo, suas características.
Por último, foram apresentados alguns alertas em relação a possíveis excessos de correntes extremadas que defendam o pós-positivismo sem uma reflexão crítica necessária à contenção do pensamento jurídico que possa sustentar a onipotência de qualquer dos Poderes do Estado.
O liberalismo idealizado pelas revoluções burguesas do século XIX encontrou seu ápice na economia fordista, baseada em maquinário pesado e na política da intervenção limitada do Estado na economia e na vida privada dos cidadãos.
E, atualmente, no entanto, tal modelo encontra-se desgastado pelo reconhecimento, por meio do Estado Social Democrático, de que o modelo liberal e incapaz de distribuir riquezas necessárias ao bem-estar de todos. Sustenta-se que vivenciamos nova fase capitalista do informacionalismo o que significa um certo tipo de acumulação flexível, que se vale da tecnologia para a geração de conhecimento e migração de capital, sem o reconhecimento de fronteiras.
O cenário globalizante, os referenciais institucionais, organizacionais, políticos e jurídicos, forjados desde o século XVII, perderam a sua centralidade e exclusividade, de modo que a preocupação pelos problemas nacionais é deixada de lado em prol do internacionalismo e da formação de blocos de Estados e organismos multinacionais que, por sua vez, passam a condicionar toda a pauta econômica, jurídica e social do globo.
Nossa atualidade pós-moderna, o poder e o direito não possuem um centro de referência absoluta, e a soberania líquida dos Estados está cada vez mais tênue e vem sendo substituída pela teoria do poder constituinte como uma tentativa de se conceber esse conceito como dispositivo instrumentalizador do princípio democrático.
Os reflexos das fraturas da pós-modernidade no mundo se revelam tanto na esfera íntima da subjetividade, o homem é diferente daquele que viveu em tempos modernos.
E, Zygmunt Bauman (2000) outro grande pensador, salientou que atualmente o homem se movimento no terreno da incerteza, já que os lugares sociais tradicionais (tal como a família, emprego e, etc.) têm sofrido mutações severas e sucessivas, ao ponto de não mais servirem de referencial da comunidade. E, por essa razão, o indivíduo hoje, vive como uma mônada a construir e reformular o seu lugar e sua identidade.
É que é outorgado o dever de dar sentido à sua existência, já que não pode recorrer a nenhum objeto estável que possa fazê-lo por ele. Tais fatores repercutirem na esfera política. Passando a ser uma disputa entre agendas de alternativas estanques, polarizadas por grupos de direita e de esquerda e ainda, por partidos políticos que contemporaneamente transformou o fazer política não mais restrito ao campo governamental[50].
A política e sua importância encontram-se fragmentadas entre o antigo e vetusto modelo estatal e os múltiplos atores transnacionais e as organizações civis de todo tipo que também exploram politicamente os seus propósitos e lutam entre si pela famélica hegemonia.
Conclui-se que a concepção teórica do direito vem-se transformando na pós-modernidade como reflexo de uma nova maneira de se encarar a própria função e o método de fazer ciência. A pós-modernidade, enfim, nos ensina a lidar com essas refrações buscando construir harmonia em plena complexidade, recusando fronteiras rígidas e métodos excludentes.
Reconhece-se que o mundo é volátil e que as identidades são provisórias e a marca do poder e da ideologia resta disseminada nos objetos, nos modos de que já não mais os percebemos com os olhos ingênuos e românticos de outrora, mas como peças fundamentais que interpelam sujeitos num jogo semiótico de linguagem que torna desimportante a sua composição física ou química para, enfim, destacar sua notória e necessária humanidade. Humano, demasiadamente humano.
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[1] O pós-positivismo surgiu como uma nova teoria no tocante à normatividade dos princípios após o fracasso filosófico do jusnaturalismo e do colapso político do positivismo jurídico apoiado pela Alemanha Nazista e Itália Fascista. “O pós-positivismo é a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da chamada nova hermenêutica e a teoria dos direitos fundamentais. O pós-positivismo tenta restabelecer uma relação entre direito e ética, pois busca materializar a relação entre valores, princípios, regras e a teoria dos direitos fundamentais e para isso, valoriza os princípios e sua inserção nos diversos textos constitucionais para que haja o reconhecimento de sua normatividade pela ordem jurídica. O pós-positivismo é aquele que é definido pelo Professor Barroso como: “designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da chamada nova hermenêutica constitucional, e a teoria dos direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da dignidade da pessoa humana”.
[2] É uma fórmula apócrifa que Luís XIV, rei da França e Navarra teria pronunciado em 13 de abril de 1655 perante os parlamentares parisienses. Recorda o primado da autoridade régia num contexto de desconfiança com o Parlamento, que contesta éditos reais proferido no leito da justiça em 20 de março de 1655. É a frase que melhor simboliza o absolutismo monárquico. Historiadores contestam que essa sentença, que não consta nos registros do parlamento, tenha sido pronunciada por Luís XIV, especialmente porque em seu leito de morte, o rei pronunciou uma sentença, atestada, completamente contraditória. “Eu, morro, mas o Estado permanecerá sempre”.
[3] A crise contemporânea desse conceito envolve a dificuldade de conciliar a noção de soberania do Estado com a ordem internacional. Doutra parte, a crise se manifesta sob o aspecto e a evidência de correntes doutrinárias ou fatos que ameaçadoramente, as quais disputam ao Estado sua qualificação de ordenamento político supremo, enfraquecendo e desvalorizando por consequência a ideia mesma de Estado. A negação da soberania do Estado ocorre mais nas teorias políticas do anarquismo e do marxismo. Compõe a essência da estatalidade, a saber, o monopólio social da coação organizada, o poder incontrastável de ditá-la e impô-la indistinta e irresistivelmente a todos os grupos sociais.
