O Acordo de Não Persecução Penal – ANPP se introduziu ao instrumento de política criminal brasileiro por meio da Resolução nº 181/2017 alterada pela Resolução nº 183/2018, ambos do Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP, editadas com base nas competências do Conselho Nacional do Ministério Público disposto no art. 130-A, § 2º, da Constituição Federal.
Em âmbito internacional, muitos países já adotam procedimentos de justiça negociada como instrumento de política criminal. No Brasil, há previsões legais de acordos do investigado com o Ministério Público em âmbito criminal, são elas: suspensão condicional da pena, transação penal, suspensão condicional do processo, delação premiada e, atualmente, o Acordo de Não Persecução Penal.
A Organização das Nações Unidas – ONU, a qual o Brasil é Estado-Membro, aprovou as Regras de Tóquio, elaborando as “Regras Mínimas Padrão das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas não Privativas de Liberdade”, que estabelece a necessidade de medidas alternativas criminais.
Nos princípios gerais da Regra de Tóquio, estabelece-se que os Estados-Membros devem desenvolver em seus sistemas jurídicos medidas não privativas de liberdade para proporcionar outras opções e assim reduzir a utilização do encarceramento e racionalizar as políticas de justiça criminal, levando em consideração a observância aos direitos humanos, as exigências da justiça social e as necessidades de reabilitação dos infratores.
Inicialmente, o ANPP constava somente nas resoluções do CNMP, não havendo outra previsão legal. Após inúmeras discussões sobre a inconstitucionalidade deste instrumento de justiça criminal negociada, presente somente nas Resoluções nº 181/2017 e nº 183/2018, a Lei nº 13.964, de 2019 – Lei Anticrime introduziu o Acordo de Não Persecução Penal ao Código de Processo Penal, em seu novo artigo 28-A.
Conforme a previsão legal, o procedimento do acordo será possível quando não for o caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima de 4 (quatro) anos.
As condições para que seja pactuado o acordo estão dispostas nos incisos I ao V. As regras gerais estão elencadas nos § 1º e §2º. As formalidades estão previstas no § 3º e §4º. As atividades judiciais e atribuições ministeriais estão dispostas nos §5 ao § 14º.
Conforme o § 2º do dispositivo em discussão, será inaplicável o acordo de não persecução nas seguintes hipóteses: I – se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; III – ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e, IV – nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.
O §14º dispõe sobre a hipótese de recusa do Ministério Público em propor o acordo, no qual informa que o investigado poderá requerer remessa ao órgão superior, adotou-se, portanto, mesma regra do art. 28 do Código de Processo Penal.
Recentemente, o Centro de Estudos do Conselho da Justiça Federal realizou a I Jornada de Direito Penal e Processo Penal, aprovando 32 enunciados. Entre eles, o CEJ/CJF homologou o Enunciado nº 32 que trata sobre o poder-dever do Ministério Público em propiciar o Acordo de Não Persecução Penal.
O enunciado dispõe que a proposta de acordo de não persecução penal representa um poder-dever do Ministério Público, com exclusividade, desde que cumpridos os requisitos do art. 28-A do CPP, cuja recusa deve ser fundamentada, para propiciar o controle previsto no §14 do mesmo artigo.
O Enunciado de nº 32 rechaça a mera discricionariedade do Ministério Público em não oportunizar ao imputado, por mera liberalidade, o benefício previsto no art. 28-A do Código de Processo Penal. Assim, o instrumento de ampliação do espaço negocial no âmbito criminal deverá ser propiciado ao imputado ao atender os requisitos previstos no caput do art. 28-A do Código de Processo Penal.
Aliás, no Brasil, em média, os processos criminais que tramitam no Poder Judiciário duram cerca de 3 anos e 1 mês somente na fase de conhecimento, de acordo com o 13ª Relatório Justiça em Números, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça, portanto, perfeitamente necessário o ANPP para viabilizar a celeridade nas resoluções das lides criminais.
Em suma, o ANPP aparece no contexto brasileiro como forma de tornar menos burocrático o sistema criminal, dirimindo a complexidade na aplicação da punição nas infrações de menor lesividade, bem como reduzindo o encarceramento, além de tornar o Poder Judiciário mais eficiente e adequado.
REFERÊNCIAS:
Conselho Nacional de Justiça: Regras de Tóquio: regras mínimas padrão das Nações Unidas para a elaboração de medidas não privativas de liberdade/ Conselho Nacional de Justiça; Coordenação: Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi – Brasília: CNJ, 2016.
Justiça em Números 2020: ano-base 2019/Conselho Nacional de Justiça – Brasília: CNJ, 2020.
RESOLUÇÃO Nº 181, DE 7 DE AGOSTO DE 2017.
RESOLUÇÃO Nº 183, DE 24 DE JANEIRO DE 2018.
Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019.