Resumo:
O STF decidiu por 9 a 1 que o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal brasileira vigente. Eventuais excessos ou abusos cometidos no exercício da liberdade de expressão e informação deverão ser analisados em cada caso concreto.
Palavras-Chave: Dignidade Humana. Liberdade de Expressão. Direito ao Esquecimento. Caso Aída Curi. Danos Morais. Direito à privacidade. Direito à intimidade.
Abstract:
The STF decided 9 to 1 that the right to be forgotten is incompatible with the current Brazilian Federal Constitution. Any excesses or abuses committed in the exercise of freedom of expression and information must be analyzed in each specific case.
Keywords: Human dignity. Freedom of expression. Right to Forgetfulness. Case Aída Curi. Moral damages. Right to privacy. Right to privacy.
Recentemente, por decisão majoritária (9 a1), o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu que é incompatível[1] com a Constituição Federal Brasileira a noção de direito ao esquecimento que possibilite impedir, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos por meios de comunicação. Segundo a Suprema Corte, eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, com base nos parâmetros constitucionais e na legislação penal e civil.
Portanto, negou-se provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 101606, com repercussão geral[2] reconhecida, em que familiares da vítima de um crime de grande repercussão de 1958 no Rio de Janeiro e buscavam reparação pela reconstituição do caso concreto, em 2004, no programa de televisão chamado Linha Direta, da TV Globo, sem a sua autorização.
Após quatro sessões de debates, o julgamento foi concluído em 11.02.2021, sem a sua autorização expressa dos envolvidos. Após quatro longas sessões de debates, o julgamento foi concluído, com a apresentação de mais cinco votos, como o da Ministra Carmén Lúcia e Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Luiz Fux.
Pontuou a Ministra Carmén Lúcia que não há como extrair do sistema jurídico brasileiro, de forma geral e plena, o esquecimento como direito fundamental limitador da liberdade de expressão e, portanto, como forma de coatar outros direitos à memória coletiva. Referendou ao direito à verdade histórica no âmbito do princípio da solidariedade[3] entre gerações e considerou que não é possível, do ponto de vista jurídico, que uma geração negue à próxima o direito de saber a sua história.
Quem vai saber da escravidão, da violência contra mulher, contra índios, contra gays, senão pelo relato e pela exibição de exemplos específicos para comprovar a existência de agressão, da tortura e do feminicídio.
Acompanhando o relator, Ministro Dias Toffoli, pelo desprovimento do Recurso Extraordinário, o Ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a liberdade da expressão é um direito de capital importância, ligado ao exercício das garantias democráticas.
No seu entendimento, enquanto categoria, o direito ao esquecimento só pode ser apurado caso a caso, em uma ponderação de valores, de maneira a sopesar qual dos dois direitos fundamentais (a liberdade de expressão ou os direitos de personalidade) deve ter prevalência. “A humanidade, ainda que queira suprimir o passado, ainda é obrigada a revivê-lo”, concluiu.
Já por outro viés, o Ministro Gilmar Mendes votou pelo parcial provimento do Recurso Extraordinário, acompanhando a divergência apresentada pelo Ministro Nunes Marques. Com fundamento nos direitos à intimidade e à vida privada, Mendes entendeu que a exposição humilhante ou vexatória de dados, da imagem e do nome de pessoas (autor e vítima) é indenizável, ainda que haja interesse público, histórico e social, devendo o tribunal de origem apreciar o pedido de indenização[4].
O Ministro concluiu que, na hipótese de conflito entre normas constitucionais de igual hierarquia, como no caso, é necessário examinar pontualmente qual deles deve prevalecer para fins de direito de resposta e indenização, sem prejuízo de outros instrumentos a serem aprovados pelo Legislativo.
Por sua vez, o Ministro Marco Aurélio também seguiu o relator. Em seu entendimento, o artigo 220 da Constituição Federal, que assegura a livre manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação está inserido em um capítulo que sinaliza a proteção de direitos.