[4] A norma jurídica, por sua vez, poderia ser válida ou inválida, conforme estivesse, ou não, de acordo com a Norma Hipotética Fundamental (Grundnorm). Assim, para Kelsen, fatos sociais, relações intersubjetivas ou concepções do que é justo ou injusto não cabiam ao operador do Direito ou à Ciência Jurídica, mas à Sociologia ou à Filosofia do Direito, sob pena de se romper com uma estrutura racional e objetiva [16], elaborada em conformidade com os padrões da modernidade, cujo modelo era o Iluminista. Sim, porque, não custa lembrar que, para Montesquieu, o juiz deveria ser somente a boca da lei (“le juge est la bouche de la loi“). Em suas precisas palavras: “Poderia acontecer que a lei, que se aplica tanto aos cegos como aos deficientes visuais, demonstre, em alguns casos, demasiada exigente. Mas os juízes da nação são, como já dissemos, apenas a boca que pronuncia as palavras da lei, ou seja, seres inanimados que não podem restringir a força ou o rigor”.
[5] Em suma, há segurança jurídica quando o Direito serve de instrumento de orientação, de proteção e de tranquilidade para os cidadãos, de modo que eles possam praticar seus atos e realizar investimentos sem que sejam surpreendidos de modo abrupto e incoerente. Miguel Reale afirma que acerca do tema “segurança” deve-se observar a existência de “algo de subjetivo, um sentimento, a atitude psicológica dos sujeitos perante o complexo de regras estabelecidas como expressão genérica e objetiva da segurança mesma”. O autor adverte para uma distinção necessária: Há, pois, que distinguir entre o “sentimento de segurança”, ou seja, entre o estado de espírito dos indivíduos e dos grupos na intenção de usufruir de um complexo de garantias, e este complexo como tal, como conjunto de providências instrumentais capazes de fazer gerar e proteger aquele estado de espírito de tranquilidade e concórdia.
[6] Para Reale “certeza e segurança formam uma ‘díade’ inseparável”, pois:[…] se é verdade que quanto mais o direito se torna certo, mais gera condições de segurança, também é necessário não esquecer que a certeza estática e definitiva acabaria por destruir a formulação de novas soluções mais adequadas à vida, e essa impossibilidade de inovar acabaria gerando a revolta e a insegurança. Chego mesmo a dizer que uma segurança absolutamente certa seria uma razão de insegurança, visto ser conatural ao homem – único ente dotado de liberdade e de poder de síntese – o impulso para a mudança e a perfectibilidade, o que Camus, sob outro ângulo, denomina “espírito de revolta”.
[7] O ideal do Positivismo Jurídico é de “tudo no Estado e para o Estado, nada fora dele”. Nesta perspectiva, observa-se que “a ordem escrita se sobrepõe a todos os padrões de legitimidade e justiça: o justo e o legítimo são valores que a lei transcreve e prescreve, e aquilo que a lei não alcança não é Direito”. Assim, “o Normativismo se configura como um instrumento de conservação e reprodução da ordem jurídica instituída”. E tal, de uma forma ou de outra, implica em segurança jurídica para a manutenção do status quo.
[8] O Positivismo Jurídico de Bobbio e o Direito Justo é um estudo acerca da importância do direito justo para o Direito Positivo, possibilitando que fundamentos do Direito Natural integrem as normas legais, buscando meios para que o positivado reflita os ideais de justiça. Assim, no estudo a que se propôs, Bobbio concluiu que o positivismo jurídico é considerado sobre três aspectos: um modo de abordar o estudo do direito; uma teoria do direito; uma ideologia do direito.
[9]A Teoria Pura do Direito desenvolvida por Kelsen reduz a expressão do Direito à norma jurídica. Através de tal teoria, Kelsen pretendeu purificar o Direito, libertando-o de especulações filosóficas e sociológicas. O teórico austríaco adotou o raciocínio de Kant da distinção entre ser e dever-ser. Nessa obra, Kelsen busca desenvolver uma teoria científica do direito, definindo a ciência jurídica como campo de estudo cujo objeto são as normas jurídicas positivas. O autor sustenta a necessidade de renunciar ao até então enraizado costume de defender ideais políticos, de caráter subjetivo, em nome de uma ciência do direito supostamente objetiva. Na Teoria Pura do Direito, o estudo do direito divide-se, basicamente, em dois grandes ramos: Teoria estática do direito: concentra-se sobre as normas em vigor, reguladoras da conduta humana, e estuda a pessoa como sujeito jurídico, a capacidade jurídica, a relação jurídica, o dever, a sanção, a responsabilidade, os direitos subjetivos e as competências; Teoria dinâmica do direito: concentra-se sobre as normas em vigor que regulamentam o processo jurídico em que o direito é produzido e aplicado e estuda o fundamento de validade da ordem normativa e a estrutura escalonada da ordem jurídica(as relações hierárquicas entre as normas) A teoria proposta neste livro foi provavelmente a teoria mais influente do direito produzida durante o século XX. É, pelo menos, um dos pontos altos da teoria jurídica modernista.
