Resumo: O presente texto tenta explicar o atual perfil da Previdência Social brasileira, principalmente, em face da Reforma Previdenciária. Com a reforma, o cálculo das novas aposentadorias passa para a média de 100% dos salários. Em alguns casos, somente essa alteração pode diminuir em 15% o valor de uma aposentadoria. Essa regra vai afetar com mais força quem pagou INSS alguns anos como contribuinte individual pelo salário-mínimo. A estratégia neoliberal sacrifica a Previdência Social contemporânea que descumpre os dispositivos constitucionais vigentes.

 

Palavras-chave: Direito Previdenciário. Direito Constitucional. Reforma Previdenciária. Seguridade e Assistência Social. Estado Democrático de Direito.

 

Vige acirrado debate sobre o financiamento da Previdência Social. Especialmente, quando se cogita existir o célebre “rombo na previdência”, o que justificou a Reforma da Previdência a fim de não comprometer o desenvolvimento econômico-social do país, consagra-se nítida tendência de restrição na concessão de benefícios previdenciários.

Há muitos desafios vívidos na seara da proteção social. E, para tanto, é conveniente notar a evolução[1] da Previdência Social, dentro do contexto do Estado contemporâneo. Ressalte-se a crise institucional do Estado e o constrangimento constante promovido aos direitos sociais por meio de políticas neoliberais.

Com base no discurso do déficit passou-se a fomentar o apoio à Reforma da Previdência Social, como se fosse esta a tábua de salvação financeira e fiscal para o país. Dentro as políticas públicas neoliberais não seria mais possível assegurar a preservação da dignidade humana garantida pela Previdência Social, ainda mais sob o pálio da solidariedade social e da justiça social sem esbarrar com enormes dificuldades financeiras do Estado Contemporâneo e suas contínuas restrições orçamentárias.

Indiscutivelmente o tamanho do Estado, notadamente o contemporâneo, reduzindo sua área de atuação, sua soberania, com o fim das fronteiras. Igualmente na Previdência Social, o movimento atual indica o deslocamento da gestão da questão social do Estado para o âmbito privado, especialmente, quando se cogita na privatização da previdência, capitalização, criação de fundos de pensão e, etc., o que traduz uma estratégia neoliberal[2].

Questiona-se se a política pública previdenciária não estaria sucumbindo às estratégias mercadológicas, ao ser reduzida como negócio na esfera privada. É fundamental participar ativamente nos caminhos e rumos dados à previdência social brasileira, em face da ampla reforma já implementada.

Todos foram atingidos pela dita reforma, seja pelos requisitos mais gravosos para a concessão do benefício, seja por uma população mais carente, seja pelo aumento da desigualdade social, seja pela perda da capacidade de consumo, seja pelo possível término de uma previdência pública e solidária.

Trata-se de problema mui complexo e, de forma alguma, seria possível esgotar todos os pontos que mereceriam ser abordados e mais bem esmiuçados. Mas, reconhece-se que os avanços trazidos pelo vigente texto constitucional brasileiro quanto aos direitos sociais e nas políticas de Previdência, que deveriam direcionar recursos no orçamento e a elaboração das legislações para galgar o almejado bem-estar social.

Quando se cogita em proteção social referimo-nos a uma conquista social, a um dever do Estado de garantir meios de sobrevivência quando o cidadão não mais consegue se inserir no mercado de trabalho e propiciar sua subsistência.

A seguridade social está intimamente vinculada à noção de Estado Social, onde há relevante intervenção estatal na busca de conciliação entre o progresso social e a eficiência econômica, para depois indicar como o pensamento neoliberal trouxe efeitos para o campo social e, em particular, para a Previdência Social.

A materialização do Estado Social relaciona-se com processo histórico de muitos anos e que acompanhou o desenvolvimento do projeto liberal, transformando-o em Estado do Bem-Estar Social já na primeira metade do século XX e ganhou definitivos contornos após a Segunda Grande Guerra Mundial.  Há uma constante evolução e, a sua história é composta de mudanças sempre mirando o melhor alcance da função social.

