Julgamento Fracionado
Analisar as possibilidades e os limites da técnica de julgamento fracionado do mérito, bem como a possibilidade de solucionar problemas advindos do sistema recursal que ainda não é adaptado à nova realidade processual brasileira contemporânea.
A cisão do julgamento do mérito traz relevantes consequências no momento de formação da coisa julgada material, o que vem sendo constantemente objeto de julgamentos pelo Superior Tribunal de Justiça. E a prevalente jurisprudência procura de fato extrair o máximo de efetividade processual sem vulnerabilizar a segurança jurídica.
Propõe-se a eliminação da crise de adimplemento de obrigações que deverá ocorrer de forma uniformizada, em processo único, que se divide comodamente em etapa cognitiva seguida de fase executiva, separadas apenas por uma sentença denominada de executiva lato sensu.
Nessa fase da reforma se eliminou como regra, o processo de execução autônoma, de maneira a propiciar a maior efetivação da tutela condenatória, promovendo-se no mesmo processo, todos os atos executivos necessários, evitando-se, o ajuizamento de nova ação, bem como das implicações daí decorrentes.
É patente a ineficiência do exercício da função jurisdicional, o que relega aos jurisdicionados à qualidade de consumidores insatisfeitos, restando desamparados e descrentes da justiça brasileira, gerando a postura de acomodação e renúncia de direitos e mesmo de garantias constitucionais.
Apesar de ter sido louvável o intuito do legislador, a medida não foi isenta de críticas. Pois é preciso considerar que o processo judicial é um procedimento realizado em contraditório, cujas variações internas devem ser abonadas tão-somente pela necessidade de adequar a técnica processual aos objetivos almejados.
Portanto, o aproveitamento da mesma relação jurídica processual, havendo atos cognitivos, antecipatórios, acautelatórios e executivos, não representa mais do que mera alteração procedimental, que deve buscar sua justificação na aptidão de obter o fim a que se propõe, resultante em maior efetividade dada à tutela condenatória de pagamento em dinheiro.
De fato, a morosidade do processo é a maior responsável pela perda de credibilidade e respeito do Judiciário junto ao povo. E mesmo as mais variadas reformas processuais não conseguiu ainda sanar esse problema.
A intempestividade da tutela jurisdicional está relacionada à técnica processual, mas é preciso refletir que a tão buscada celeridade processual e efetividade não pode ser simplesmente traduzida e nem confundidas. Existem ainda outros fundamentais valores relacionados à segurança do processo, que não devem ser preteridos nem mesmo sob a desculpa de se combater à morosidade.
Afinal, processo efetivo é capaz de aplicar a regra de direito material de forma justa e tempestiva, encerrando e dirimindo definitivamente o litígio, sem causar injusto prejuízo a qualquer dos litigantes. E, para tanto se faz necessária a equação que equilibre a celeridade e a segurança. Pois o resultado final dessa equação tem que ser uma justiça mais aperfeiçoada e além de mais rápida.
Não basta eliminar os formalismos antigos e desnecessários seja através da criação de novas técnicas que consigam atender de modo satisfatório às necessidades sociais em constante mutação, e a alteração que maior impacto produziu no sistema processual brasileiro foi a Lei 11.232 de 2005 que ficou conhecida por corresponder a terceira fase da reforma do CPC de 1973.
Havia a necessidade de se atribuir maior grau de efetividade nas tutelas condenatórias que envolvem a obrigação de dar, fazer e não fazer ao fato de que nestes casos se prescinde de processo de execução autônomo para sua efetivação, e a execução de quantia em dinheiro.
Buscou-se então pela técnica de julgamento parcelado do mérito, escapar da tutela condenatória tradicional, efetivada mediante dois processos diferentes, a saber, um de cognição e, outro de execução.
Infelizmente o legislador pátrio partiu de falsa premissa na formulação da técnica processual, pois a desnecessidade de se efetivar as tutelas condenatórias de obrigação de dar, fazer ou não fazer em processo autônomo não é causa de sua menor capacidade satisfativa.
Ao revés, o que realmente se verifica é que a desnecessidade de processo de execução autônomo em hipóteses tais é consequência da natural maior efetividade que é inerente a estas modalidades da tutela condenatória.
