Poderes do Juiz na ordem processual brasileira
Resumo: O CPC vigente ajustou o modelo do juiz neutro, imparcial, equidistante das partes para, após cognição ampla, plena e exauriente, dizer o direito ao caso concreto com certeza, reconstruindo o passado (historiador) e declarando o valor indenizatório devido ao dano causado. O direito fundamental à adequada tutela jurisdicional exige do juiz uma postura capaz de dar proteção condizente com os preceitos normativos previstos na norma de direito material. Ainda que o processo se ressinta de técnica processual para tal mister, caberá ao juiz empregar esforços para, em respeito ao direito fundamental de proteção, atender efetivamente o que lhe é pleiteado.
Palavras-chave: Constituição Federal brasileira de 1988. CPC/2015. Poderes do Juiz. Prestação jurisdicional. Duração razoável do processo.
Com base na boa e velha doutrina há dois aspectos do vigente Código Civil brasileiro a respeito dos poderes do juiz na condução e direção do processo e ainda os requisitos necessários para a fundamentação de decisões judiciais, os quais mereceram especial atenção do legislador pátrio quando da elaboração do CPC de 2015, já alcunhado de Código Fux.
Lembremos que o tema está fundamentado em diversos princípios constitucionais. A questão da autoridade competente pois a pessoa somente poderá ser processada pela autoridade competente (vide artigo 5, LII, da CF/1988). Não caberá às partes escolherem o juízo, no qual deverá propor a demanda.
E, a matéria é disciplina não apenas no vigente texto constitucional brasileiro, como também em Leis de Organização Judiciária, inclusive pelo artigo 42 do CPC. Afinal, as causas cíveis serão processadas e decididas pelo juiz dentro dos limites de sua competência, ressalvado às partes o direito de instituir o juiz arbitral, na forma da lei.
O princípio do contraditório e da ampla defesa assegura às partes, com os meios e recursos a estar inerentes, o pleno direito de pleitear em juízo. Para tanto, duas são as exigências fundamentais na aplicação escorreita do Direito com ressalva, prevista no artigo 9º do CPC que assegura que não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
O direito à razoável duração do processoi que atende aso principal interesse do jurisdicionado em ver sua causa ser julgada com celeridade, utilizando os meios legais. E, entre outras medidas, para viabilizar tal princípio, o CPC concede ao julgador o poder para limitar o litisconsórcio facultativo, previsto no primeiro parágrafo do artigo 113 do CPC.
Concede, ainda, ao julgador faculdade de dar preferência as ações mais antigas, conforme dispõe o artigo 12 do CPC. E, a fundamentação das decisões judicias que é princípio disciplinado no artigo 92, inciso IX da CF/1988, e expressamente no artigo 11 do CPC.
É relevante traçar e analisar o papel do juiz na condução e direção do processo, que exerce a autoridade e deve ser exercida com segurança, firmeza, imparcialidade, prudência e humildade. Daí, decorre a importância que deu o legislador pátrio ao disciplinar este capítulo do CPC, assegurando ao juiz os poderes indispensáveis para bem exercer suas funções jurisdicionais.
Na condução do processo deve assegurar as partes igualdade de tratamento e não atua em razão de seus interesses ou mesmo escopos pessoais, mas os interesses que motivam o Estado a assumir a função jurisdicional. E, portanto, a imparcialidade constitui a primeira de muitas virtudes exigidas do julgador.
Afinal, o juiz é um dos sujeitos do processoii e representa o Estado e, sua posição é a de impessoalidade e a imparcialidade e, para tanto, caberá ao julgador ocupar o vértice da relação jurídica processual, analisar e apreciar as provas produzidas pelas partes, garantir tratamento igualitário e, ao final, proferir uma solução imparcial, colocando fim não somente no conflito de interesses, mas também, promovendo a efetivação do direito assegurado a uma delas.
Em síntese, a igualdade citada no texto constitucional vigente é a real, substancial, de forma que o juiz deverá tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades.
Outra missão do juiz é velar pela duração razoável do processo, promovendo rápida solução do litígio, utilizando dos meios legais que lhe concede o CPC. E, dois fatores contribuem para a melhor atuação, a saber: a) o preparo dos próprios juízes, de nada adiante uma progressista legislação se a mentalidade dos julgadores não acompanhar devidamente a essa evolução; b) a legislação adequada pode contribuir para evitar a demora do processo, sobretudo, tendo em conta de grande número de leis e que gera extrema dificuldade de interpretação e consequente aumento das demandas judiciais.