Foi a partir do século XIX, juntamente com o desenvolvimento econômico e técnico-científico do liberalismo, deu-se o agigantamento dos centros urbanos e também o surgimento crescente do proletariado, resultante do desenvolvimento industrial e que serviu de pretexto para mudanças nas atitudes do Estado e contribuiu para a crise gerada pela ortodoxia liberal. O projeto liberal trouxe forte progresso econômico, a valorização da pessoa humana, as técnicas de poder, tal como o poder legal, porém, gerou também uma postura ultraindividualista e tudo refletiu nos movimentos socialistas e mudança de atitude do Estado.

A passagem do Estado Liberal para o Estado Social implicou na transformação do perfil do Estado Mínimo[3], no qual cabia à autoridade pública apenas a manutenção da paz e da segurança, típicos da chamada liberdade negativa. E, então, a partir do século XIX, o Estado passa a assumir as tarefas positivas, prestações públicas, a serem asseguradas aos cidadãos, como os direitos peculiares à cidadania, agindo como ator privilegiado do jogo socioeconômico.

Destaca-se que o Estado Social não nega valores básicos do Estado Liberal, como liberdade, a propriedade individual, a segurança jurídica etc. O que pretende, de fato, é torná-los mais efetivos, partindo do pressuposto de que indivíduo e sociedade não são categorias estanques, isoladas e contraditórias, e que um não poderá se realizar sem o outro. Não há liberdade se esta não for acompanhada de condições existenciais mínimas que tornem possível seu exercício real e efetivo. Nisso se fundamenta a necessidade dessa nova forma de Estado e a insuficiência de uma Estado Mínimo.

Nas derradeiras décadas do século XIX, emergiu a justiça social com suas reivindicações igualitárias que transformam a face do Estado e, consolidou as chamadas liberdades positivas. Ao longo do século XIX, na Europa extinguiu-se a escravidão e as intolerâncias religiosas, garantindo maior tolerância, liberdade de imprensa, liberdade de manifestação e associação, a educação foi ampliada e o voto fora universalizado. Assim foram escritas constituições que limitavam e responsabilizam o Estado e, etc. O que impôs a mudança do Estado Mínimo, e defendeu a intervenção estatal em espaços antes próprios e reservados da iniciativa privada.

Os primeiros marcos identificadores do Estado Social foram na Alemanha[4], como em diversos países, principalmente em razão do tratamento dado às questões de acidente de trabalho.  Entre 1883 a 1889 deu-se importantes leis sociais alemães, sobre o seguro-doença, acidentes de trabalho e a aposentadoria por invalidez[5]. E, o sistema era financiado por contribuições em esquema tripartite (Estado, capital e cidadão) e colocava o Estado como responsável pelo seu cumprimento. Os marcos iniciais vieram a ampliar a semântica do Estado Social, conforme se identifica na obra de Lorenz Von Stein, na metade do século XIX.

Foi significativo o salto qualitativo e quantitativo do Estado Social do Reino Unido, através do Plano Beveridge de 1942, quando nasceu o termo “welfare state’ que é a versão britânica do Estado Social. Na Alemanha o benefício era unicamente para os trabalhadores que contribuíam diretamente para o sistema previdenciário, já o modelo britânico os direitos têm caráter universal, garantindo tipos mínimos de renda a todo cidadão em condições de necessidade, sendo que seu financiamento se dará por meio de impostos e não apenas pela contribuição sobre a folha de pagamento de salários.

No Estado de Bem-Estar Social, a regulamentação a questão social (relações de trabalho, previdência, saneamento básico, educação e saúde) e o papel interventivo e promocional é a sua principal características, sendo que as prestações públicas passam a ser percebidas como uma conquista da cidadania. E, assim desaparece o caráter assistencial da prestação de serviços públicos, que passam a ser vistos como direitos próprios da cidadania.

Pode-se caracterizar o modelo estatal como aquele que garante tipos mínimos de renda, alimentação, saúde, habitação, saúde e educação, a todo cidadão, não mais como caridade, mas como direito. Portanto, o cidadão tem direito a ser garantido o seu bem-estar pela ação positiva do Estado, como afiançador da qualidade de vida do povo.

