Justa Causa

O contexto de uma relação trabalhista traz para ambos os lados, tanto empregados quanto empregadores, obrigações (legais, contratuais e principiológicas) recíprocas.

A não observância destas obrigações geram consequências que podem culminar com a extinção do contrato de trabalho.

Se o empregador deixa de pagar salários ou de realizar os recolhimentos previdenciários ou de FGTS poderá ver declarada, normalmente por via judicial, a rescisão indireta do contrato de trabalho. De outro lado, se o empregado age de maneira insubordinada, com desídia no desempenho de suas funções, viola segredo funcional, ou qualquer outra conduta descrita no art. 482 da CLT pode ter que suportar a dispensa por justa causa.

Ocorre que a dispensa por justa causa não pode ser aplicada ao alvedrio do empregador.

A primeira questão que deve ser observada nesse debate é que o ordenamento jurídico pátrio consagrou o princípio da continuidade da relação de emprego. Ou seja, via de regra, os contratos de trabalho são de trato sucessivo, continuados e por prazo indeterminado.

As rupturas do pacto laboral devem gozar de previsibilidade (por isso a existência do instituto do aviso prévio) ou devem ser realizadas de forma cautelosa respeitando-se, especialmente, o contraditório e a ampla defesa.

Contudo, o que se vê, diuturnamente, na prática forense é que muitas empresas se utilizam da dispensa por justa causa de forma inadequada. O que leva o Poder Judiciário a declará-las nulas, as revertendo e determinando o pagamento de todas as verbas rescisórias decorrentes de uma dispensa imotivada (sem justa causa).

Nesse sentido, os empregadores precisam ter em mente algumas diretrizes para que eventual aplicação de justa causa não seja revertida na visa judicial.

  1. Ampla e constante divulgação das normas internas da empresa. Todas as normas internas devem estar bem claras para os trabalhadores. Inclusive, é interessante que periodicamente tais normativas sejam relembradas aos funcionários, seja na forma de treinamento, seja na forma de circular interna ou quadro de avisos.

Isso evitará a alegação de que o funcionário desconhecia aquela regra.

  1. Acompanhamento constante da produtividade dos funcionários. É natural que o empregador estipule metas para seus funcionários. O grande problema é quando tais metas não são acompanhadas de perto ou quando não há a informação ao trabalhador que sua produtividade está abaixo do esperado.

São falhas gerenciais graves que acabam por inviabilizar a correta aplicação da justa causa. Afinal, se presentes as deficiências acima não há como, por decorrência lógica, o trabalhador ser penalizado.

  1. Preservação do Contraditório e da Ampla Defesa. Isso é crucial na análise da validade ou não da justa causa! Os empregadores SEMPRE devem levar em conta a versão do empregado. Se possível, tais declarações do trabalhador devem ser registradas por escrito e com testemunhas.

Não é incomum trabalhadores ao buscarem auxílio de advogados informarem que não sabem ao certo as razões que levaram a sua dispensa por justa causa. Isso já é um sinal de que aquela penalidade não foi aplicada corretamente.

Mesmo que o empregador tenha provas contundentes acerca do cometimento do ato por parte do funcionário é altamente recomendável que se este negar o fato seja formalizado uma Comissão para apuração, inclusive com a participação sindical, se for possível.

Neste procedimento o trabalhador poderá apresentar defesa escrita, constituir advogado, requerer provas como a exibição de documentos e depoimento de testemunhas.

Obviamente, trata-se de um procedimento que envolve, via de regra, um alto custo operacional e isso acaba por desestimular as empresas adotarem tal medida.  A reflexão que deve travada deve ser: O que é mais custoso? O deslocamento de recursos humanos e tecnológicos para a correta aplicação do instituto da justa causa ou a condenação judicial da empresa na via judicial, inclusive à título de danos morais e de outras verbas eventualmente não pagas durante o contrato de trabalho?

  1. Rapidez na apuração. Quando o empregador tem ciência da ocorrência de suposta falta empregador deve agir de imediato.

Ressalte-se que o verbo agir aqui não deve ser lido como sinônimo de precipitação, açodamento.

Contudo, um aspecto que é bastante observado trata-se do princípio da imediaticidade da punição. Observados os critérios da proporcionalidade e razoabilidade deve existir um tempo razoável entre a descoberta do fato e a punição. Não se pode admitir que um ato de insubordinação (que é facilmente aferível por meio de documentos e testemunhas) cometido em janeiro de determinado ano somente seja punido em dezembro.

  1. Gradação e Proporcionalidade das penalidades. Apesar de não haver um dispositivo legal específico sobre o tema a jurisprudência consagrou o princípio da gradação das penalidades.

De acordo com esse princípio o empregador deve agir com parcimônia na aplicação das penalidades aos seus funcionários. Não pode aplicar penalidades graves para fatos simples ou não recorrentes.

Logo, deve observar sempre se a conduta do empregado se trata de um caso isolado, pontual ou tal fato se repete por diversos vezes.

Se se tratar de um caso isolado deve optar por punições mais brandas, como a advertência verbal, advertência por escrito ou suspensão por um número determinado de dias.

Nessa esteira, cabe destacar que é incorreto dizer que a justa causa somente pode ser aplicada após a aplicação prévia de punições menos severas. Se a conduta do trabalhador for grave o suficiente (furto de equipamentos da empresa ou violação de segredo profissional, por exemplo) a justa causa pode ser aplicada de plano. Noutro giro, se a conduta é passível de uma correção ou adequação por parte do trabalhador é recomendável que seja punida com uma advertência um uma suspensão.

  1. Equipe de Recursos Humanos capacitada. Obviamente todas as medidas aqui sugeridas somente serão observadas por equipes de recursos humanos altamente capacitadas.

Como acima explicitado, as tomadas de decisões que envolvem o poder diretivo e disciplinar de uma empresa sempre devem ser lastreadas em processos claros, com acompanhamento e justificativas técnicas e guiadas pelo bom senso.

Isso somente é possível com treinamento e capacitação da equipe responsável. Amadorismo e improviso, nesta seara, levam a processos viciados, tomadas de decisões equivocadas e condenações judiciais.