Este princípio não admite delongas protelatórias e desnecessárias consistentes em despachos que nada acrescentam, diligências dispensáveis ou inúteis mas, não poderá promover atropelo processual, que venha prejudicar a prestação jurisdicional adequada e justa.
O artigo 4 do CPC dispõe sobre a solução integral do méritoiii bem como a satisfação da pretensão, de modo que o direito fundamental à solução em tempo razoável seja efetivado. Não basta que o processo tramite com celeridade, nem mesmo que a decisão de mérito seja proferida, sendo essencial que, ao final, dentro do prazo razoável, o direito material seja devidamente tutelado.
Outro dever e poder do juiz é de prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir as postulações meramente postulatórias. Assim, o juiz exerce vigilância sobre eventuais desvios que caracterizam a litigância de boa-fé e que também deverá ser verificada quando da interpretação do pedido, até porque é critério essencial de julgamento.
De fato, as medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas que são cabíveis em qualquer obrigação, quer no cumprimento de sentença, quer na execução de título executivo extrajudicial. De ser aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, sempre com a devida observação do contraditório, por meio de decisão judicial fundamentada.
O juiz tem o poder de promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais. E, a autocomposição das partes visa não apenas solucionar a lide, mas também promover a pacificação social e, mediante a transação dentro da demanda ou fora desta, realizada na presença de conciliador ou mediador, por termo presente nos autos.
A fim de facilitar e aperfeiçoar eventual composição por meio de conciliação ou mediação, dependendo do caso concreto, o CPC dispõe que o autor, na peça exordial, se tiver interesse ou não de realizar autocomposição, na audiência prévia, declare a respeito, a fim de que o juiz, desde logo, possa designá-la. Se a manifestação for negativa, assim mesmo o juiz poderá tentar realizar a referida audiência, vide o artigo 139, V do CPC.
Na ausência da manifestação do autor sobre a eventual conciliação ou mediação, descaber ao juiz determinar a emenda da petição inicial, nem tampouco indeferi-la. A propósito da tentativa de conciliação/mediação, recorde-se que não há tempo final para tal procedimento, podendo chegar à composição amigável até a forma diversa daquela em que foi disposta em sentença.
Caberá ao juiz dilatar os prazos judiciais e alterar a ordem da produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de interesses de forma a conferir a maior efetividade à tutela do direito.
Aliás, é sabido que a ordem de produção probatória, quanto a prova testemunhal segue dando-se prioridade as testemunhas do autor, depois as indicadas do réu e, por derradeiro, do Ministério Público, no caso de atuar como fiscal da lei. Não se ignora que a ordem das provas a serem produzidas é a pericial, depois as provas orais e, se for necessária, a inspeção judicial.
Recomenda-se que o juiz deve agir com maior cautela ao aplicar o referido dispositivo legal processual, porque a alteração da ordem na produção probatória poderá acarretar a indevida inversão do ônus da prova, podendo até mesmo em provocar indevidas surpresas a uma das partes. Logo, para efetivar o pedido de dilação de prazos, é preciso existir a motivação necessária, para que o juiz possa melhor fundamentar a decisão judicial que defere a medida.
A propósito, a dilação dos prazos, somente pode ocorrer antes dod término do prazo, vide o artigo 139, parágrafo único do CPC, porém, nada impede que o início do prazo seja adiado, conforme prevê o Enunciado 12 da Primeira Jornada de Direito Processual Civil do CJF. O juiz poderá exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança interna dos fóruns e tribunais.
Aliás, o poder de polícia tem sua origem no Direito Administrativo, porém, o juiz em sua condição de autoridade pública competente tem legitimidade para exercer tal poder e, poderá o juiz usar desse poder para prevenir ou reprimir atos que podem infligir o bom andamento do processo como também do funcionamento escorreito do fórum e tribunal.
Os atos de polícia processual se justificam pela conveniência de que o processo se desenvolva de forma ordenada e segura, além de célere. Esse poder atua sobre pessoas do público que não tenha nenhuma relação de procedência para com os magistrados.
O juiz poderá determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os fatos da causa, hipótese que não incida a pena de confesso. O juiz possui esse poder e não é orientado para formar a prova de confissão. Assim, a parte ao ser interrogada livremente, tem o dever dizer a verdade. Na hipótese, da parte não atender ao chamado do juiz, não é possível, deduzir a partir de sua omissão, a confissão ficta.
