Processos Trabalhistas

No último dia 27 de junho de 2020 o Ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal concedeu uma liminar na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 58 para fins de suspender o julgamento de todos os processos em curso na Justiça do Trabalho que discutam qual o índice de correção a ser aplicado no débitos trabalhistas resultantes de condenação judicial— a Taxa Referencial (TR) ou o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).

A referida decisão foi anunciada como o prelúdio do fim da Justiça do Trabalho. Seguidas manchetes jornalísticas alardeavam: “Com a decisão do STF, todos os processos trabalhistas estariam automaticamente suspensos!”

De fato, a parte dispositiva da decisão poderia ter sido escrito com mais rigor técnico.

Contudo, temos que salientar que o raciocínio alardeado somente faria sentido nas ações em que o debate acerca do índice de correção seja EXPLICITAMENTE controvertido. Ora, se a parte autora pugna pela aplicação do IPCA-E e a parte requerida não impugna especificamente (a rigor do que determina o artigo 336 do CPC, aplicado subsidiariamente ao Processo do Trabalho) não há razões para a suspensão do processo. Ou ainda se a sentença determina a aplicação de qualquer um dos dois índices e as partes não recorrem desta parte do comando sentencial, há preclusão e, portanto, a suspensão não se mostra razoável.

Além disso, no meu modo particular de ver a questão, se existem dois índices de correção do debito trabalhista cuja controvérsia não está preclusa nos autos não há nenhum impedimento do processo prosseguir considerando o de menor valor, ressalvando-se, contudo, que se a decisão for pelo índice mais rentável os valores passaram por uma adequação oportuna.

Inclusive, tal expediente já é amplamente utilizado em outras situações em que uma questão controvertida precisa ser definida pelos Tribunais Superiores.

Tanto é verdade que esse entendimento foi o manifestado pelo Ministro Gilmar Mendes ao decidir Agravo Regimental interposto pela Procuradoria Geral da República.

O Ministro manteve a decisão integralmente e afirmou que “(a decisão) não impede o regular andamento de processos judiciais, tampouco a produção de atos de execução, adjudicação e transferência patrimonial no que diz respeito à parcela do valor das condenações que se afigura incontroversa pela aplicação de qualquer dos dois índices de correção.”

Com todas as divergências que se possa ter ao Ministro Gilmar Mendes não há sustentar que ele pretendeu o engessamento da Justiça do Trabalho. Basta uma leitura rápida na decisão para entender o seu fundamento.

Vejamos!

Do ponto de vista jurídico, strictu sensu, a controvérsia acerca do adequado índice de correção dos débitos trabalhistas é antiga.

Em 2016 o Tribunal Superior do Trabalho definiu que o IPCA-E deve ser o índice a ser observado.

Ocorre que a Reforma Trabalhista, mesmo com o entendimento recentemente estabelecido pelo TST, inseriu dispositivos que determinavam a utilização da TR.

Ou seja, não há dúvidas que deve haver uma pacificação do referido entendimento e que permitir que cada juiz aplique um índice diverso perpetrando injustiças e insegurança jurídica tanto para trabalhadores, quanto para empresas.

Sob o prisma de política judiciária e de pacificação social o atual cenário impõe uma cautelosa análise acerca do tema. Vejamos o posicionamento do Ministro Gilmar Mendes a esse respeito.

Quanto ao periculum in mora, de fato, o contexto da crise sanitária, econômica e social relacionadas à pandemia da Covid-19 e o início do julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade instaurada no TSTS demonstram a urgência na concessão da Tutela Provisória Incidental postulada. Nesse período recente, o STF tem zelado pela adequação constitucional de medidas extremas que buscam conter os impactos econômicos adversos da crise. Individualmente, tenho defendido, inclusive de forma pública, a necessidade de o Poder Executivo Federal envidar esforços para a aprovação de benefícios sociais temporários que amenizem os impactos econômicos negativos da pandemia do Covid-19. Por fim, considerando o atual cenário de pandemia, entendo que a Justiça do Trabalho terá papel fundamental no enfrentamento das consequências da crise econômica e social, com a estimulação de soluções consensuais e decisões judiciais durante o período em que perdurarem as consequências socioeconômicas da moléstia. É óbvio que o sistema protetivo-constitucional incide em toda e qualquer circunstância. Já tive oportunidade de afirmar que as salvaguardas constitucionais não são obstáculo, mas instrumento de superação dessa crise. O momento exige grandeza para se buscarem soluções viáveis do ponto de vista jurídico, político e econômico. As consequências da pandemia se assemelham a um quadro de guerra e devem ser enfrentadas com desprendimento, altivez e coragem, sob pena de desaguarmos em quadro de convulsão social. Diante da magnitude da crise, a escolha do índice de correção de débitos trabalhistas ganha ainda mais importância. Assim, para a garantia do princípio da segurança jurídica, entendo necessário o deferimento da medida pleiteada, de modo a suspender todos os processos que envolvam a aplicação dos dispositivos legais objeto das ações declaratórias de constitucionalidade nº 58 e 59.

Deste modo, é totalmente equivocada a fala de que os processos trabalhistas estão suspensos.

A expectativa é que na volta do recesso do Judiciário o referido processo possa entrar em pauta para que o Plenário se manifeste respeito do tema com a maior brevidade possível.