Em verdade, a origem da expressão vem do tempo do período imperial, quando o país permaneceu com o tráfico de escravos, apesar de vigiado pela Inglaterra. Durante o Brasil imperial, muitos intelectuais brasileiros propuseram novos ideais com a intenção de reformar o então vigente regime de escravidão. Tais propostas, geralmente, previam uma abolição gradual e também com a fixação dos ex-escravos nas terras dos senhores, ou até mesmo, com a deportação de parte destes para a África.

Enquanto isso, a Inglaterra, forte influenciadora na política e economia em todo mundo, pressionava o Brasil para a extinção do tráfico de escravos. E, suas próprias razões era que os ingleses desejavam que a jovem nação latino-americana crescesse, com o maior número de assalariados que possível, e então, passasse a ser também promissor mercado consumidor para seus produtos industrializados. E, a escravidão rumava na contramão de tais interesses.

Mediante pressão, o Brasil editou em 1831, a chamada Lei Feijó na qual se proibia a importação de escravos. E, a partir daí, parte da costa brasileira passou a ser monitorado por navios ingleses. E, tal vigilância não impediu que o crime continuasse. E, a fiscalização por parte do governo brasileiro fazia tanta vista grossa que se originou a expressão “para inglês ver”.

Ao mesmo tempo que as forças imperiais vigiavam os principais portos na Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco, deixavam de lado outros, como Santos e Paranaguá.

Assim, o tráfico de escravizados não só continuou existindo como ficou muito intenso, principalmente na década de 1840, quando a produção de café em São Paulo requeria grande quantidade de mão de obra.

“Os traficantes e compradores de escravos em toda a década de 1830, e, sobretudo na de 1840, contaram com a leniência do Estado Monárquico Brasileiro para burlar a lei. Delegados de polícia e juízes de paz eram autoridades que tinham a tarefa de reprimir o tráfico ilegal, mas, em geral, ou eles eram compradores de escravos ou eram compadres dos compradores.  Enfim, não tinham interesse na repressão da prática ilegal”, narra a historiadora Joseli Mendonça, professora na Universidade Federal do Paraná e autora de “Cenas da Abolição”. In: ANTONELLI, Diego; atualizado por Penélope Coelho. Vista Grossa Para Escravidão: Entenda a origem da expressão “para inglês ver”. Disponível em: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/vista-grossa-para-escravidao-entenda-origem-da-expressao-para-ingler-ver.phtml  Acesso em 14.5.2021)

As pesquisas históricas credenciadas indicam que cerca de 800 mil africanos foram ilegalmente introduzidos no Brasil de 1831 a 1850. Entre eles, havia muitas crianças e jovens. “Se pensarmos que, entre essas 800 mil pessoas, havia mulheres que geraram filhos escravos, fica difícil calcular a demografia desse crime que se cometeu contra africanos e seus descendentes no Brasil, com a participação direta do Estado brasileiro”.

O tráfico de escravos só reduziu após a Lei Eusébio de Queiroz[1] que entrou em vigor em setembro de 1850 – a promulgação dessa lei também foi resultado da pressão dos ingleses, estabelecendo medidas mais rígidas para a repressão do tráfico de africanos no Império.

“A partir de 1850, essa prática diminuiu consideravelmente, o que prova que, quando houve a ação do Poder Público nesse sentido, o problema foi se resolvendo de maneira efetiva”, complementa a historiadora.

Apesar do esforço do governo inglês, que defendia o fim do tráfico por motivos que vão desde a pressão da opinião pública interna até seus interesses coloniais na África, a lei brasileira permaneceu como letra morta por mais de vinte anos, é o que afirmou Regina Horta, professora de História da Universidade Federal de Minas Gerais, (In:: https://super.abril.com.br/historia/como-surgiu-a-expressao-2/  Acesso em 14.5.2021).

Enfim, “para inglês ver”, significa fingir que fez algo ou fazer malfeito. Surgiu na primeira metade do século XIX, quando a Inglaterra em razão de seus interesses econômicos, tentou abolir a escravidão no mundo. Houaiss define como para efeito de aparência, sem validez.