O Estado passa a intervir na economia atuando como agente regulador e combatente pelos cidadãos, com o fito de estimular a geração de empregos, melhorar relações de trabalho e evitar abusos contra os trabalhadores.

Por fim, ocorre sofisticação desse modelo estatal que se transforma no atual Estado Democrático de Direito[6], assumindo inegável função transformadora da realidade social, o que impõe ao Estado o papel de direcionar sua atuação para construir sociedade menos desigual, e de concretizar a igualdade material.

O atual Estado Democrático de Direito, assumindo ação transformadora da realidade social, emergindo de um aperfeiçoamento do Welfare State, representando a vontade constitucional de sua realização e, há a sua qualificação pela questão da igualdade, impondo à ordem jurídica e à atividade estatal conteúdo utópico de transformação do status quo.

Sublinhe-se que a transformação do Estado fora acompanhada pelo constitucionalismo dando consolidação do Estado Social está intimamente conectada ao constitucionalismo contemporâneo ligado à proteção universal instituída.

Lembremos que enquanto no Estado Liberal, a Constituição disciplinava apenas o poder estatal e os direitos individuais (direitos civis e políticos), a Constituição do Estado Social do século XX passa a disciplina esfera mais ampla, que inclui o poder estatal, a sociedade e o indivíduo. As normas constitucionais passa a tentar conciliar o Estado com a sociedade e, passam a se dirigir para essa e, não mais, para o indivíduo.

Surgiu como resposta ao individualismo do constitucionalismo liberal, o constitucionalismo social que considera como função do Estado a realização da justiça social. Onde os direitos trabalhistas e sociais integram ao texto das Constituições.

E, tal fato representou na época uma novidade para então Direito Constitucional Clássico. A Constituição de Weimar de 1919, na Alemanha foi a precursora desse novo perfil de Estado e trouxe em seu bojo diretrizes básicas para o moderno constitucionalismo social.

Observa-se que o Estado Social terá problemas com sua concretização, dos princípios sociais enunciados no texto constitucional, também terão obstáculos a uma conversão em direitos subjetivos correlatos, diferentemente do que ocorre com os antigos direitos da liberdade, por exemplo, no constitucionalismo liberal.

No Brasil, a Constituição de 1934, já demonstra a influência do modelo de Weimar, com a penetração de princípios que ressaltam o aspecto social ignorado pelas anteriores Constituições brasileiras. Tal inspiração é decisiva para a formulação precoce da forma de Estado Social que o constituinte brasileiro estabeleceu em bases formais.

Quando novas matérias foram inseridas na Constituição de 1934, como o direito ao salário-mínimo, férias anuais remuneradas, indenização em caso de dispensa sem justa causa, amparo à maternidade e à infância, havendo um título destinado à proteção a família, educação e cultura, que foram colocados sob a proteção do Estado.

Posteriormente, com a Constituição brasileira de 1988, seguindo a tradição da de Weimar, deu relevância ao social e, veio buscar sua efetividade, institui novo remédio jurídico constitucional, o mandado de injunção, além do mandado de segurança coletivo, e a ação a inconstitucionalidade por omissão. Assim instituiu-se um Estado que não somente garante os direitos sociais básicos, mas preocupa-se em fazê-los efetivos.

O Estado Social em face de impactos ideológicos e pressões de interesses contrários que buscam enfraquecer sua eficácia e juridicidade dos direitos sociais, tem permanecido como mera utopia. As forças políticas contra o regime constitucional de 1988 intenta introduzir retrocessos no texto constitucional e revogar relevantes progressos sociais, demonstrando que se busca a destruição do Estado Social brasileiro. O que acarreta a pera de mais de meio século de esforços constitucionais para mitigar o quadro de injustiça provocado por desigualdade social abismal.