[10] É todo o acontecimento ou fato exterior do homem dependente ou não de sua vontade e suscetível de produzir efeito jurídico. Pode-se concluir que a característica essencial desse fenômeno é a força (coercibilidade), no sentido de capacidade de se fazer impor efetivamente ou de obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa. O direito é assim o exercício da força institucionalizada a serviço da ordenação social. A palavra fenômeno, em grego fainómenon, de faino, significa mostrar-se, aparecer, tornar-se visível, reverter-se, guarda esse sentido originário, ou seja, significa o fato de algo aparecer ou tornar-se perceptível em face do ser humano.
[11] Kelsen concebe o ordenamento jurídico como um sistema hierárquico de normas em que a validade de uma norma pode ser verificada em função da sua conformidade com uma norma hierarquicamente superior. O sistema positivista não comporta o reconhecimento de uma lei moral objetiva ou de uma lei natural como critério de validade da norma positiva, nem indaga da justiça ou injustiça das leis. Se a norma está de acordo com a norma superior hierárquica numa cadeia sucessória ou piramidal, ela é válida. Qualquer referencial externo ao sistema jurídico é rejeitado. A última norma desta estrutura hierárquica, no entanto, não pode ter sua validade verificada em função de uma norma superior. Kelsen chama esta norma superior máxima de “norma fundamental”, a qual constitui o fundamento de validade de todo o sistema jurídico: Ordem é um sistema de normas cuja unidade é constituída pelo facto de todas elas terem o mesmo fundamento de validade. E o fundamento de validade de uma norma é – como veremos – uma norma fundamental da qual se retira a validade de todas as normas pertencentes a essa ordem. Uma norma singular é uma norma jurídica enquanto pertence a uma determinada ordem jurídica, e pertence a uma determinada ordem jurídica quando a sua validade se funda na norma fundamental dessa ordem.
[12] Ainda que defensor do positivismo jurídico, Hart não nega que os sistemas jurídicos contemporâneos são complexos e que positivaram princípios e valores morais que têm transcendência no que é o direito válido, uma vez que acrescentam dimensões éticas novas e mais intrincadas aos processos jurídicos de tomada de decisões. Hart queria que estivéssemos atentos a esta ameaça representada pela lei: à possibilidade de que uma norma seja juridicamente perfeita e, no entanto, moralmente iníqua. É verdade que, na filosofia hartiana, essa é apenas uma possibilidade. Hart não é um anarquista ou um marxista, descrevendo o glorioso “Estado de Direito” como sendo, necessariamente, uma ferramenta de dominação, um arranjo necessariamente imoral. Contudo, ele acreditava que o risco de uns se tornarem vítimas legais de outros seria muito maior se fôssemos jusnaturalistas (ou ainda o que chamam hoje de “pós-positivistas”) e atribuíssemos uma presunção moral a toda norma que considerássemos genuinamente legal. Talvez, não seja exagero dizer que, se Hart olhasse para o Brasil de hoje, ele atribuiria ao “pós-positivismo” de nossos juristas uma certa parcela de culpa por sermos ovelhas conduzidas tão docilmente para o matadouro pela elite que nos governa legalmente.
[13] Schmitt pode ser inscrito em uma tradição de pensamento crítico ao projeto da modernidade, e essa crítica se manifesta com maior força na desconstrução que o constitucionalista alemão faz do liberalismo, em suas vertentes política (O Parlamentarismo) e jurídica (o positivismo jurídico). No amparo de Weber, Schmitt enxerga a modernidade como uma época de desencanto causado pelo esvaziamento de sentido gerado pela eleição da racionalidade moderna como paradigma de legitimidade. A racionalidade moderna, essencialmente instrumental, segundo Weber, basear-se-ia no quantificável e manipulável, na redução do conhecimento à técnica e à forma, afastando assim a manifestação de sua real substância.
[14] Canotilho afirma que as ideias nucleares do princípio da segurança jurídica desenvolvem-se em torno de dois conceitos: (1) estabilidade ou eficácia ex post da segurança jurídica: uma vez adoptadas, na forma e procedimento legalmente exigidos, as decisões estaduais não devem poder ser arbitrariamente modificadas, sendo apenas razoável alteração das mesmas quando ocorram pressupostos materiais particularmente relevantes. (2) previsibilidade ou eficácia ex ante do princípio da segurança jurídica que, fundamentalmente, se reconduz à exigência de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos jurídicos dos actos normativos. Assim, temos agregados ao conceito de segurança jurídica a exigibilidade e a certeza de o direito sejam estáveis e previsíveis. Contudo a estes elementos não são estanques, podendo-se acrescentar outro mais, que é a justiça.
[15]Dworkin se opõe à ideia positivista de que o direito seja formado unicamente por normas e chama a atenção para o papel importante desempenhado por outros elementos dos sistemas jurídicos nas decisões judiciais: os princípios e as diretrizes políticas. Ronald Dworkin propõe que, para um regime político seja uma democracia, ele deve levar os direitos a sério e ainda, elabora uma teoria que sirva de base para os juízes decidirem e para a fiscalização de suas decisões pela sociedade. O autor faz, com clareza, a distinção entre o Poder Legislativo e o Poder Judiciário. O ponto central da crítica de Dworkin é o fato de que há ocasiões em que os juristas discutem a respeito de direitos e obrigações jurídicas e recorrem a padrões que não funcionam como regras, mas como “princípios, políticas e outros tipos de padrões”.
[16] John Rawls nos ofereceu novo paradigma filosófico e jurídico, contribuindo para o pós-positivismo como terceira via diferenciado do jusnaturalismo e do legalismo praticado pelo positivismo (que, conforme mencionado, também tem suas qualidades, tal como a segurança jurídica e ordem estatal), haja vista que de fato, conseguiu extrair do conceito de justiça a ideia da posição original, que é fundamental e necessária para a escolha dos princípios de justiça, que determina uma sociedade bem ordenada e, por conseguinte, a realização da justiça com a necessária equidade.
