DIREITO FUNDAMENTAL
Preocupado com tema que é base para todo cidadão, o legislador da constituição federal debruçou-se sobre este assunto cerca de três décadas atrás. Tratar da saúde é benéfico para toda a sociedade. Tema amplo, repercute em diversas áreas.
A maioria dos governos mundiais não conseguem alcançar a cobertura digna de saúde para toda a sociedade. Necessitando por vezes da atuação do judiciário para a efetivação deste direito previsto na constituição federal. No mundo jurídico, muito tem se debatido acerca da judicialização da saúde com intuito de garantir acesso à saúde sem intervenção do judiciário. Entretanto, a legislação brasileira é ampla e abrangente concernente à saúde e o acesso ao cidadão ao sistema único de saúde.
Como de conhecimento de todos, o período atravessado pelo mundo é totalmente atípico e o executivo brasileiro junto ao poder legislativo, em suas respectivas esferas, tem lançado mão de ferramentas jurídicas e diversas estratégias juntamente com equipes técnicas de saúde, com objetivo de combater o vírus que assola o mundo em velocidade extraordinária, visando minimizar seus efeitos na sociedade.
Entretanto, o estado de maneira ampla, possui o desafio de dar conta deste período sem desatender as demais necessidades atinentes à saúde. Lembrando que todo o atendimento relacionado à saúde tende a ser realizado sem esbarrar nos princípios basilares da administração pública e em consonância com as políticas de saúde. Sendo necessário ainda atenção ao posicionamento atual dos principais tribunais superiores, procurando atuar com a expectativa de evitar a judicialização.
O acesso à saúde para efetivação de serviços emergenciais e eletivos como tratamento, consulta, fornecimento de medicamento e insumo, por vezes ainda precisa ser obtido por intermédio de decisões judiciais. Mesmo com a assertiva do texto legal em nossa carta magna, garantindo a independência dos poderes e sua autonomia de atuação e competência, por vezes o poder judiciário é acionado para imperar e determinar atuação do executivo no que tange ao direito à saúde.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 dispõe em seu artigo 6° e dentre os artigos 196° ao 200° a garantia do acesso à saúde à todo o cidadão. Estabelecido como um dos direitos sociais do artigo 6° saúde está diretamente ligado à dignidade da pessoa humana, ou seja, todo cidadão tem o direito à uma vida digna e para isso, a manutenção de sua saúde é essencial e o estado é o agente garantidor. O artigo 196° assevera saúde como direito de todos e dever do estado, cabendo o estado oferecer condição do cidadão viver com dignidade e, caso necessite, tenha manutenção de sua saúde e que seja ofertada pelo estado.
Como já mencionado em um artigo publicado relacionado à judicialização da saúde, fica evidente que no período de pandemia vivido especificamente no Brasil, tem se notado a atuação do estado para viabilizar o acesso à saúde, garantindo o atendimento amplo sem a necessidade de acionar o judiciário para dirimir grande volume de demandas.
Contudo, para democratizar o acesso à saúde em época impar que o mundo atravessa, garantindo o atendimento à todos sem ocasionar o desencaixe nos cofres públicos, é necessário ponderações em dois princípios básicos na administração pública, a reserva do possível e o mínimo existencial. Se de um lado o estado, figura como gestor do orçamento público e delimita por meio de leis e ações onde o gasto deve ser aplicado em determinado momento, no outro polo surge o usuário do SUS, amparado pelo mínimo existencial, necessário para garantir o exercício do direito à saúde.
Em um cenário de incertezas acerca de cura ou prevenção desta pandemia, agregado à uma enxurrada de notícias sem lastro de certeza, é importante um olhar atento ao caminho jurídico e econômico que o país pode trilhar. A utilização de mecanismos constitucionais ainda não utilizados ou emendas à Constituição a toque de caixa, amparado pelo estado de calamidade pública ou estado de emergência, pode acarretar considerável desembolso financeiro futuro para o contribuinte. Ademais, passado o momento crítico da pandemia, poderá ficar uma legislação esparsa e com lacunas, deixando a cargo do poder judiciário para mais uma vez efetivar o direito.
Fato que administração pública, em suas respectivas esferas e competências, detém enorme responsabilidade neste momento em que é necessário discernir as ponderações de direitos , sob a luz da dignidade da pessoa humana e sem ferir a segurança jurídica construída até o momento.
Todavia, o cidadão não pode ser prejudicado diante deste cenário, tendo o estado dever garantidor de acesso à saúde, independente do momento vivido. Seja cirurgia eletiva, consulta, tratamento e medicamentos, o estado continua obrigado à oferecer o necessário e estabelecido ao cidadão que, diante do estado de calamidade pública, permanece hipossuficiente e dependente do estado.
Noutro norte, não é diferente quando se trata da esfera privada. Mesmo o Brasil adotando o sistema de saúde misto, onde é possível o acesso à saúde diante contraprestação, o cidadão continua tendo o direito de acesso à saúde. Ou seja, diante de uma relação de consumo entre plano de saúde e cliente, este não pode ter suprimido o direito de acesso à saúde diante de particularidades. Mesmo a legislação acerca relação contratual prevendo repactuações diante de fatos supervenientes, o acesso à saúde continua sendo direito fundamental e fatalmente se sobrepõe a legislação infraconstitucional que abarca dispositivos acerca de pactuações que atinge e prejudica direta o cidadão, assolando a dignidade da pessoa humana quando negado uma cirurgia eletiva ou fornecimento de medicamento, com base na justificativa de fato superveniente.
Há de se considerar, entretanto, a preocupação da preservação da saúde quando o procedimento eletivo pleiteado se confronta com o risco de contaminação. Doravante, é necessário análise detida de cada caso para que não ocorra generalização de negativa amparada desta justifica, pois é dever do agente garantidor do acesso à saúde as medidas necessárias de prevenção e não contaminação, ao invés de lançar mão da taxatividade da negativa do atendimento.
Portanto, com toda crise enfrentada mundialmente e o momento delicado que o país atravessa, é importante o envolvimento da população nas políticas sociais e nas medidas que têm sido adotadas nestes dias de crise para que, direito à saúde continue sendo efetivado e que o cidadão não tenha prejuízo no acesso à saúde sobre pretexto não justificável.