Não há outro caminho senão reconhecer a condição atual de dependência dos indivíduos em relação às prestações do Estado e fazer com que venha cumprir a tarefa igualitária e distributiva, sem a qual não há nem democracia, nem liberdade. Os direitos básicos sociais realizam a igualdade na sociedade. A igualdade material faz livres aqueles que a liberdade do Estado relevantes, no contexto dos direitos sociais, coo a Previdência Social.

Com a eleição de Bolsonaro para Presidência da República, a reforma previdenciária entrou rapidamente na agenda política e fora logo apontada como sendo tema urgente, iniciando o desmonte da Previdência Social pública.

Nesse sentido, merece menção a Lei 13.846, de 18 de junho de 2019 que instituiu o Programa Especial para análise de benefícios com indícios de irregularidades e dá outras providências.

Logo, em sua exposição dos motivos, o texto afirmou que as medidas são imprescindíveis para garantir a sustentabilidade do sistema atual e para permitir construção de novo modelo que fortaleça a poupança e o desenvolvimento futuro. Os pilares fundamentais da nova previdência seriam combate às fraudes; redução da judicialização, a cobrança de dívidas tributárias previdenciárias, equidade, criação de novo regime previdenciário capitalizado.

Importante alteração é a desconstitucionalização das regras[7] de concessão dos benefícios previdenciários. Em verdade, seria uma regra transitória, sendo que os requisitos dos benefícios, seriam posteriormente disciplinados por lei complementar.

Entre os gastos sociais federais, há nítida divisão entre os setores protegidos por direitos constitucionais, como a previdência e assistência social[8] nos quais a área econômica não possui margens para arbitrar sobre o patamar de gastos. E, há os setores não protegidos, como saúde, saneamento básico, livres para discricionariedade das autoridades monetárias.

Busca-se há muito tempo realizar reformas que eliminem a proteção constitucional e ampliem o âmbito de arbitragem da área econômica na redução do patamar para gastos sociais.

Quanto à fixação de uma idade mínima é necessário considerar que a reforma previdenciária realizada pela Emenda Constitucional 20/1998 que, adotou duas alternativas para aposentadoria. Uma por idade, aos 65 anos para homens e 60 anos para a mulheres.

E, outra aposentadoria por tempo de contribuição (trinta e cinco anos tempo de contribuição para homem, e trinta, para a mulher). Nesse caso, até que os contribuintes atinjam 65/60 anos, incide o fator previdenciário. Portanto, nesse caso, temos o fator que suprime parcela do valor do benefício e incentiva a postergação da data de aposentadoria.

Deve-se considerar que a aposentadoria por tempo de contribuição é acessível para parcela restrita da população brasileira, que entrou no mercado de trabalho no período de crescimento econômico nacional elevado, baixo desemprego e maior taxa de formalização do emprego.

Outra proposta é a criação de regime de capitalização da previdência, de contribuição definida e de caráter obrigatório, para que cada trabalhador constitua sua poupança individual, em total conflito com o princípio da solidariedade que vige na Previdência Social. É chamado de novo regime de previdência social e seria implementado ao Regime Geral e Regime Próprio de Previdência Social[9], com gestão das reservas feitas por entidades públicas e privadas, à escolha do trabalhador.

Em tempo cumpre diferenciar a proposta de capitalização a previdência complementar da capitalização a previdência, a primeira já é existente dentro dos Regimes Próprios de Previdência social, cuja cobertura se dá no valor acima do teto do benefício do Regime Geral de Previdência. E difere do esquema de complementariedade que é assumido por vários países, com a capitalização se sobrepondo a um pilar de benefícios universais e outro pilar contributivo, em sistema de repartição. Não garante ampla cobertura, nem em nível de proteção desejável e, transfere todos os riscos para os trabalhadores. A aposentadoria ficará exposta às típicas oscilações do mercado financeiro, já que dependerá da taxa de juros ou da remuneração de ativos.

A respeito do déficit previdenciário[10] decorrente de cálculo que não considera todas as receitas que deem ser alocadas para a Previdência Social, conforme fixa a Constituição Federal brasileira de 1988, no artigo 195.

Portanto, o déficit não existe. Se investigados mais ciosamente, os dados estatísticos do Brasil revelam que não há crise financeira na previdência social e, principalmente, não existe crise no sistema de seguridade social.