[17] Em “Pode haver uma teoria do direito?” o trabalho principal desse livro, Joseph Raz se ocupa dessas questões, e sua postura é rebatida em dois ensaios por Robert Alexy e por Eugenio Bulygin, que têm visões diferentes sobre o assunto. Joseph Raz oferece, finalmente, uma réplica às críticas. O filósofo supõe que práticas sociais não se referem a nada mais do que fatos socialmente praticados e, portanto, não as reconhece como fonte de normatividade. Com base nesse pressuposto, a natureza do direito não poderia ser investigada do mesmo modo como se investigaria a natureza de um jogo lúdico: aos olhos de Raz, ambos possuem estruturas lógicas e normativas completamente distintas. Com isso em vista, sustento que a divergência a respeito dessa questão de ordem ontológica gera um impasse insolúvel no debate a respeito da normatividade do direito.
[18] A regra de reconhecimento estabelece um critério ou critérios segundo os quais uma norma jurídica é identificada. A existência de regra de reconhecimento é uma questão de fato, empírica, na maior parte das vezes, sua existência não é enunciada. Hart definiu que a relação das regras secundárias, para ele, se dá da seguinte forma: Regras de reconhecimento que é atributiva de validade jurídica, define as competências e acaba com a incerteza das regras primárias.
[19] Positivismo jurídico exclusivo ou radical – defendido por teóricos como Joseph Raz, sustenta que a moral nunca interfere na definição do direito, seja para constatar a validade de uma norma, seja para interpretá-la. Na teoria de Joseph Raz, que é um dos maiores representantes do positivismo jurídico exclusivo, existem alguns conceitos fundamentais, quais sejam, razões de primeira ordem, balanço de razões, razões de segunda ordem e autoridade. As razões de primeira ordem são razões para agir, dentro desta classificação existem inúmeros desdobramentos, como, por exemplo, razões fortes, fracas, conclusivas, absolutas, entre outras. O balanço de razões está diretamente relacionado às razões de primeira ordem, é como se fosse o método que garantiria a melhor decisão, ou seja, através dele que, na consideração entre as várias motivações para agir, o sujeito escolherá qual delas deve preponderar. Já, as razões de segunda ordem são razões privilegiadas. Elas têm o efeito de suspender o balanço de razões e cancelar as demais razões de primeira ordem contrárias à razão privilegiada. As razões de segunda ordem são colocadas pela autoridade (prática ou teórica). Para Raz, que é um liberal, tanto Estado como indivíduo (para definir identidade ou alcançar um objetivo) têm autoridade para determinar as suas razões de segunda ordem. Entretanto, se determinadas pelo Estado, além de privilegiadas, são protegidas, isto é, tem primazia e prioridade sobre qualquer razão de segunda ordem contrária a ela. Enfim, elas fazem diferença prática. Contudo, na esfera moral do indivíduo, não há diferença prática, por isso o Estado não tem legitimidade para proteger determinado princípio moral. Nesse sentido o positivismo de Raz é exclusivo da moral.
[20] Já para os positivistas inclusivos ou inclusivistas os valores morais não são sempre decisivos para definir e aplicar o direito, mas as sociedades podem adotar convenções que prevejam que a moral deve ser levada em conta para se determinar a validade e interpretar o direito. Nega, assim, a existência de um poder verdadeiramente discricionário. Assim, eles aceitaram, de forma geral, a fenomenologia do julgar proposta por Dworkin, aceitando que os princípios morais desempenham importante papel no raciocínio jurídico, aceitando os, até mesmo, como princípios jurídicos.
[21] O pós-positivismo é tratado pelo Ministro Luis Roberto Barroso (A Nova Interpretação Constitucional, Renovar, 2003): “O pós-positivismo identifica um conjunto de ideias difusas que ultrapassam o legalismo estrito do positivismo normativista, sem recorrer às categorias da razão subjetiva do jusnaturalismo. Sua marca é a ascensão dos valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios e a essencialidade dos direitos fundamentais. Com ele, a discussão da ética volta ao Direito. O pluralismo político e jurídico, a nova hermenêutica e ponderação de interesses são componentes dessa reelaboração teórica, filosófica e prática que fez a travessia de um milênio para o outro.”
[22]As Leis de Nuremberg inverteram o processo de emancipação [em curso desde o século XIX], através do qual os judeus na Alemanha eram aceitos como membros com plenos direitos na sociedade e como cidadãos do país em total igualdade com os demais. As Leis de Nuremberg, aprovadas na Alemanha nazista, falavam, principalmente, a respeito das condições para que uma pessoa fosse considerada ou não cidadã alemã. Essas leis tratavam também sobre questões relativas à miscigenação e definiam uma nova bandeira para a Alemanha. As Leis de Nuremberg foram aprovadas em 15 de setembro de 1935 pelo Reichstag, o parlamento alemão. Abrangiam três diferentes leis a respeito da miscigenação, da cidadania e da bandeira da Alemanha nomeadas, respectivamente, como “Lei de Proteção do Sangue e da Honra Alemã”, “Lei de Cidadania do Reich” e “Lei da Bandeira do Reich”.