Realmente, existem tutelas jurisdicionais que propiciam a plena satisfação do direito trazido a juízo com a simples prolação da decisão pelo magistrado. E, são aquelas destinadas a solucionar as crises do direito material envolvendo a certeza quanto a determinada relação jurídica ou a necessidade de modificação de situação jurídica.
Assim, nestas duas hipóteses correspondentes às tutelas declaratórias e constitutivas, o próprio ato decisório do magistrado é suficiente para concretizar o direito postulado, não sendo necessária a prática de qualquer medida posterior. Portanto, trata-se de tutelas plenamente satisfativas.
É diversa a situação em relação à tutela condenatória, posto que a crise de direito material decorrente do inadimplemento de uma obrigação não é eliminada por simples prolação da decisão judicial. A integral satisfação da pretensão executiva somente ocorre mediante a prática de atos materiais aptos a alcançar tal fim, salvo se houver colaboração espontânea do devedor.
Assim, inexistente o adimplemento espontâneo, o credor poderá requerer o cumprimento da obrigação que, a depender da espécie, poderá ser realizado por meio de métodos coercitivos, no caso de obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa, como por exemplo, as astreintes e, etc, ou sub-rogativos (no caso de obrigação de pagar quantia, como por exemplo, a penhora, a alienação do bem, a realização de ativo e pagamento).
Aliás, a efetividade da tutela condenatória depende diretamente da prática destes atos materiais de execução, pouco importando se realizam em processos novos ou no mesmo processo.
É certo, porém, não haver dúvida de que a simplificação procedimental tem o poder de conferir maior celeridade e efetividade, sendo válida, portanto, a opção pelo método escolhido pelo legislador como mais eficaz e apto a alcançar o objetivo da jurisdição. Tal qual a técnica de passagem da cognição à execução sem a solução de continuidade da relação jurídica processual.
Porém, não é a mera eliminação da necessidade de instauração de novo processo autônomo para a satisfação do direito judicialmente reconhecido que irá conferir à tutela condenatória a capacidade de por si só, dar conta do integral cumprimento do comando contido e explícito na sentença.
Cabe recordar também que para que o autor, credor receber a quantia que lhe seja de direito, é imprescindível e necessário que o réu, devedor tenha bens suficientes para tanto, para que o requerente obtenha o quadro a que o famoso artista se obrigou a pintar, é preciso que o requerido voluntariamente, ainda que não de forma espontânea, o pinte e o concretize.
Diante da inexistência de patrimônio apto para adimplir a obrigação pecuniária, ou se o réu se recusar a realizar a obrigação de fazer de cunho personalíssimo, arcando por sua conta e risco com todas consequências do descumprimento da decisão judicial, estará configurada situação de não efetividade da tutela condenatória para qual inexiste alteração legislativa apta a trazer solução.
Diante de tal situação material geradora de falta de efetividade, afirma-se que nada mais igual do que a execução antes e depois da reforma promovida pela Lei 11.232/2005. (In: ASSIS, Araken de. Manual de Execução Civil. 10.ed., São Paulo: RT, 2006.
Como não há mais solução de continuidade entre cognição e execução, passou ser inapropriada conceituar a sentença como ato do juiz que extingue o processo, com ou sem a análise ou resolução do mérito.
Portanto, abandonou-se o critério topológico vigente na redação original do artigo 162, primeiro parágrafo do CPC/1973, valendo-se o legislador para a definição não mais o fato de extinguir o processo. Mas sim, que implique nas hipóteses contidas nos artigos 267 e 269 do mesmo diploma legal.
Assim, no mesmo sentido foi também modificado o artigo 463 do CPC/1973, visto que ser incompatível com o modelo então adotado, a noção de que o juiz, ao prolatar a sentença, cumpre e encerra seu dever jurisdicional. E, com aquela sistemática, este ofício pode se estender para além da fase cognitiva, vindo a se encerrar somente ao término da fase de cumprimento de sentença.
Afora isso, Athos Gusmão Carneiro observava que desde sempre o juiz praticava seu ofício jurisdicional não apenas ao prolatar a sentença, fazendo-o ao longo de todo processo, desde que admite a petição inicial, e não apenas ao proferir a sentença; além disso, com a prolação da sentença, embora seja o ato culminante do processo, o juiz não acaba o ofício jurisdicional, que prosseguirá com as atividades processuais decorrentes da interposição de recurso e do cumprimento da própria sentença ou do acórdão que eventualmente venha a substituí-la.