No caso do sistema previdenciário brasileiro, conforme se vê, tem havido uma situação mais tranquila durante os anos de 1990 a 2005, com alguns escassos momentos de déficit, apesar da política econômica recessiva adotada nesse período, que conduziu aos resultados do quadro econômico desfavorável desse período, o desempenho do sistema previdenciário foi apenas parcialmente prejudicado. Quanto ao conjunto de ações associadas à seguridade social, verifica-se que o sistema como um todo é superavitário nesse período, o que indica que o governo pôde dispor de recursos excedentes.

Ao decidir sobre sua utilização, no entanto, deixou de gastá-los com serviços de saúde, previdência e assistência social, para aplicá-los no orçamento fiscal, contribuindo para os superávits primários elevados dos últimos tempos.

Isto é, o resultado da operação realizada pelo Governo é um déficit que não é real, se for computada a totalidade das fontes de recursos da previdência. Há recursos financeiros excedentes no RGPS[11] e tais recursos poderiam ser utilizados para aperfeiçoar este sistema, em benefício de uma parcela considerável da população da baixa renda.

Ademais, a Constituição federal brasileira da operação realizada pelo governo é um déficit que não é real, principalmente se for computada a totalidade das fontes de recursos da previdência. Há recursos financeiros excedentes no RGPS e tais recursos poderiam ser utilizados para melhorar este sistema, em benefício de uma parcela considerável da população de baixa renda.

Determina o vigente texto constitucional que a Previdência Social deve ser financiada também pelo Estado e fora criada uma base de financiamento diversificada exatamente porque se verificou que a Previdência não poderia depender unicamente das contribuições sobre a folha de salários, já que a massa salarial é a variável que mais se contrai nos tempos de recessão econômica.

Enfim, a não institucionalização da Seguridade Social[12] e de seu respectivo orçamento, conforme previsto na Constituição Federal vigente, o financiamento regressivo do fundo público e a adoção de políticas monetárias e fiscais que beneficiam o capital portador de juris, são determinantes para o não atingimento de um Estado de Bem-Estar Social. Afinal, a não redução das desigualdades sociais, e não universalizando direitos.

A universalidade acabou não sendo a opção das políticas de seguridade social no país que ficaram restritas ao seguro, no caso da previdência, à focalização, na assistência social e, ao desmonte da saúde, uma vez que os recursos que deveriam financiar a universalização foram canalizados para o orçamento fiscal e, deste, para o bolso dos rentistas.

Afinal, o neoliberalismo mudou a orientação da política social. Não se tratando mais de direitos sociais, mas de uma assistência focaliza para aqueles mais pobres, de menor capacidade de pressão. A desintegração do Estado de Bem-Estar se traduz na redução a quantidade e da qualidade de serviços sociais prestados pelo setor público, com exclusão crescente do segmento da população que mais precisa dele.

Enfim, o esvaziamento do setor público[13] e dos seus serviços sociais levarão a um retrocesso histórico, de retorno à família e aos órgãos da sociedade civil sem fins lucrativos, como agentes do bem-estar social.

A solidariedade é conceito de difícil definição e que comporta ampla discussão. Deve-se considerar que a noção de solidariedade é aquela que impõe deveres para com os demais nacionais, fundada na necessidade da divisão dos riscos e, que é fundamento do Estado Social, visando redistribuição de bens.

Os conceitos de Welfare State[14] e de segurança social são passados pela noção de que a sociedade se solidariza com o indivíduo quando o mercado o coloca em dificuldades. O risco a que está sujeito qualquer cidadão deixa de ser problema somente individual e passa constituir responsabilidade social pública[15].

Não se deve olvidar que os sistemas de proteção social implantados com o Estado de Bem-Estar Social não pairam sobre lógica assecuratória existente no regime de capitalização, mas atribuíram lugar à ideia de solidariedade, o que implica a assunção de certos riscos sociais pelo conjunto de coletividade, através de um financiamento pelo tributo.