Não cabe passar a borracha a partir para um verdadeiro obscurantismo e um retrocesso em termos de ares democráticos, avaliou. Segundo o Ministro, os veículos de comunicação têm o dever de retratar o ocorrido. Por essa razão, ele entendeu que decisões do juízo de origem e do órgão revisor não merecem censura, uma vez que a emissora não cometeu ato ilícito.
Para o atual o presidente do STF, Ministro Luiz Fux, é inegável que o direito ao esquecimento é uma decorrência lógica do princípio da dignidade da pessoa humana[5], e quando existe confronto entre valores constitucionais, é preciso eleger a prevalência de um destes.
Para o Ministro, o direito ao esquecimento pode ser aplicado. Mas, no caso dos autos, ele observou que os fatos são notórios e assumiram domínio público, tendo sido retratados não apenas no programa televisivo, mas em livros, revistas e jornais. Por esse motivo, ele acompanhou o relator pelo desprovimento do recurso.
Não participou do julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso, que declarou sua suspeição, por já ter atuado, quando era advogado, em outro processo da ré em situação parecida com a deste julgamento.
Enfim, a tese de repercussão geral firmada no julgamento foi a seguinte:
“É incompatível com a Constituição Federal a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social – analógicos ou digitais.
Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível”.
Cumpre destacar que o primeiro a votar na sessão de 10.2.2021, o Ministro Nunes Marques acompanhou o relator no sentido de que, no Brasil, ainda não existe o direito ao esquecimento como categoria jurídica, individualizada e autônoma, e que cabe ao Poder Legislativo normatizar a imensa quantidade de sutilezas geradas por esse direito.
No entanto, divergiu quanto ao pedido dos recorrentes e votou pelo parcial provimento do recurso para reconhecer aos familiares (de Aída Curi) o direito de indenização por dano moral, a ser fixado na instância de origem.
Ainda acompanhando o relator do Recurso Extraordinário, o Ministro Alexandre de Moraes votou pelo desprovimento total do RE. Para o referido Ministro, o reconhecimento genérico, abstrato e amplo do direito ao esquecimento configura censura prévia.
E, salientou que não há permissão constitucional para limitar preventivamente determinado conteúdo e observou que, por mais que sejam sensíveis, os fatos não podem ser apagados da crônica jornalística, policial e da justiça.
Em relação ao caso concreto, ele entendeu que, apesar da gravidade do ocorrido e do lapso temporal, o programa recontou, no presente, fatos reais e concretos que efetivamente ocorreram no passado de maneira lícita, objetiva, respeitosa e sem deturpação.
Ao votar pela parcial procedência do RE, o Ministro Edson Fachin reconheceu o direito ao esquecimento. Porém, em relação ao caso concreto, entendeu que a pretensão dos familiares da vítima não pode se sobrepor à liberdade de expressão e ao direito à informação.
Para o Ministro Fachin, o direito ao esquecimento decorre de leitura sistemática do conjunto de liberdades e direitos fundamentais, e a informação veiculada no programa televisivo ultrapassa a esfera individual e faz parte de acervo público que envolve, também jornais e revistas.
Segundo o Ministro Fachin, o caso retrata dimensão histórica, conectando passado e futuro de crimes contra a mulher. Afirmou que não houve excesso no relato da emissora nem desrespeito ao direito de personalidade dos familiares, e o programa se manteve na seara própria de discussão pública do caso.
O voto do relator novamente fora seguido integralmente pela Ministra Rosa Weber, para quem liberdade de expressão deve ser plena e contra ela não deve existir restrição arbitrária.
De acordo com a ministra, no Estado Democrático de Direito, a liberdade de expressão é a regra e, sob pena de censura prévia, somente é admitida a sua restrição em situações excepcionais e nos termos da lei, que deverá observar os limites da Constituição em qualquer caso.