Assim, o interrogatório consiste em mecanismo processual de que se vale o julgador para esclarecer os pontos da causa que são relevantes para sua resolução. É diferente, do poder por iniciativa das partes que visam esclarecer as questões postas no processo, após a coleta das provas orais, consistentes em dúvidas e incertezas decorrentes daquelas provas.
O juiz pode determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais é o que está previsto no artigo 317 do CPC que dispõe que, antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício e, acrescenta o artigo 352 do CPC que, verificando a existência de irregularidade ou de vícios sanáveis, o juiz determinará a sua correção em prazo nunca superior a trinta dias.
O CPC ainda, concede ao juiz o poder de sanear vícios, quando, na apelação, o recorrente alegar qualquer dos casos previstos no artigo 485 do CPC cabendo ao juiz no prazo de cinco dias, retratar-se, apreciando os casos apontados pelo apelante.
É dever do juiz, em face da instrumentalidade do processo, sempre que possível, evitar que o processo seja extinto sem resolução do mérito, por falta de pressupostos processuais ou por vícios. Ocorrendo vício sanável ou a ausência de sanável ausência de pressuposto processual, deverá o juiz determinar a correção do dito defeito, dando prosseguimento ao processo.
O juiz deverá quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficial o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do possível os outros legitimados a que se referem o artigo 5 da Lei 7.347/1985 e, o artigo 82 da Lei 8.078/1990, para, se for o caso, promover a propositura da ação coletiva competente.
Esse dispositivo não é novidade no sistema processual, visto que já estava previsto de forma semelhante na Lei da Ação Civil Pública. E, justifica-se porque o juiz em seu julgamento, deverá guiar-se pelo juízo da legalidade, devendo no caso concreto aplicar a norma legal inspirado pelos princípios constitucionais e os direitos fundamentais. E, outros poderes são concedidos ao juiz pelo CPC, a fim de que possa exercer suas funções jurisdicionais, com eficiência, rapidez, aproveitando ao máximo o contido nos autos. Vide ainda os artigos 140 e 141 do CPC e também o artigo 142 do mesmo diploma legal.
Na direção do processo, o juiz promoverá a reunião de processos relativos as ações não conexas, no caso de haver risco de serem proferidas decisões judicias conflitantes ou contraditórias, casos decididos separadamente. Ademais, a indeterminação dos conceitos exigirá a densificação jurisprudencial, sendo o dispositivo útil para promover a segurança jurídica.
Viabilizando a referida reunião, exige-se que, no processo estejam presentes alguns requisitos, sem o que a reunião não poderá ocorrer e, que são os seguintes: a) a ocorrência de hipótese de conexão; b) devem ser observados os requisitos no artigo 311 do CPC; c) as ações podem ser cumuladas na mesma petição inicial; d) o procedimento esteja em estágio que permita a reunião dos processos e cuja competência deva ser relativa.
O juiz poderá de ofício ou a requerimento controlar a validade de convenções previstas e recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade (artigo 190, parágrafo único do CPC).
O juiz deve, desde logo, observar a existência dos requisitos de validade para os atos processuais, em geral, inclusive os de natureza subjetiva, como capacidade processual e ausência de vulnerabilidade e, os de natureza objetiva: causa versando sobre os direitos passíveis de autocomposição, respeito ao formalismo processual com a observância dos limites objetivos ao exercício de autorregulação da vontade no processo.
O juiz corrigirá, de ofício, e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso que se precederá ao recolhimento de custas correspondentes.
Esta faculdade do juiz tem assento na jurisprudência do STJ que permitia a correção do valor da causa de ofício, desde que esteja em dissonância com as regras previstas na lei processual. Permite, dessa forma, ao juiz fazer o controle judicial, para efeito de corrigir o valor da causa, fixando-lhe novo valor, por arbitramento, observadas as regras legais, determinando que a parte recolha as custas referentes à alteração ocorrida.
Se o conhecimento do mérito depender de verificação da existência de fato delituoso, o juiz poderá determinar a suspensão do processo até que se pronuncie a justiça criminal (artigo 315 CPC). A medida processual objetiva evitar a possibilidade de existir decisões conflitantes e, assegurar a coerência lógica entre as decisões judicias no âmbito de suas respectivas competências e firma entendimento no sentido de que procura respeitar num primeiro momento a deliberação da justiça criminal, ao afirmar que poderá o juiz suspender o andamento da ação cível para aguardar o pronunciamento da justiça criminal. Ao afirmar que poderá o juiz suspender o andamento de ação cível para aguardar o pronunciamento da justiça criminal, essa suspensão não poderá ser superior a um ano.