É o Estado que pode garantir aos trabalhadores condições mínimas de segurança econômica, sem as quais, muito dificilmente teriam o estímulo e as condições para serem provedores de força de trabalho e os consumidores de bens e serviços produzidos. Isto é, o Estado atua para evitar que o mercado fomente a sua própria decadência.

 

Referências

 

AMARO, Luciano. Direito Tributário brasileiro. 21ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016.

BASSIL, Rafael Laynes. Dano moral decorrente da demora para análise do processo administrativo previdenciário perante do INSS. Revista de Direito Social. Sapucaia do Sul: Notadez, n.30. julho/setembro de 2010.

DA SILVA, Enio Moraes. O Estado Democrático de Direito. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/42/167/ril_v42_n167_p213.pdfAcesso em 31.08.2022.

LEITE, Gisele; RICALDE, Mario do Carmo. Reforma a Previdenciária. Campo Grande: Comtemplar, 2020.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 18ª edição. São Paulo: Atlas, 2002.

MORAIS, José Luis Bolzan de. As crises do Estado. O Estado e suas Crises. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

 

 

[1] Com o surgimento da Constituição brasileira de 1934, foi instituída a tríplice forma de custeio (Governo, empregadores e empregados) e a noção do “risco social” (doença, invalidez, velhice e morte); Na Constituição brasileira de 1937   utilizou pela primeira vez a  expressão “seguro social”;  Constituição brasileira de 1946 utilizou a expressão “previdência social”, e instituiu o mecanismo de “contrapartida”,  mantendo a receita e despesas dentro do Sistema da Seguridade Social, bem como passou a proteger expressamente os denominados “riscos sociais”; Surgimento da Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS, de 1960; A Constituição Federal de 1965 instituiu o “auxílio-desemprego”; Em 1971, foi criado o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL),que utilizava recursos do FUNRURAL, por meio da Lei Complementar nº 11/1971; Em 1977, foi criado o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SINPAS).

[2] Os teóricos neoliberais defendem a mínima cobrança de impostos e a privatização dos serviços públicos. A doutrina neoliberal prega a menor participação possível do Estado na economia, dando preferência aos setores privados. O termo foi promulgado em 1938 pelo economista alemão Alexander Rüstow e tornou-se particularmente popular em 1980, depois que líderes como Ronald Reagan (EUA), Margaret Thatcher ( Inglaterra ) e o economista Milton Friedman (EUA).) O enunciaram em seus discursos e em prática, na tentativa de reformular o liberalismo clássico e enfatizar o sistema capitalista. O neoliberalismo considera que a intervenção do estado de mercado promove a ineficiência por meio de regulamentações sobre as indústrias, altos impostos e serviços públicos que não estão sujeitos à competição de mercado. O sistema neoliberal visa capitalizar as ações do Estado e gerar maior produção com menos investimento social. Essa premissa cai em um dilema porque, na prática, não é justa ou equitativa.

[3] A ideia de Estado Mínimo pressupõe um deslocamento das atribuições do Estado perante a economia e a sociedade. Preconiza-se a não-intervenção, e este afastamento em prol da liberdade individual e da competição entre os agentes econômicos, segundo o neoliberalismo, é o pressuposto da prosperidade econômica. Estado mínimo também pode ser conhecido como Estado Liberal. O conceito prega que em uma economia é necessário que o peso do setor público seja mínimo, quando comprado ao setor privado. Dessa forma, o liberalismo tem a lógica de que o Estado, mesmo em seu tamanho reduzido, precisa funcionar para manter os bens públicos que prestam auxílio ao funcionamento dos mercados. Além do mais, s serviços prestados devem servir para a organização da ordem social. O que é feito por meio de pontos bases como educação, saúde e segurança. Os pensadores que são a favor do mercado livre para a economia são os que mais defendem a ideia de Estado mínimo.