[23] Clèmerson Merlin Clève relaciona este novo momento de interpretação da constituição ao movimento/momento do neoconstitucionalismo. Destaca a ocorrência de uma mudança de paradigma: O importante, entretanto, é perceber a passagem de um paradigma, conhecido como paradigma do sujeito ou paradigma da consciência, para um outro, que chamamos de paradigma da linguagem. Nesse significativo momento, o Direito, que era compreendido como um objeto, e como tal era exterior ao sujeito cognoscente, passa a ser compreendido como algo que só tem sentido no campo da linguagem: é a linguagem que faz o objeto e sem ela não há objeto. Por conta dessa circunstância, a segurança jurídica não decorre mais apenas das características intrínsecas ao Direito, ao sistema normativo ou às próprias categorias jurídicas, e sim de uma bem fundada teoria da argumentação. Não houve uma superação de Kelsen, mas uma transposição de sua teoria: se o papel da ciência jurídica era definir uma moldura, e dentro dessa moldura qualquer solução seria aceitável, hoje nenhuma solução é aceitável sem argumentação. Uma carga argumentativa capaz de convencer, e não somente a autoridade, é imprescindível para justificar a legitimidade do discurso. A segurança jurídica, portanto, está no rigor da argumentação e da motivação, e não apenas na esfera do objeto do Direito que, fragmentado, sequer conforma um sistema. No campo da linguagem só se faz sistema por meio da atuação do operador jurídico.
[24]Professor de Filosofia do Direito na Universidade de Cstilla-La Mancha desde 1986, foi também professor do Centro de Estudos Políticos e Constitucionais e ministrou numerosos cursos e conferências em faculdades e outros centros de investigação nacionais e estrangeiros. Foi decano das Faculdades de Direito de Albacete e de Ciências Jurídicas e Sociais de Toledo, bem como membro da Comissão Consultiva de Liberdade Religiosa. Seu campo de concentração é a teoria do direito e dos direitos fundamentais, estendeu-se também para os problemas do direito constitucional e do eclesiástico.
[25] O positivismo jurídico inclusivo (inclusive legal positivism) é também conhecido como incorporationism ou soft positivism (termo traduzido para o português como: positivismo moderado). Essa abordagem é adotada por muitos autores contemporâneos, podendo citar os nomes de David Lyons, Jules Coleman e Wilfrid Waluchow. O positivismo brando ocorre no campo das ciências sociais, não possuindo, portanto, o mesmo rigor científico exigido no campo das ciências da natureza.
[26] O jurista Lenio Luiz Streck defende a tese da possibilidade de superação do positivismo pelo neoconstitucionalismo. E, tal tese possui versões mais profundas nos títulos Hermenêutica Jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito (2004) e Verdade e Consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas (2006). O jurista apontado defende que a hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo neoconstitucionalismo, a necessidade de superação do positivismo a partir da hermenêutica filosófica e do advento do novo constitucionalismo de cunho social e democrático, o que mostraria como fio condutor para a efetivação da materialidade de uma Constituição social e compromissória.
[27] De modo semelhante, o pós-positivismo não guarda relação com o jusnaturalismo que está ligado a concepções metafísicas e não sofre influência histórico-positivista. “A divisão positivista entre valores e fatos, longe de indicar uma solução, define um problema.”
[28] A ponderação é uma exigência da lei de colisão, descrita acima, que não aceita restrições de direitos fundamentais sem a adoção de um método racional. Portanto, daí surge a justificativa de Robert Alexy de que a proporcionalidade “é dedutível do caráter de princípio das normas de direito fundamental”. A consolidação da teoria da ponderação de direitos e de interesses permite a construção de um peculiar modelo de Estado de ponderação, como projeto constitucional dinâmico, aberto e pluralista. Mas, não se pode admitir que do paradigma ponderacionista resulte um insuprimível espaço de incertezas
jurídico-políticas, de diuturna e casuística relativização de direitos, com a progressiva corrosão das noções de legalidade e segurança jurídica e o consequente déficit de estabilidade social, política e econômica da comunidade. Como uma autêntica “Esfinge pós-moderna”, o modelo ponderacionista não pode ficar, caso a caso, a desafiar (devorar) os padrões mínimos de racionalidade e segurança do sistema jurídico-judicial, permitindo ao julgador verdadeira usurpação da autoridade legislativa constitucional e infraconstitucional, por meio de obscuras e iletradas ginásticas hermenêuticas, que muito mais procuram encobrir razões subjetivas (moralismo judicial) do que apresentar efetivas justificações jurídicas racionais. Aqui reside a encruzilhada de deslegitimação da teoria da ponderação de princípios, que flerta de forma cada vez mais perigosa, desavisada e recorrente com padrões moralistas de decisionismo judicial, o que reclama a consolidação de limites formais e materiais essenciais à manutenção da pretensão de racionalidade e segurança do discurso jurídico-judicial.
[29] Notou-se, igualmente, que em virtude do pluralismo cultural: “o mundo se revela e é interpretado de modo diferente segundo as perspectivas dos diversos indivíduos e grupos. Uma espécie de pluralismo interpretativo afeta a visão do mundo e a autocompreensão, além da percepção dos valores e dos interesses de pessoas cuja história individual tem suas raízes em determinadas tradições e formas de vida e é por elas moldada” (HABERMAS, 2007). Nesse quadrante, a aplicação tradicional do Direito tornou-se insustentável, a qual o Pós-positivismo Jurídico pretende superar, almejando a superação do Positivismo Jurídico que dominara a ciência jurídica no século XX. Referida teoria pretenderia, para tal, combater características supostamente atribuídas ao Positivismo Jurídico, que teria defendido a inexistência de princípios (ou desprovimento de caráter normativo dos princípios), tendo pregado que o Direito é um modelo de regras; a completude do direito, isto é, a inexistência de lacunas; a supremacia da lei ordinária sobre a Constituição; e a aplicação do Direito de forma mecânica, consubstanciada na subsunção. Ocorre que tais características se coadunam, propriamente, com o legalismo defendido pela Escola francesa da Exegese do século XIX, pois o Positivismo Jurídico defende posicionamentos totalmente contrários, conforme veremos a partir de agora.