O juiz poderá limitar o número de testemunhas levando em consideração a complexidade da causa e dos fatos individualmente considerados (artigo 357, §7º do CPC). Na decisão de saneamento do processo, ao deferir a produção de prova testemunhal, ao juiz é conferido o poder de limitar o número de testemunhas, a fim de agilizar a prestação jurisdicional, sem prejuízo às partes e desde que sejam observadas as regras expostas do dispositivo em exame.
A norma também abriu a possibilidade de o juiz deferir um número de testemunhas abaixo do máximo previsto no parágrafo sexto do artigo 357 do CPC, mas tal poder deve ser usado com ponderação, considerando que o convencimento, nem sempre se limita ao juiz que produz a prova, mas também àqueles que julgarão no futuro eventual apelação.
O juiz poderá alterar a ordem prevista no caput se, as partes concordarem, vide artigo 456, parágrafo único do CPC. A prova testemunhal é a derradeira a ser produzida na instrução do processo, mas pode tal procedimento ser alterado, desde que mediante o consentimento das partes, evitando, assim, possível arguição de nulidade.
Sem tal consentimento, porém, poderá haver a inversão da ordem estabelecida em lei, tendo em conta que é o juiz o responsável pela direção do processo, tendo o dever de alterar a ordem de produção dos meios de prova, de forma a adequar às necessidades da demanda, assegurando maior efetividade à tutela do direito.
Ressalte-se ainda que essa faculdade concedida ao juiz, de inverter a ordem de oitiva de testemunhas, somente é possível mediante a concordância de ambas as partes. Caso contrário, se a inversão for prejudicial torna-se o depoimento nulo.
O juiz poderá ordenar de ofício, a requerimento da parte, a inquirição de testemunhas referidas nas declarações da parte, ou das testemunhas; acareação de duas ou mais testemunhas ou de alguma delas com a parte, quando sobre o fato determinado que possa influir na decisão da causa, divergirem as suas declarações.
Os acareados serão reperguntados para que expliquem os pontos de divergência, reduzindo-se a termo o ato de acareação. A acareação poderá ser realizada por videoconferência ou por outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, vide o artigo 461 e incisos do CPC.
Já a acareação, também, pode ser realizada, de ofício, ou a requerimento das partes. Quando sobre fatos relevantes divergem nas declarações de duas ou nas testemunhas entre si ou a de algumas com o depoimento da parte. Conclui-se que essas provas visam suprir e complementar as provas já produzidas nos autos, a fim de que o juiz possa, com maior segurança, formar o seu convencimento para o julgamento da causa.
O juiz determinará de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida, vide os parágrafos do artigo 480 do CPC. O juiz ao determinar a realização de nova perícia que será realizada pelas mesmas regras da primeira e terá por objeto os mesmos fatos. Ela tem, por fim, suprir a deficiência probatória das partes, sob pena de comprometer o princípio da imparcialidade do juiz.
A inspeção judicial objetiva captar melhor os fatos pela audição, olfato, paladar ou mesmo tato podendo recair sobre pessoas, coisas e fenômenos. E, a vantagem da inspeção é colocar o juiz imediatamente em contato com a fonte de prova, sem a participação em contato com fonte de prova, sem a participação de terceiros que nem sempre reproduzem com fidelidade, as impressões recebidas.
É um instrumento processo muito usado para dirimir dúvidas e contradições decorrentes de exame de provas produzidas nos autos, que não tem sido usado com frequência pelos julgadores, apesar de sua notória importância.
A respeito dos fundamentos das decisões judiciais é advinda por regra constitucional no inciso X do artigo 93 da CF/1988. Afinal, é pela fundamentação que se pode realizar o efetivo controle pela própria sociedade, que tem o franco interesse na defesa da legitimidade da atuação jurisdicional, como elemento necessário aos anseios constitucionais e democráticos. Portanto, o dever de fundamental possibilita o controle do modus operandi da atividade jurisdicional no tocante da Administração da Justiça.
Algumas inovações foram incluídas no CPC, sobretudo nos parágrafos 1º., 2º e 3º do artigo 489, que se referem à fundamentação das decisões judiciais, na forma de interlocutória ou de sentença.