[4] O princípio da segurança social tem uma longa história na Alemanha. Já em 1883, sob o regime de Otto von Bismarck, chanceler do Reich, foi introduzido o seguro-doença de empregados e empregadas, sendo que esse preceito de Estado social também foi assentado na Lei Fundamental depois da II Guerra Mundial: o Artigo 20 define a República Federal da Alemanha como sendo um Estado Federado democrático e social”. A Alemanha tem um seguro previdenciário (Rentenversicherung), um seguro de assistência na velhice (Pflegeversicherung) e um excelente sistema de saúde. O seguro social (Sozialversicherung) garante um mínimo de subsistência às pessoas que se encontram em dificuldades financeiras. As despesas sociais somaram em 2019 um pouco mais de um trilhão de euros na Alemanha.

[5] Na Alemanha, as aposentadorias cobertas pelo acordo previdenciário entre Alemanha e Brasil são: Aposentadoria por Invalidez, com critérios iguais ao do Brasil. Aposentadoria Regulamentar por Idade aos 65 anos para quem nasceu antes de 1963 e aos 67 para quem nasceu após 1964, desde que conte com 35 anos de contribuição.

[6] O Estado Democrático de Direito é uma forma de Estado em que a soberania popular é fundamental. Além disso, é marcado pela separação dos poderes estatais, a fim de que o legislativo, executivo e judiciário não se desarmonizem e comprometam a soberania popular. No entendimento de Loewenstein apud Da Silva (1976), o aspecto principal do Estado Democrático Constitucional residiria na distribuição e nos mecanismos institucionais de controle do poder político, fazendo com que este seja efetivamente submetido aos seus destinatários, ou seja, ao povo. Mais à frente em sua primorosa obra, “Teoria da Constituição”, Loewenstein destaca a importância da Constituição na formulação e formalização da ordem fundamental da sociedade estatal, com um indispensável aspecto material em seu elemento fundamental para alcançar-se o controle do poder.

[7] Segundo a regra geral vigente, para as demais hipóteses de aposentadoria o impacto é ainda maior, pois se considera apenas 60% (e não 100%) do resultado da média de todos os salários de contribuição do segurado a partir de julho de 1994 (momento em que se instituiu o real como moeda vigente no Brasil). A partir dos 60% considerados, são acrescidos 2% para cada ano contribuído a mais do que 15 anos para mulheres e 20 anos para homens. Com exceção de quem já tinha direito adquirido, ou seja, que já tinha completado todos os requisitos mínimos em novembro de 2019 para se aposentar, o novo cálculo será aplicado também para os segurados nas regras de transição.

[8] A assistência social é uma política pública, entendida como área de intervenção do Estado, administrada pelo Conselho de Assistência Social, instituída pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 203, a Assistência Social é disciplinada pela Lei nº 8.742/93 LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social) e conceituada como direito do cidadão e dever do Estado que provê os mínimos sociais (necessidades básicas). Esta é a política social que provê o atendimento das necessidades básicas, traduzidas em proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à velhice e à pessoa portadora de deficiência, independentemente de contribuição à Seguridade Social, conforme art. 203 e 204 da Constituição Federal.

[9] É o sistema de previdência específico de cada ente federativo, que assegura, no mínimo, os benefícios de aposentadoria e pensão por morte dos seus segurados, ou seja, dos servidores titulares de cargo efetivo e de seus beneficiários. É o Benefício concedido ao servidor titular de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que completar 70 (setenta) anos de idade. Os proventos serão proporcionais ao tempo de contribuição.

[10] Um déficit da previdência significaria que os gastos do sistema previdenciário são maiores do que sua arrecadação, de forma que o pagamento dos benefícios estaria criando um rombo nos cofres públicos.

Para aqueles que defendem que não existe déficit previdenciário, sustentam que o artigo 195 da Constituição Federal estabelece que a Seguridade Social, que engloba saúde, assistência social e previdência social, é financiada por receitas: do empregador; do trabalhador; concursos e prognósticos; importação de bens ou serviços do exterior; contribuição sobre a renda bruta das empresas – COFINS; contribuição sobre o Lucro Líquido – CSLL; PIS/PASEP.