[30] Pós-modernidade denota o que vem após a modernidade. O pensamento pós-moderno surgiu, pois, em oposição ao projeto de modernidade, elaborado pelo ideário Iluminista [10], nos Séculos XVII e XVIII, que fundava suas bases no triunfo da razão, da ciência, da verdade absoluta, da certeza, da objetividade, da neutralidade e do domínio do homem sobre o mundo. O Iluminismo ganhou força com a Revolução Francesa, uma vitória da burguesia, motivada por interesses próprios e que se valeu de premissas Iluministas, dentre elas o lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, que, por sua vez, contestava o poder absoluto dos reis. O Iluminismo lançou suas bases, predominantemente, na razão e na ciência, mas também defendeu a livre iniciativa como desenvolvimento do capitalismo, daí a afinidade para com a burguesia. Também data desta época a Independência dos Estados Unidos da América, igualmente alicerçada em bases Iluministas. A própria Revolução Gloriosa, na Inglaterra, e o movimento conhecido como Inconfidência Mineira, no Brasil, seguiram essa orientação.
[31] Dessa forma, Dworkin contraria um dos principais elementos do positivismo jurídico, qual seja: a tese da separabilidade entre direito e moral. Para Dworkin o direito é uma prática social cuja intencionalidade tem uma dimensão avaliativa moral e essencialmente argumentativa e, não simplesmente “autoritativa”. Na obra “o modelo de regras I” Dworkin inicia sua crítica ao positivismo jurídico, apontando três linhas de argumentação contra Hart, escolhido como seu primeiro interlocutor. Assim, a primeira crítica se refere à “tese das fontes sociais do direito”, denominada por Dworkin de “tese pedigree”, a qual preceitua que as normas jurídicas têm sua validade e sua juridicidade garantidas exclusivamente em razão de seu pedigree.
[32] Na visão Alexy que construiu sua teoria partindo da premissa de que os princípios, na qualidade de norma, fazem parte diretamente do ordenamento jurídico, sendo parte integrante desse. Por mandado de otimização, entendeu-se, algo que serve de orientação e cuja aplicabilidade deve ser a mais ampla possível, dentre possibilidades jurídicas existentes para o fato.
[33] Josef ou Joseph Esser (1910-1999) foi jurista, professor universitário alemão. Seu trabalho mais popular é um Manual de Direito das Obrigações, denominado simplesmente de Schuldrecht, que teve muitas edições, e ao qual foi dada continuidade por seus admiradores. Reconhecido também por trabalhos sobre filosofia, metodologia, e teoria do Direito. Josef Esser cogita, aqui, em “princípios problemáticos” expressão que, em sua obra, serve para abarcar a tradição que se desenvolve na segunda metade do século XX na qual se dá primazia para o “momento” concreto de aplicação do direito, em detrimento do “momento” abstrato-sistemático. É importante advertir, todavia, que esta denominação não pode ser aceita de uma maneira acrítica. Isto porque, no cenário das teorias jurídicas contemporâneas, esse caráter “problemático” assumido pelos princípios jurídicos poderá ser encarado de diversas maneiras. No caso de Esser, apesar de se valer constantemente da experiência anglo-saxã a partir daquilo que se denomina comparative jurisprudence, sua abordagem se aproxima em grande medida da tópica de Viehweg, o que não está em jogo nesta investigação. No entanto, não cabe aqui uma abordagem minuciosa desta questão. Importa neste momento compreender em que sentido tal significado do conceito de princípio se diferencia dos demais e como, de alguma maneira, faz os dois significados anteriores entrarem em crise e, com eles, também os conceitos de fundamentação e discricionariedade se tornam problemáticos.
[34] Nathan Roscoe Pound (1870-1964) foi um jurista norte-americano e professor de direito. Foi também Reitor da Faculdade de Direito da Universidade de Nebraska de 1903 a 1911 e, em seguida, Reitor da Faculdade de Direito de Harvard, de 1916 a 1936. Foi um dos juristas mais citados do século XX. Roscoe Pound também fez uma contribuição significativa à jurisprudência na tradição sociológica da jurisprudência, que ressaltava a importância das relações sociais no desenvolvimento do direito e vice-versa. Sua teoria mais conhecida consiste no conceito do direito como engenharia social. De acordo com Pound, um legislador atua como um engenheiro social, por tentar resolver problemas na sociedade utilizando o direito como uma ferramenta.