Entendeu que a exacerbação do direito ao esquecimento contribui, a longo prazo, para “manter o país culturalmente pobre, a sociedade moralmente imatura e a nação economicamente subdesenvolvida”.
O relator, o Ministro Dias Toffoli votou pelo desprovimento do Recurso Extraordinário, em que se discute o direito ao esquecimento na área cível. Afinal, a ideia de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos é incompatível com a Constituição Federal brasileira de 1988, e eventuais excessos ou abusos devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais.
Único a votar na sessão de hoje, o ministro Dias Toffoli destacou que a veracidade da informação e a licitude da obtenção e do tratamento dos dados pessoais[6] são relevantes para a análise da legalidade de sua utilização.
Para o Ministro Relator, um comando jurídico que estabeleça o tempo como restrição à divulgação de informação verdadeira, obtida licitamente e tratada adequadamente precisa estar previsto em lei, de modo pontual e claro. “Não pode ser fruto apenas de ponderação judicial”, observou.
Segundo Toffoli, admitir o direito ao esquecimento seria restringir, de forma excessiva e peremptória, as liberdades de expressão e de manifestação de pensamento dos autores e o direito de todo cidadão de se manter informado a respeito de fatos relevantes da história social.
Essa possibilidade, conforme o ministro, “equivaleria a atribuir, de forma absoluta e em abstrato, maior peso aos direitos à imagem e à vida privada, em detrimento da liberdade de expressão”. Toffoli destacou que a liberdade de expressão[7] é um direito humano universal e condição para o exercício pleno da cidadania e da autonomia individual.
Segundo o relator, o artigo 220 da Constituição Federal coloca a liberdade de informação jornalística a salvo de qualquer embaraço por meio de lei e explicita que as balizas ao exercício dessa liberdade se restringem aos casos prescritos na própria Constituição. Assim, como regra geral, não são admitidas restrições prévias ao seu exercício.
O ministro lembrou que o STF tem construído jurisprudência consistente em defesa da liberdade de expressão, que deve ser exercida em harmonia com os demais direitos e valores constitucionais, de modo a não alimentar o ódio, a intolerância e a desinformação. Segundo Toffoli, a ponderação em relação ao direito ao esquecimento envolve toda a coletividade, que será cerceada de conhecer os fatos em toda a sua amplitude.
Em relação ao caso concreto tratado no RE, o relator entendeu que, embora constituam uma tragédia familiar, os fatos divulgados são verídicos, fazem parte dos casos notórios de violência na sociedade brasileira e foram obtidos licitamente na época de sua ocorrência.
“O decurso do tempo, por si só, não torna ilícita ou abusiva sua divulgação, ainda que sob nova roupagem jornalística, sob pena de se restringir, desarrazoadamente, o exercício, pela emissora, do direito à liberdade de expressão, de informação e de imprensa”, afirmou.
Ele também entendeu que não foram violados direitos da personalidade, pois não houve divulgação desonrosa à imagem ou ao nome da vítima ou de seus familiares. “Os fatos narrados no programa, lamentavelmente, são verídicos”, ressaltou, e as imagens reais usadas na exibição foram obtidas legitimamente.
De acordo com o relator, todos os crimes são de interesse da sociedade, mas alguns, por seu contexto de brutalidade, tornam-se objeto de documentação social e jornalística. “Sua descrição e seus contornos” são alvo de farto registro que, em princípio, não violam a honra ou a imagem dos envolvidos”, observou.
Segundo seu entendimento, o programa cumpre, ainda, o papel jornalístico de promover questionamentos jurídico-sociais importantes, sobretudo, quando considerado que debates sobre a violência contra a mulher[8] têm fomentado a edição de normas mais rigorosas para esses casos.
Como exemplo sobre a ponderação dos valores constitucionais em discussão, o relator citou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4815[9], em que a Corte afastou a exigência de autorização das pessoas envolvidas em relação a obras biográficas.