A realidade desenhada é evidente tanto que a sentença passou a ser definida por seu conteúdo, não sendo mais indispensável para sua qualificação, o efeito de encerrar o processo, ou numa eventual fase cognitiva.
E, não há mais outra opção senão se extrair a interpretação mais adequada que confira ao processo a máxima capacidade de produção de resultados, à luz do devido processo legal.
Ex positivis, com a desacumulação de demandas, ou seja, com a técnica de decomponibilidade do objeto processual litigioso, através de prolação de sentenças parciais ao longo do processo sincrético, defendeu-se ter sido afastado do ordenamento jurídico brasileiro, o princípio da unicidade do julgamento do mérito, sendo possível ao juiz, em prol da celeridade e da efetividade processual, julgar de forma fatiada o objeto litigioso, desde que existam demandas maduras e aptas para tanto, prosseguindo-se o processo tão-somente em relação às questões que ensejassem maior dilação probatória.
Anote-se que parte da renovação da discussão travada quando da inclusão do sexto parágrafo no artigo 273 do CPC/73 como a antecipação de tutela de parcela incontroversa do pedido, ocasião em que parte da doutrina identificou tal hipótese como decisão calcada em cognição exauriente, representando verdadeiro fracionamento do julgamento do mérito.
Afora isso, a possibilidade de prolação de mais de uma sentença ao longo do processo trouxe maiores repercussões na seara recursal, visto que esta não fora contemplada pela reforma, deixando de receber as adaptações necessárias decorrentes da modificação do conceito de sentença.
Diante da impossibilidade de remessa dos autos à instância superior, muito discutiu a doutrina sobre o recurso cabível contra a sentença parcial. Cogita-se mesmo do manejo do agravo de instrumento, chegando-se até mesmo à inovação de propor o uso de apelação por instrumento. (In: Martins, Renato Castro Teixeira. Apelação por instrumento; In: Medina, José Miguel Garcia (coord.)
Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais. (Estudos em homenagem à professora Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: RT, 2008).
Ainda não foram fincadas pela jurisprudência brasileira as balizas a serem seguidas, e, assim merece destaque no sistema recursal o princípio da fungibilidade, que, diante da insegurança criada, encontra fértil campo de incidência.
Ademais, devem ser analisadas as consequências do julgamento fracionado do mérito na formação da coisa julgada material e, ainda, no uso de eventual ação rescisória, sendo imprescindível considerar o teor da Súmula 401 do STJ, a qual, ao adotar o entendimento prescreve que o prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.
A Lei 11.232/2005 trouxe consigo relevantes incertezas. e vultosa discussão doutrinária sobre o conceito de sentença, a possibilidade de julgamento fracionado do mérito, ao recurso cabível em face da decisão que analisa só uma parcela do mérito; a formação da coisa julgada material e o início do prazo para ajuizamento de ação rescisória em tais situações.
Há o aparente conflito de valores no âmbito processual civil entre segurança versus celeridade, que deve ser sopesado pelos aplicadores do direito de acordo com as disposições constitucionais aplicáveis, na busca da duração razoável do processo e da efetividade processual.
Lembremos que no CPC brasileiro de 1939 eram previstos dois tipos de sentenças, contras as quais eram impugnáveis por recursos diversos: Se a decisão tivesse analisado o mérito, ou seja, sentença definitiva, interpunha-se o recurso de apelação. Mas, se proferida tão-só a decisão terminativa, caberia o agravo de petição. E, nessa linha, o conteúdo do ato determinava qual o recurso a ser manejado, gerando situações de incerteza, diante da grande dificuldade em se definir o próprio conceito de mérito.
Para tanto, usou-se a definição fulcrada nos efeitos que o ato produzira, o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, em detrimento de seu conteúdo, decidindo ou não o mérito da causa.
É certo que em certo momento histórico, percebeu-se que a simplificação recursal não foi suficiente para atingir a almejada efetividade processual, tendo a comunidade científica e, posteriormente, o legislador considerado como imperiosa a adoção de novo modelo estatal de solução de conflitos, capaz de supera a velha dicotomia existente entre a cognição e a execução, o chamado processo sincrético.
