O Sistema Nacional de Cultura não estava originalmente previsto no corpo da Constituição Federal de 1988. Ele foi colocado ali por meio da Emenda Constitucional nº 71, de 2012, plasmado no art. 216-A da CR/88, acrescentando, portanto, mais um (extenso) artigo à seção II, chamada “Da Cultura”, do capítulo III da Carta, cujo nome é “Da Educação, da Cultura e do Desporto”.

Entendemos que a “mens” do artigo não foi apenas a de complementar os dois anteriores, mas, também, a de criar um verdadeiro complexo axiológico e estrutural para se fazer valer, na prática, a questão da Cultura, em nosso país, de tal arte que o § 3º do dispositivo em comento previu a disposição de uma lei federal, a 12.343/2010, a fim de regulamentar o tema, criando, em seu bojo, o Plano Nacional de Cultura (PNC) e o Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC).

O legislador infraconstitucional foi sábio ao outorgar, originalmente, um prazo de dez anos para a revisão do Plano Nacional de Cultura, como se depreende logo do primeiro artigo da lei. Revisões periódicas em dispositivos desta natureza são salutares. Um decênio é tempo suficiente para se ter uma série histórica e checar-se onde houve ou não falhas. No caso do nosso aparelhamento cultural, é fácil perceber questões de verticalização e dificuldade de se estabelecer um pacto com todos os municípios brasileiros, a fim de fazer valer, de fato, um sistema.

Publicada no dia 1º/12, a Medida Provisória 1.012/2020 alargou o tempo do art. 1º da lei do PNC em mais dois anos. Isso significa: o prazo fatal de revisão do Plano dar-se-á com o fim do atual Governo Federal que pouco ou nada tem feito em prol da Cultura. Ademais, haverá mesmo preocupação em se rever um diploma legislativo em um ano eminentemente tomado pelo debate das eleições que, prevemos, continuará acalorado? Sendo que, a rigor, sequer uma pasta de Cultura temos direito?

A publicação de uma tal medida mostra, de fato, o descrédito para com o tema. Em um ideal, a despeito do vírus, dever-se-ia cumprir o preceito legal, mas, infelizmente, moramos em um país em que mesmo o próprio legislador não o faz, dando um mau exemplo que vem de cima. É totalmente possível conectar pessoas responsáveis (a rigor, a máquina da burocracia continua a rodar). Em suma: uma lástima tal situação, desonerada, certamente, com a “desculpa da pandemia”. Esperamos que, após esse biênio, acrescido ao preceito original, a lei seja cumprida, com a revisão do Plano e a participação dos tantos atores culturais do nosso país.