Poucas são as coisas unânimes, mas de uma, certamente, temos todos que concordar: 2020 foi um ano dificílimo, sobretudo, para aqueles que produzem cultura. O binômio vida/economia, objeto de tanta polêmica, acabou por fazer com que muitos fechassem as portas (quando não em definitivo) ou precisassem se reinventar e o setor cultural – sempre alvo fácil em nosso país –  foi o que mais sentiu esses efeitos. A esperança foi dada pela Lei Aldir Blanc (14.017/2020) que, não sem algumas polêmicas, deu certo alento à classe.

Até onde este articulista conseguiu apurar, o repasse, por parte do Governo Estadual, conseguiu se dar de maneira eficaz. Algumas prefeituras, também, fizeram uso da totalidade da verba, incluindo no interior. O Espírito Santo tem a vantagem de ser um estado pequeno, contanto com 78 municípios. Imagino, claro, que houve problemas técnicos (ou de outras ordens) em muitas cidades. Aliás, há quem diga que a Aldir Blanc faria valer o Sistema Nacional de Cultura (art. 216-A CF/88), do qual já tanto falamos. Até o momento, no entanto, isso não aconteceu plenamente.

Foi promulgada, no apagar das luzes do ano passado, a MP 1.019. Ela alterou alguns prazos da Lei Aldir Blanc, o que, em princípio, pode se constituir em um alívio para gestores e beneficiados. No entanto, o Prof. Mário Pragmácio, em artigo do IBDCult (Instituto Brasileiro de Direitos Culturais), citando o também professor Humberto Cunha, sublinha os perigos da criação de novas obrigações legais, que podem servir para criar verdadeiras ciladas àqueles que não cumprirem as tais exigências. Os professores falam, até, em “criminalização do setor cultural”, com a dificuldade nas prestações de contas e, logo, de aplicação de sanções previstas em lei.

Há, também, a gestão dos novos prefeitos, alguns dos quais, contando com um discurso de “austeridade”, têm em mente sacrificar, como de hábito, a pasta da cultura. Uma lástima. Primeiro, não se enfrenta crise com austeridade, mas com investimento – e, decorrência lógica, o setor cultural é um dos que mais abriga profissionais criativos, que usam de inovação em seus negócios. Pela sua natureza, o setor cultural se atrofia quando ligado a outras pastas. Ao revés, ele ganha potência, podendo contribuir com geração de emprego e renda.

Por fim, sabemos que a Covid-19 não dará trégua tão cedo. Neste começo de ano, em que as pessoas se aglomeraram durante uma mutação ainda mais transmissível do vírus, prevemos um recrudescimento ainda maior do setor. Esperamos, onde não há consciência, poder haver vacina – e logo! Pena não haver uma vacina para sensibilizar aqueles que teimam em enxergar a cultura como algo supérfluo e até subversivo. Em todo caso, este colunista, parece que não, mas ainda se mantém esperançoso. O ano está só começando.