Assim, a sentença deixou de ser o ato que põe fim ao processo, abandonando o critério topológico, para tornar-se o ato do juiz que tem determinado conteúdo previsto em lei (implica algumas das situações previstas nos arts. 267 e 269 CPC/1973).
Visualizou-se, portanto que a estrutura processual existente e, mesmo a vigente, ainda não é suficiente para se galgar o objetivo tão cobiçado que é o processo efetivo, sendo imprescindível modificar a classificação de sentença, até então em vigor, para a adaptá-la ao modelo sincrético introduzido.
Conclui-se que o conteúdo e o significado de sentença é mesmo definido pelo legislador, conforme as finalidades visadas, os quais decorrem naturalmente da política processual adotada em certo momento histórico, devendo, portanto, ser analisada à luz da ordem jurídica vigente.
A admissão do fatiamento do julgamento do mérito para parcela da doutrina entende que a inclusão do critério do conteúdo na definição dos provimentos judiciais é uníssona na identificação da sentença de mérito. Tal harmonia não se verifica em relação à classificação da decisão do juiz que não analisa o mérito da demanda.
Há disparidade de entendimentos doutrinários decorre da redação dada pela Lei 11.232/2005 aos artigos 267 e 268 por resolução. A doutrina considerou tal modificação positiva, pois, não obstante irrelevante do ponto de vista prático que tornou o texto positivado mais preciso, por incluir situações em que não havia julgamento de mérito propriamente dito.
Mas, há quem considerou tal modificação inapta a conferir maior rescisão e clareza ao conceito. E, há que também considerou negativa a inovação, pois substituiu as expressões sem qualquer vantagem prática.
A substituição da expressão julgamento pela expressão resolução foi vista como desvantagem pois era termo já consagrado em doutrina e jurisprudência, o qual serve para identificar, no direito brasileiro, modalidade de ato administrativo.
Adiante outra singela modificação, pois no tocante ao artigo 269 do CPC/1973 a reforma legislativa eliminou os termos extingue-se o processo, passando a constar que “haverá resolução de mérito”, nas hipóteses que listou. O mesmo não se pode aduzir no artigo 267, no qual o legislador optou por manter a noção de encerramento do processo, deixando intocada a expressão ” extingue-se o processo”.
A primeira corrente doutrinária defende ter sido insatisfatória a reforma legislativa na alteração do caput do artigo 267, pois o sistema processual não mais está fundado na divisão entre processo de conhecimento e de execução. Nessa linha, não há se cogitar em extinção do processo na definição do conceito de sentença, sob pena de se criar incoerência dentro do sistema sincrético estabelecido.
Portanto, seria mais técnico, portanto, ter sido adotada a expressão “não há resolução de mérito”, à semelhança do caput do artigo 269 do CPC/1973.
Equivocou-se o legislador pátrio ao manter a ideia de extinção do processo em relação à sentença terminativa, posto que considerasse que apenas as sentenças de mérito implicariam na fase posterior de cumprimento de sentença. Ocorre que ao proferir a decisão terminativa, o juiz fixou as verbas sucumbenciais, as quais serão executadas em etapa procedimental posterior. Portanto, mesmo em referência às sentenças processuais é mesmo impreciso se cogitar em encerramento do processo.
Concluiu-se que ainda que não exista a extinção do processo, por meio da interpretação sistemática, ocorre a extinção não do processo, mas sim, do procedimento em relação a cada uma das questões neste debatidas. Assim, a sentença passou a ser definida como o ato que resolvendo ou não o mérito da causa, encerra o ofício de julgar do magistrado em relação a uma pretensão formulada.
Tanto a resolução de questões de mérito ocorre independentemente do resultado do julgamento, quanto aquelas meramente processuais quando acolhidas que implicariam em prolação de sentença, que poderia ser parcial ou total.
Portanto, impossível resolver ou decidir a questão de mérito por meio de decisão interlocutória, a qual teria como conteúdo somente a rejeição de matéria preliminar. Eis que o estrito âmbito da decisão interlocutória de acordo com essa acepção in litteris: o ato do juiz que rejeita alegação envolvendo pressupostos processuais e condições da ação.