[11] O RGPS – Regime Geral de Previdência Social é o seguro em que a maioria dos trabalhadores brasileiros estão cadastrados. Com o desconto do INSS todo mês no seu salário, você faz parte do RGPS.  Apesar de muitos problemas, o trabalhador brasileiro tem um sistema de proteção em casos de acidente, doença ou maternidade, além da aposentadoria e pensão para dependentes. Portanto, o principal objetivo do RGPS é oferecer aos seus contribuintes — cidadãos que exercem atividade remunerada, trabalhadores avulsos, empregados domésticos, contribuintes individuais, segurados especiais e facultativos — a garantia de renda para si e para sua família, sobretudo em caso de doença, acidente, velhice, entre outros.

[12] A seguridade social compreende um conjunto integrado e ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. É um conceito estruturante das políticas sociais, cuja principal característica é prezar pela garantia universal da prestação de benefícios e serviços de proteção social pelo Estado.

 

[13] Não é por acaso que um dos aspectos centrais do neoliberalismo é o esvaziamento do Estado, que ocorre através de instrumentos ideológicos e político-econômicos e resulta na diminuição da capacidade governativa. Justificando-se por uma suposta incapacidade dos governos de atender às necessidades e aos desejos dos governados, sendo então proposta a redução da função governamental do Estado. O termo governança, usado nesse contexto, surge como uma forma de cristalizar a redução das capacidades e incumbências do Estado para a de um simples dirigente ou regulador. Para melhor entender o esvaziamento do Estado, o processo histórico envolvido, bem como suas ramificações de profundo impacto no ambiente urbano, este estudo faz uma reconstrução histórica do transporte público em Araraquara – SP. Essa cidade foi escolhida, pois o poder público, por meio da Companhia Troleibus Araraquara (CTA), detinha o monopólio da mobilidade através do sistema de trólebus (ônibus elétrico), que era considerado referência em nível nacional e tinha grande aprovação entre a população. Nesse caso específico, o sistema não poderia ser operado pela iniciativa privada, tanto pela falta de controle sobre a infraestrutura necessária, quanto pela inexistência de veículos semelhantes em suas frotas. Um processo neoliberal de gestão urbana desmantelou a operação pública, com o sucateamento da empresa de trólebus e a troca de matriz energética para veículos a diesel, permitindo que a iniciativa privada pudesse se inserir na dinâmica de mobilidade urbana. Há, nesse processo, um emaranhamento único da evolução dos sistemas de transporte, da troca da matriz energética e do ciclo de especulação imobiliária na cidade, que culmina na privatização dos serviços de transporte público após 57 anos de criação da CTA.

[14] O modelo de Estado do Bem-estar que emergiu na segunda metade do século 20 na Europa Ocidental e se estendeu para outras regiões e países chegou ao auge na década de 1960. No transcurso dos anos 70, porém, esse modelo de Estado entrou em crise. Uma tese amplamente comprovada é a correlação que existe entre o crescimento econômico e a extensão das ofertas de serviços sociais à população. Com base nessa tese, torna-se irrelevante o fato de a economia ser socialista ou capitalista e se o regime é democrático ou ditatorial, pois as estruturas do Estado de Bem-estar estão relacionadas ao grau de desenvolvimento econômico de um determinado país. A crise do “Welfare State” é sobretudo uma crise de caráter financeiro-fiscal Esta tese tem sido afirmada por conservadores tanto quanto por progressistas. Circunscrevendo à questão de financiamento os problemas de continuidade e ampliação dos gastos sociais do Estado, é analisada por diferentes ângulos.

[15] É uma forma de gestão que pretende diminuir os impactos negativos no meio ambiente e das comunidades, preservando recursos ambientais e culturais, respeitando a desigualdade social. Responsabilidade social (RS) é um conceito que engloba as ações voluntárias de empresas que atuam em benefício do seu público, tanto interno quanto externo. As organizações socialmente responsáveis são aquelas que repensam suas posturas, comportamentos e condutas atuais e, dessa forma, se estruturam para colocar em prática atitudes que promovam o bem-estar dos envolvidos. Dentre essas ações, estão aquelas voltadas para o benefício da sociedade e, também, do meio ambiente.