[35] O pós-positivismo também está presente em nosso país, o renascimento do Direito Constitucional se deu, igualmente, no cenário de reconstitucionalização do Brasil, por ocasião da discussão prévia, convocação, elaboração e promulgação da CFRB de 1988. Sem embargo de vicissitudes de maior ou menor gravidade de seu texto e, da compulsão com que tem sido emendada ao longo de sua existência, a Constituição foi capaz de promover de maneira bem-sucedida, a travessia do Estado brasileiro de um regime autoritário, intolerante, por vezes, violento para um Estado Democrático de Direito. A presente e vigente constituição federal brasileira tem propiciado o mais longo período de estabilidade institucional da história da república pátria
[36] Basicamente o pós-positivismo leva em consideração princípios e valores para determinar a interpretação legal. O pós-positivismo não nega o positivismo, mas transcende sua visão de Direito apartado das outras ciências sócias, o que quer dizer que este nega a separação entre Direito e moral. Note-se que “há a superação do modelo no qual a constituição era vista como um documento essencialmente político” (NOVELINO, 2010), buscando-se como nunca sua efetivação, sob o viés de um Estado Democrático de Direito, cujas características são apontadas por Streck e Morais: “tem como princípios a constitucionalidade, entendida como vinculação deste Estado a uma Constituição, concebida como instrumento básico de garantia jurídica; a organização democrática da sociedade; um sistema de direitos fundamentais individuais e coletivos, de modo a assegurar ao homem uma autonomia perante os poderes públicos, bem como proporcionar a existência de um Estado amigo, apto a respeitar a dignidade da pessoa humana, empenhado na defesa e garantia da liberdade, da justiça e solidariedade; a justiça social como mecanismo corretivo das desigualdades; a igualdade, que além de uma concepção formal, denota-se como articulação de uma sociedade justa; a divisão de funções do Estado a órgãos especializados para seu desempenho; a legalidade imposta como medida de Direito, perfazendo-se como meio de ordenação racional, vinculativamente prescritivo de normas e procedimentos que excluem o arbítrio e a prepotência; a segurança e correção jurídicas” (STRECK; MORAIS, 2006).
[37]A teoria do Mínimo Ético desenvolvida no mundo jurídico pelo jurista alemão Georg Jellinek, afirma que o direito consiste em um estreito conjunto normativo que estabelece regras morais para a sobrevivência da sociedade. A Teoria do Mínimo Ético é uma teoria sobre a natureza do Direito instituída por Jeremy Bentham e desenvolvida por Georg Jellinek. A teoria afirma que o Direito seria um conjunto mínimo de regras morais obrigatórias para a sobrevivência da moral e, consequentemente, da sociedade. O direito apenas atuaria como instrumento para o cumprimento destes preceitos morais básicos. Nesta teoria, parte-se fundamentalmente de que nem todos os indivíduos estão dispostos a aceitar todos os preceitos morais básicos à estabilidade social. Portanto, o direito seria como uma ferramenta que teria como função garantir o cumprimento deste mínimo ético necessário, por parte dos indivíduos, para a sobrevivência da sociedade. Assim, figurativamente o direito estaria contido dentro da moral.
[38] Para Raz, o Estado de Direito em seu sentido amplo “significa que as pessoas devem obedecer às leis e serem reguladas por elas. Porém, em uma teoria política e jurídica, ele deve ser lido de uma maneira mais estrita, no sentido de que o governo deve ser regulado pelas leis e submetido às mesmas”. O Estado de direito é aquele em que o Poder exercido é limitado pela Ordem Jurídica Constitucional. Nele irá dispor a forma de atuação do Estado, suas limitações e funções, e porventura, as garantias e direitos dos cidadãos, dos governados. Correto afirmar que o Estado é submetido às regras do Direito.
[39] Pontes de Miranda não distinguia regras de princípios e há uma sinonímia com as normas jurídicas e a lei, como uso indistinto, como se pode verificar em sua obra: MIRANDA, P. 2000. Discernente o mundo jurídico e o que, no mundo, não é mundo jurídico.
[40] Diante dos princípios, constata-se que não existem brechas para a atuação discricionária do juiz, uma vez que contemplam o modo concreto de enfrentamento da discricionariedade judicial e sintetizam a manifestação da densidade da normativo-concreta de um mandamento legal, o que demanda singularização, que só ocorre no momento aplicativo.
[41] Hart não se preocupa em tematizar o conteúdo bom ou mau de uma decisão judicial, já que na zona de penumbra, ou no campo da discricionariedade as decisões estão sempre certas, na medida em que o juiz está amparado por uma regra secundária que lhe confere essa autoridade. Esses está amparada por uma regra secundária que lhe confere essa autoridade. Esses referidos componentes, ignorados por Hart e, que são distintos das regras que operam em casos difíceis como princípios, políticas e outros tipos de padrões. A análise, em discordância, de Hart, Dworkin sustentou que a atividade judicial não consistiria tão-somente na aplicação de regras, mas que haveria outros fundamentos possuidores de status jurídicos e que serviriam como guias de uma decisão judicial, inclusive nos casos em que há a referida zona de penumbra, de forma que não é dado ao julgador a prerrogativa de atuar com discricionariedade, sequem em casos excepcionais.
[42] Herbert Lionel Adolphus Hart (Harrogate, 18 de julho de 1907 – Oxford, 19 de dezembro de 1992), referido como H. L. A. Hart foi professor de Teoria do Direito (Jurisprudence) da Universidade de Oxford, de 1952 a 1968. Sua obra O Conceito de Direito é um marco do pensamento jurídico do século XX. Hart foi um dos responsáveis pela aproximação da filosofia da linguagem com o Direito, sendo também um dos principais nomes vinculados ao positivismo jurídico. Tamanha foi a contribuição e a relevância de sua obra que grande parte da produção científica da Teoria do Direito, após a publicação da primeira edição do Conceito de Direito, acolhia ou rejeitava suas premissas, sem deixar de considerá-las. Assim, Hart influenciou toda uma geração de juristas, tais como Ronald Dworkin, Joseph Raz e Neil MacCormick. Seu trabalho ainda é discutido em escolas de Direito de todo o mundo.