É interesse se ter pelo menos uma breve notícia do direito estrangeiro sobre a cisão do julgamento do mérito. Na Itália, há o entendimento de que o legislador não pode apenas limitar a noção de sentença ao ato final de julgamento, pois que em atenção ao princípio de adaptabilidade do processo à causa dá ensejo que o julgador encontra uma situaçãona qual não seja possível esgotar sua função jurisdicional com apenas uma sentença definitiva.
O que encontra amparo no princípio da concentração processual postivado no comma I do art. 277, do CodicediProceduraCivile, segundo o qual ilCollegioneldeliberare sul merito deve decideretutteledomandaproposte. No entanto, conforme aduziu Federico Carpi, Vittorio Colesanti e Michefe Taruffo, há exceções.
Portanto, existem exemplos mais claros de exceção à regra da unicidade de julgamento de mérito são os artigos 277, comma 2, e 278 do Codice. De sorte que o CPC italiano prevê expressamente as sentenças parciais no artigo 277, o qual, em seu comma 2, dispõe que o Collegio, ao verificar que algumas demandas prescindam de ulterior instrução, enquanto outras ainda necessitem de maior dilação probatória, poderá decidir imediatamente as que estejam maduras para julgamento.
In casu, afirma a doutrina italiana que decisão parcial que exaure totalmente o pedido em referência à parcelada demanda decidida, sendo dotada de definitividade.
Mas a técnica do julgamento parcela do mérito no direito processual italiano exige dois requisitos, a saber:
- a existência simultânea de demandas maduras para o julgamento e de outras que necessitem de maior instrução probatória;
- o manifesto interesse da parte no imediato julgamento da parcela maduro do objeto litigioso do processo,
Exemplificando, no direito italiano vigente, é amplamente viável que, em demanda contendo pedidos de resolução de contrato e de ressarcimento de danos, o órgão julgador declare a extinção da avença e remeta o pedido indenizatório.
A decisão sobre a parcela restante do mérito não terá qualquer influência sobre aquela já resolvida por sentença parcial.
Existe ainda outra hipótese de julgamento fracionado do mérito no direito italiano. De acordo com o artigo 278,segunda parte, quando o julgador em caso de condenação ilíquida, poderá, desde logo, condenar o réu ao pagamento de quantia que já esteja provada.
Apesar de o Códice identificar essa decisão como uma provvisionale, entende-se que se trata, na verdade, de uma sentenzaparzialedimenrito, apta à aquisição da qualidade de coisa julgada material.
Destaque-se que a maior utilidade do instituto mostra-se significativa vez que reduz o tempo necessário para a satisfação do direito do autor. Ao possibilitar. Ao possibilitar que credor obtenha imediatamente o que já está comprovado, sem que seja necessário aguardar a prova do montante integral do dano, assim, combate a duração patológica da demanda.
Não obstante isso, a corrente doutrinária majoritária opina no sentido de que o órgão julgador não pode cindir o julgamento do mérito, emitindo condannagenerica, sem que haja pedido da parte, sob pena de violação ao princípio da adstrição.
A respeito da aplicação do princípio da fungibilidade recursal que tem estreita relação com o requisito de admissibilidade recursal, denominado também de cabimento. Ensinou Barbosa Moreira que tal requisito é formado por dois aspectos complementares, a saber: o da recorribilidade da decisão e o da propriedade do recurso interposto.
E, para ensejar o juízo positivo de admissibilidade, além de ser obviamente necessário que a decisão comporte algum recurso, cumpre o recurso interposto coincida com aquele que a lei aponta como o adequado ao caso concreto.
Apesar de inexistirem dúvidas sobre a recorribilidade do ato decisório, em verdade, o novo conceito de sentença trouxe grandes divergência a respeito da correta identificação dos provimentos judiciais e, consequentemente, da propriedade ou adequação de recursos contra estes interponíveis, se seria apelação ou agravo de instrumento.
E diante da confusão existente a partir da omissão e ambiguidade do legislador pátrio na promoção da reforma do CPC/1973, o que não é possível atribuir-se às partes. Aliás, a noção de que a parte não poderia ser prejudicada por causa de erro do tribunal surgiu na Alemanha, ao princípio do recurso indiferente(SowohlasauchTheorie).