No caso de fundo do RE, Toffoli[10] observou que, embora o recurso não trate, propriamente, de biografia audiovisual, mas de programa jornalístico com reconstituição dos fatos por atores, que mescla documentação de época com a apresentação da história da vítima, o mesmo fundamento pode ser aplicado.
Referências.
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[1] Cumpre destacar que afirmar que o direito ao esquecimento é inconstitucional é diferente de afirmar que é incompatível com a Constituição. Afinal, há a colidência de garantias constitucionais, como a liberdade de imprensa e liberdade de expressão, com o direito à privacidade, à intimidade como corolários do princípio da preservação da dignidade humana. Por essa razão, o sopesamento deverá ser feito diante de cada caso concreto. Dos onze membros da Suprema Corte, apenas o Ministro Edson Fachin votou a favor do direito ao esquecimento. A inconstitucionalidade é uma relação contrária de valores e é para nós um valor. Tomando o exemplo da Constituição brasileira, uma norma que suprima o direito de defesa é um desvalor em relação à Constituição e essa relação de contrariedade que a norma mantém com a Constituição é também um desvalor, outro que aquele. Convém distinguir entre a inconstitucionalidade material da inconstitucionalidade formal. A material se apresenta quando a violação é ao conteúdo da Constituição. Uma norma que, por exemplo, permitisse a exploração do trabalho em condições próximas à degradante seria materialmente inconstitucional por afronta ao conteúdo de um dos fundamentos da República, qual seja o valor social do trabalho. Tal inconstitucionalidade persistiria mesmo que a norma seguisse todas as etapas formais do processo legislativo. Já a inconstitucionalidade formal se configura quando algum dos requisitos procedimentais da elaboração normativa é desrespeitado, seja a competência para disciplinar a matéria, seja um quórum específico ou mesmo um pressuposto objetivo para editar o ato normativo. Um exemplo é o pressuposto de relevância e urgência da Medida Provisória, constantemente desrespeitado hodiernamente. O STF não reconhece a inconstitucionalidade superveniente. Para a colenda corte, há que se falar em recepção ou não da norma infraconstitucional pela nova Constituição, uma vez que não seria adequado analisar uma norma produzida segundo um parâmetro de acordo com um novo, numa espécie de anacronismo. (In: CASTRO, Gabriel. Tipos de inconstitucionalidade: você sabe quais são? Disponível em: https://direitodiario.jusbrasil.com.br/artigos/444600467/tipos-de-inconstitucionalidade-voce-sabe-quais-sao Acesso em 12.2.2021).
[2][2] Instituto processual pelo qual se reserva ao STF o julgamento de temas trazidos em recursos extraordinários que apresentem questões relevantes sob o aspecto econômico, político, social ou jurídico e que ultrapassem os interesses subjetivos da causa. A Emenda Constitucional nº 45/2004 incluiu a necessidade de a questão constitucional trazida nos recursos extraordinários possuir repercussão geral para que fosse analisada pelo Supremo Tribunal Federal. O instituto foi regulamentado mediante alterações no Código de Processo Civil e no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. As características do instituto demandam comunicação mais direta entre os órgãos do Poder Judiciário, principalmente no compartilhamento de informações sobre os temas em julgamento e feitos sobrestados e na sistematização das decisões e das ações necessárias à plena efetividade e à uniformização de procedimentos. Nesse sentido, essa sistematização de informações destina-se a auxiliar a padronização de procedimentos no âmbito do Supremo Tribunal Federal e nos demais órgãos do Poder Judiciário, de forma a atender os objetivos da reforma constitucional e a garantir a racionalidade dos trabalhos e a segurança dos jurisdicionados, destinatários maiores da mudança que ora se opera. Em síntese, a disciplina da repercussão geral no vigente Código de Processo Civil brasileiro traz algumas melhorias, como o fim do duplo juízo de admissibilidade, a previsão de prazo para julgamento de mérito de temas-paradigmas e a possibilidade de superação de vícios formais do recurso tempestivo. (In: Sobre a Repercussão Geral. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaRepercussaoGeral&pagina=apresentacao Acesso em 12.2.2021).