Já o filólogo João Ribeiro[2] em seu livro intitulado “A língua nacional”, no tempo do Brasil do Império, as autoridades brasileiras, fingindo que cediam às pressões da Inglaterra tomaram providências de mentirinha para combater o tráfico de escravos, negros africanos.

Antenor Nascentes[3], em seu “Tesouro da fraseologia enumerou outras teses, entre estas, referente aos trajes de linho que os ingleses usavam em Pernambuco, diferentes dos de casimira preferidos pela população local, o que levava certos brasileiros brincalhões, sempre que viam um nativo trajando linho, a afirmar que só se vestia assim “para inglês ver”. O estudioso Gilberto Freyre e Afonso Arinos que deram crédito as teses enumeradas por Nascentes, é que foi igualmente apresentada por Pereira da Costa em seu “Vocabulário pernambucano”.

 

[1] A Lei n. 581, de 4 de setembro de 1850, conhecida como Lei Eusébio de Queirós, estabeleceu medidas para a repressão do tráfico de africanos no Império. Sua promulgação é relacionada, sobretudo, às pressões britânicas sobre o governo brasileiro para a extinção da escravidão no país. Em 1807, o comércio de escravos foi proibido pelo governo inglês, que, a partir daí, começou uma campanha pela abolição do tráfico internacional, reunindo vários setores sociais do Império Britânico. Esse movimento teve reflexos já nos primeiros tratados entre a Inglaterra e o governo português, no contexto da transferência da corte lusitana para o Brasil, em 1807. Posteriormente, em 1815 e 1817, foram assinados dois acordos entre Jorge IV, rei da Inglaterra, e d. João VI, que tratavam da proibição do tráfico de escravos ao norte do Equador e da instituição de comissões mistas com o objetivo de julgar as apreensões e libertar os africanos encontrados nos navios apreendidos (MAMIGONIAN, 2009).In: Lei Eusébio de Queirós. Disponível em:http://mapa.an.gov.br/index.php/menu-de-categorias-2/288-lei-euzebio-de queiroz#:~:text=A%20lei%20n.,extin%C3%A7%C3%A3o%20da%20escravid%C3%A3o%20no%20pa%C3%ADs.  Acesso em: 14.5.2021.

[2] João Ribeiro (João Batista Ribeiro de Andrade Fernandes), jornalista, crítico, filólogo, historiador, pintor, tradutor, nasceu em Laranjeiras, SE, em 24 de junho de 1860, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 13 de abril de 1934. Apaixonado pelos assuntos da Filologia e da História, João Ribeiro desde cedo dedicou-se ao magistério. Professor de colégios particulares desde 1881, em 1887 submeteu-se a concurso no Colégio Pedro II, para a cadeira de Português, para a qual escreveu a tese “Morfologia e colocação dos pronomes”. Só foi nomeado, contudo, três anos depois, para a cadeira de História Universal. Foi também professor da Escola Dramática do Distrito Federal, cargo em que ainda estava em exercício quando faleceu. A sua atividade intelectual irá se desdobrar como autor de vasta obra nas áreas da Filologia, da História e do Ensaio. Escrevia então para A Semana, de Valentim de Magalhães, ao lado de Machado de Assis, Lúcio de Mendonça e Rodrigo Otávio, entre outros. Ali publicou os artigos que irão constituir os seus Estudos filológicos (1902).

[3] Antenor de Veras Nascentes (Rio de Janeiro, 19 de junho de 1886 — 6 de setembro de 1972) foi um filólogo, etimólogo, dialetólogo, e lexicógrafo brasileiro de grande importância para o estudo da língua portuguesa. É considerado um dos mais importantes estudiosos da Língua Portuguesa do Brasil no século XX. Ocupou, como fundador, a Cadeira nº 3 da Academia Brasileira de Filologia. Foi ainda o autor do primeiro Dicionário de Português da Academia Brasileira de Letras, de 1967, e suas ideias e proposições acerca da ortografia da língua portuguesa influenciaram as bases da ortografia portuguesa atual. Foi autor ainda de “A saudade portuguesa na toponímia brasileira”, entre muitas outras obras, foi o agraciado com o Prêmio Machado de Assis do ano de 1962.