E, tal concepção prevaleceu sobre a teoria objetiva, pela qual o recurso correto seria mesmo aquele quanto ao aspecto intrínseco da decisão, bem como sobre a subjetiva, segundo a qual o recurso cabível seria aquele considerado correto pelo tribunal.
Então, construiu-se o princípio do maior favor (Grundsatz der Meistbegünstigung) segundo o qual não é aceitável em qualquer hipótese, que a parte venha
ter prejuízo por conta de erro do Judiciário. E, nesse sentido, se o magistrado de forma errônea chama de decisão interlocutória um provimento judicial que, em verdade,
seja sentença, não se pode apenar ou punir a parte simplesmente por ter interposto o agravo de instrumento no lugar da apelação.
E, transportando-se tal noção ao direito pátrio, deve-se igualmente entender que sua aplicação não se limite aos provimentos judiciais, atingindo também as situações geradas
pelo sistema processual, pela lei, que, da mesma forma, não podem jamais prejudicar o recorrente.
Assim, se a parte não pode ser prejudicada em face da indefinição a que não deu causa, deve-se aplicar
o princípio da fungibilidade, antes previsto no artigo 810 do CPC brasileiro de 1939 e, vigeu implicitamente no CPC/1973 e sobreviveu no CPC/2015
vindo até trazer novas hipóteses de aplicação.
O CPC 2015, buscando a primazia do mérito e constatando a inata complexidade do sistema recursal, viabilizou normativamente hipóteses de fungibilidade.
Em verdade segundo o Enunciado 104 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, “o princípio da fungibilidade recursal é compatível com o CPC e alcança todos os recursos, sendo aplicável de ofício.”
Tal adoção normativa se deu com o objetivo de garantir maior aproveitamento dos recursos e corrigir vícios de uma aplicação do princípio sem levar a sério o devido processo constitucional.
O Código Buzaid, de fato, abandonou a expressa adoção do princípio da fungibilidade, pois, considerava que não haveria qualquer dúvida a respeito de cabimento de recursos na sistemática processual pátria. No entanto, essa sagrada certeza jamais foi alcançada, tendo surgido diversas questões controvertidas que foram solucionadas satisfatoriamente tanto pela doutrina como pela jurisprudência.
Não obstante, apesar de inexistir regra explícita, a existência da fungibilidade recursal decorria do artigo 250 do CPC/1973, sendo disposição ampla e abrangente relacionada com o princípio da instrumentalidade das formas, E, assim, as formas não são fins em si mesmas, e, sim, vínculos adequados para se galgar os determinados objetivos. Caso esses, tenham sido frustrados devido a eventual irregularidade formal irrelevante.
Além do princípio da instrumentalidade, a fungibilidade recursal é igualmente relacionada aos seguintes princípios processuais: 1. não há nulidade sem prejuízo (pas de nullité sans grief); conservação ou aproveitamento pelo qual as atividades dos órgãos públicos não devem, na medida do possível, ser desperdiçadas; busca da verdade, visto que a maior participação dos sujeitos processuais proporciona um melhor material de cognição ao julgador.
Portanto, diante da insegurança jurídica gestada pela indefinição da correta classificação das decisões judiciais, e, consequentemente, no recurso cabível, se mostra necessária a incidência do princípio da fungibilidade recursal e, não aplicá-lo significaria uma grave violação ao direito de acesso à justiça.
A escolha equivocada do meio processual cabível deve ser mesmo justificável. É o caso em que não haja dúvida sobre a modalidade recursal cabível, portanto, não se trata de erro grosseiro, e nem na manifesta contrariedade com as regras e princípios processuais vigentes. E, ainda, haver a unanimidade da doutrina e da jurisprudência quanto ao cabimento apenas do outro recurso, não escolhido pela parte.
Apesar de que sob a vigência do CPC/1939, o conceito de erro grosseiro evoluíra para a noção de dúvida objetiva, que era identificada na sensível divergência existente no âmbito doutrinário e jurisprudencial sobre o meio adequado. E, também com o Còdigo Buzaid, a fungibilidade recursal não mais se limitava à seara recursal, aplicando-se, também a todos os demais meios processuais.