[3] Consiste na solidariedade entre as gerações futuras e presentes no sentido de preservar o meio ambiente, atuando de forma sustentável a fim de que as próximas gerações possam continuar usufruindo de nossos recursos naturais. O princípio da solidariedade intergeracional ou princípio ambiental da equidade é um princípio jurídico que rege o Direito Ambiental brasileiro. Seu conteúdo é expresso no dever das gerações presentes em preservar o meio ambiente e adotar condutas sustentáveis no uso dos recursos naturais, com o fim de não privar as futuras gerações da possibilidade de desfrutá-los. Possui fundamento no art. 225 da Constituição Federal do Brasil, bem como é previsto como no Princípio 3 da Declaração do Rio.
[4] Quanto ao direito de indenização dos familiares do Caso Aída Curi cumpre ressaltar que o processo criminal é público e, os fatos bem como as provas também são de conhecimento público. Portanto, não enxergo em meu entendimento o dano extrapatrimonial na exibição do programa televisivo abordando caso concreto e julgado verídico e de conhecimento público. E, submeter à prévia autorização de todos os envolvidos significaria em censura prévia o que tornaria a liberdade de imprensa uma mera utopia.
[5] O direito ao esquecimento é um direito reflexo do princípio da dignidade da pessoa humana e é uma garantia aos direitos da personalidade, como a intimidade, a imagem e a privacidade, por exemplo. Isto significa, dessa maneira, que existe uma relação entre o direito ao esquecimento e os meios de comunicação. O direito ao esquecimento é considerado por alguns doutrinadores como uma das novas modalidades dos direitos da personalidade no qual encontra fundamental na dignidade humana. Assim, tal direito visa resguardar os fatos passados do agente, para que estes não sejam amplamente divulgados, determinando assim, o direito à privacidade e intimidade. O direito ao esquecimento teria origem na ideia de privacidade. Contudo, com o surgimento de novas tecnologias, teria se desenvolvido como um direito de personalidade autônomo, com base no princípio da dignidade da pessoa humana, insculpido no artigo 1º, III da CF/1988. Visa proteger a privacidade do indivíduo, impedindo que sejam eternamente armazenados fatos e informações a seu respeito. Porém, deve-se atentar que a noção de privacidade não é uniforme no tempo, daí o surgimento de novas concepções de sociedade interfere na definição desse direito. Para as soluções para controvérsias geradas na sociedade contemporânea, onde Bauman sustenta a existência de um rompimento da divisão sacrossanta anteriormente vigente entre a esfera pública e a privada. (In: BAUMAN, Zygmunt. Danos colaterais: desigualdades sociais numa era global. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2013, p.108).
[6] A LGPD é a lei nº 13.709, aprovada em agosto de 2018 e com vigência a partir de agosto de 2020. Para entender a importância do assunto, é necessário saber que a nova lei quer criar um cenário de segurança jurídica, com a padronização de normas e práticas, para promover a proteção, de forma igualitária e dentro do país e no mundo, aos dados pessoais de todo cidadão que esteja no Brasil. E, para que não haja confusão, a lei traz logo de cara o que são dados pessoais, define que há alguns desses dados sujeitos a cuidados ainda mais específicos, como os sensíveis e os sobre crianças e adolescentes, e que dados tratados tanto nos meios físicos como nos digitais estão sujeitos à regulação. Os seguintes dados pessoais são considerados «sensíveis» e estão sujeitos a condições de tratamento específicas: dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, opiniões políticas e convicções religiosas ou filosóficas; dados relativos à vida sexual ou orientação sexual da pessoa. Pessoas físicas que tratam dados com objetivos pessoais, acadêmicos, artísticos ou jornalísticos não serão afetados (os dados precisam ser tratados de forma anônima, entretanto), bem como em casos de segurança pública ou do Estado, de defesa nacional ou de investigação criminal.