[43] Estado Democrático de Direito, Soberania Popular, Soberania, Cidadania, Dignidade da Pessoa Humana, Valorização do Trabalho, Livre iniciativa e Pluralismo Político. A invocação a Deus, presente no preâmbulo da CF, reflete um sentimento religioso, o que não enfraquece o fato de o Estado brasileiro ser laico, ou seja, um Estado em que há liberdade de consciência e de crença, onde ninguém é privado de direitos por motivo de crença religiosa ou convicção filosófica.
[44] J. J. Gomes Canotilho, corroborando a tese de que os conceitos de ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada estão relacionados com a segurança jurídica leciona: Os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica podem formular-se assim: o cidadão deve poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições jurídicas e relações, praticados ou tomadas de acordo com as normas jurídicas vigentes, se ligam os efeitos jurídicos duradouros, previstos ou calculados com base nessas mesmas normas. Estes princípios apontam basicamente para: (1) a proibição de leis retroactivas; (2) a inalterabilidade do caso julgado; (3) a tendencial irrevogabilidade de actos administrativos constitutivos de direitos.
[45]Um tribunal ou Corte Constitucional é o órgão judiciário ou não, cuja principal função é zelar pela correta interpretação e aplicação da Constituição, ou seja, julgar se determinado tema é constitucional ou inconstitucional. Segundo o modelo de Hans Kelsen, o tribunal constitucional atuaria como legislador negativo, pois não tem a faculdade de criar leis, mas no caso de que entenda que uma das promulgadas vulnera o disposto na Constituição, tem o poder para retirá-la do ordenamento jurídico, revogando-a total ou parcialmente.
[46] O ativismo judicial é um termo técnico para definir a atuação expansiva e proativa do Poder Judiciário
ao interferirem em decisões de outros poderes. É termo ambíguo, sendo que o seu emprego foi utilizado na Revista americana Fortune, voltada para um público não jurista. Atribui-se ao jornalista Arthur Schlesinger Jr., quando traçou o perfil dos juízes norte-americanos classificando-os como ativistas e como não-ativistas. Kermit Roosevelt III observou que: “O termo ativismo judicial, como é tipicamente usado, é essencialmente vazio de conteúdo; é simplesmente uma maneira inflamada de registrar a desaprovação frente a uma decisão. Esse tom de denúncia associado à expressão “ativismo judicial” tem se dirigido, tradicionalmente, às cortes de viés político liberal, principalmente à paradigmática Corte Warren. Nos últimos anos, o reverso da moeda também se verifica, com artigos que demonstram que o ativismo também pode estar presente em cortes de tendência conservadora13. Hoje, por exemplo, alega-se que a Corte Rhenquist, apesar de sua matriz conservadora, foi bastante ativa judicialmente. (AAVV, Ativismo jurisdicional e o Supremo Tribunal Federal. Organizadora Vanice Regina Lírio do Valle. Curitiba: Juruá Editora, p.21.)
[47] Os princípios constituem os fundamentos de validade do sistema jurídico de conhecimento, no qual o Direito está inserido como tal. Não se admitindo a caracterização de validade ou invalidade assertiva, da proposição descritiva. Segundo Canotilho, os princípios hermenêuticos desempenham uma função argumentativa, permitindo, por exemplo, denotar a ratio legis de uma disposição (…) ou revelar normas que não são expressas por qualquer enunciado legislativo, possibilitando aos juristas, sobretudo aos juízes, o desenvolvimento, integração e complementação de direito.
[48] A controvérsia não envolve apenas as teorias de Hart e a de Dworkin, tais autores seriam apenas figuras representativas da discussão. Trata-se de um conflito entre uma teoria do direito de tradição positivista e uma tradição pós-positivista (ou interpretativista construtiva). Divergências teóricas estão, portanto, presentes apenas em alguns casos difíceis e não podem ocorrer acima de um nível no qual trariam indeterminação e imprevisibilidade para o direito. Trata-se de uma limitação estrutural à existência de desacordos teóricos que, compreendidos dessa forma, são compatíveis para a existência da regra de reconhecimento não exige unanimidade na aplicação de todos os seus preceitos, basta que haja convergência do comportamento da maioria das autoridades acerca das consequências jurídicas da maioria dos atos.
[49] Nesse paradigma de Estado Constitucional, a eficácia da Constituição ocupa um papel central, principalmente, no que diz respeito à efetivação dos direitos fundamentais. A premissa defendida pelo constitucionalismo moderno, defensor de que a distinção entre normas constitucionais e infraconstitucionais se limitava a graus, foi abandonada, defendendo-se agora, além disso, uma diferença axiológica, sendo encarada a Constituição como um valor em si, como aduz Pedro Lenza:
“A Constituição nesse novo cenário passa a ocupar o centro do sistema, devendo os Poderes Públicos, quando da observação e aplicação das leis, além das formas prescritas na Constituição, estarem em consonância com seu espírito, seu caráter axiológico e seus valores destacados” (LENZA, 2009, p. 09-10).
Nesse viés Constitucional deve-se garantir o funcionamento adequado do sistema de participação democrática, ficando a cargo da maioria em cada momento histórico vivido, desde que seja respeitada a diferença de opiniões, a incumbência de definir seus valores e suas convicções, devendo-se assegurar as condições dignas a todos, com ênfase na tutela e efetividade dos direitos fundamentais (LENZA, 2009).
[50]A visão do direito normativo fundamentou-se ao longo da história em regras de conduta que teriam sido reveladas por Deus, apreendida pela razão e inspirada pela natureza, e, por derradeiro, para formar um sistema de princípios universalmente válidos que deveriam servir de pressupostos ao sistema de direito positivo, como forme de aferir-lhe a justiça e, o modo adequado de resolver o problema das desigualdades sociais, políticas, econômicas.