[7] No voto do Ministro Toffoli, in litteris: As novas regras da UE incluirão disposições explícitas que garantam o respeito pela liberdade de expressão e informação. Afinal, há muitos anos sou a Comissária da Comunicação Social da UE e nunca transigirei na luta pelos direitos fundamentais da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa. Isto também se aplica ao domínio da proteção de dados, que é outro direito fundamental importante, mas não absoluto” (Tradução livre, grifos nossos).
[8] A Lei 11.340/2006, alcunhada de Lei Maria da Penha, tem como objetivo criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher de forma a prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, através de medidas protetivas. A Lei Carolina Dieckman, a Lei 12.737/2012 com intuito de definir crimes cibernéticos no Brasil. Recebeu tal nome, pois na época que o projeto tramitava a atriz teve seu computador invadido e fotografias pessoais divulgadas sem autorização por hackers. A legislação classifica como crime justamente casos como estes: invasão de computadores, tablets, smartphones, conectados ou não à internet, que resulte na obtenção, adulteração ou destruição dos dados e informações. Lei do Minuto Seguinte ou Lei 12.845/2013 e oferece algumas garantias às vítimas de violência sexual, como atendimento imediato pelo SUS, amparo médico, psicológico, social, exames preventivos e o fornecimento de informações sobre direitos legais das vítimas. A legislação garante atendimento emergencial, integral e gratuito às vítimas. Importante ressaltar que não há necessidade de apresentar boletim de ocorrência ou qualquer outro tipo de prova do abuso sofrido – a palavra da vítima basta para que o acolhimento seja feito pelo hospital. A Lei Joanna Maranhão, a Lei 12.650/2015 alterou os prazos quanto à prescrição contra abusos sexuais cometidos contra crianças e adolescentes, de forma que a prescrição só passou a valer após a vítima completar dezoito anos e o prazo para denúncia aumento para vinte anos. O nome é uma referência à nadadora brasileira que sofreu abuso sexual aos nove anos de idade pelo seu treinador. A denúncia feita pela atleta resultou na lei que garante às vítimas mais tempos para denunciar e punir seus abusadores. A Lei do Feminicídio, a Lei 13.104/2015 – Quando uma mulher é morta em decorrência de violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher, fica caracterizado o feminicídio, sendo considerado um crime hediondo em que a pena pode chegar a 30 anos de reclusão. A legislação altera o Código Penal e estabelece o feminicídio como circunstância que qualifica o crime de homicídio. Além disso, ela também o inclui na lista da Lei de Crimes Hediondos. Desta forma, um crime de homicídio simples tem pena de seis meses a 20 anos, já o feminicídio – um homicídio qualificado – pode chegar aos 30 anos.
[9] STF afastou exigência prévia de autorização para biografias. Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4815 e declarou inexigível a autorização prévia para a publicação de biografias. Seguindo o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, a decisão dá interpretação conforme a Constituição da República aos artigos 20 e 21 do Código Civil, em consonância com os direitos fundamentais à liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença de pessoa biografada, relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas). Na ADI 4815, a Associação Nacional dos Editores de Livros (ANEL) sustentava que os artigos 20 e 21 do Código Civil conteriam regras incompatíveis com a liberdade de expressão e de informação. O tema foi objeto de audiência pública convocada pela relatora em novembro de 2013, com a participação de 17 expositores.
[10] No voto do Ministro Toffoli: in litteris (…) “Casos como o de Aída Curi, Ângela Diniz, Daniella Perez, Sandra Gomide, Eloá Pimentel, Marielle Franco e, mais recentemente, da juíza Viviane Vieira, entre tantos outros, não podem e não devem ser esquecidos. ANTE O EXPOSTO, VOTO PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO E PELO INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS FORMULADO CONTRA A RECORRIDA.