São mudanças radicais que devem ser analisadas em consonância com os princípios processuais constitucionais e que preveem maior amplitude de poderes concedida ao julgador. Pelo sistema atual, que se afastou daquela moldura de tipicidade anterior, o controle, agora, deve se dar por meio da motivação das decisões judiciais.
Portanto, tanto a interlocutória e a sentença, que são consideradas decisões judiciais, obrigatoriamente, devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade. Porém, a sentença se distingue diametralmente da noção de decisão interlocutória, porque se destina a pôr fim a fase cognitiva do procedimento comum ou extingue a execução, em primeiro grau de jurisdição, podendo ser terminativa ou definitiva.
No artigo 489, incisos I, II e III, do CPC, estão previstos os elementos essenciais da sentença, enquanto, no § 1º., incisos I a VI, do mesmo dispositivo, o CPC relaciona as hipóteses em que não se considera fundamentada qualquer decisão judicial – interlocutória, sentença e acórdão.
A fundamentação da decisão judicial não deverá se limitar à indicação, à reprodução ou à paragrafe de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida. Não haverá fundamentação em qualquer decisão judicial, se esta, simplesmente, repetir a lei, sem dizer expressamente, porque ela se aplica ao caso concreto decidido.
Essa exigência aparece de forma mais aguda, quando se decide com base em norma jurídica, seja lei ou algum princípio, que utiliza, em sua formação verbal em conceito vago ou indeterminado.
Portanto, não se considera fundamentada a decisão que apenas indica, reproduz ou faz uma paráfrase de texto normativo, sem mostrar qual é a relevância do dispositivo citado para a solução do caso concreto, isto é, sem mostrar com qual significado o dispositivo é entendido e sem apontar qual é a sua relação com caso em exame.
Não deverá a fundamentação da decisão judicial empregar conceitos jurídicos indeterminados sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso concreto.
Por representar uma autorização em branco, de tal forma que vai permitir ao julgador decidir a partir de argumentos os mais variados, por exemplo, relacionados à religião, moral, aos preconceitos e outros e, assim, blindar sua decisão com a invocação de um conceito genérico que poderia servir, em tese, para outros dispositivos, ou, quando não, para dispositivos justamente em sentido contrário.
Enfrentar todos os argumentos apresentados pelas partes, é obrigação do julgador. O bom juiz é aquele capaz de persuadir a comunidade jurídica, atribuindo “bons” fundamentos, após considerar todos os pontos de vista relevantes para a decisão do caso concreto, sem prejuízo de apreciar todos os argumentos expostos, a partir das questões preliminares e prejudiciais, tendo em vista, também, que a mesma solução seja adotada para casos semelhantes ou análogos.
É evidente que, se a decisão se presta para justificar qualquer decisão, é porque normalmente não se atém aos fatos concretos alegados na causa que a fundamentação tem por finalidade resolver. Logo, essa decisão não se considerada fundamentada, por absoluto descolamento do caso.
A motivação adequada e efetiva é aquela que contém justificações suficientes sobre as questões de fato e de direito, fundada em “bons argumentos”, não somente para o juiz que pronuncia a decisão, mas também para todos aqueles que possam valorar, posteriormente, as razões que formaram o convencimento judicial.
Além disso, é necessário que casos concretos sejam decididos com base em decisões e fundamentos concretos, sobretudo tendo em conta que, se as partes gastam tempo e recursos próprios e do Judiciário para expor suas razões e apresentar suas provas, não se justifica que os fundamentos da decisão sejam apenas a reprodução de outras decisões. Dessa forma, não se estará provendo jurisdição, mas apenas dando uma falsa impressão de acesso à justiça.
Enfim, a utilização de fundamento, que caberia para embasar qualquer decisão, é proibida pelo CPC – tal expediente era frequente no foro brasileiro. Portanto, doravante não mais se admite essa prática. (CPC, NERY Jr.).
A utilização de precedentes e de enunciados dos tribunais superiores é norma obrigatória. Porém, tal exigência processual não pode ocorrer de modo mecânico, nem impedir que o juízo prolator da decisão promova a possibilidade de melhoria do sistema, sob pena de reduzi-lo a um autômato.
É oportuno destacar que a busca do precedente é descoberta pelo julgador do caso posterior, uma vez que é ele quem dirá, a partir da comparação entre as situações fáticas do caso anterior e do caso a ser julgado, se a razão de decidir daquele é possível de ser aplicada a este como base suficiente para a solução que espera. Além disso, é necessário que o precedente forme uma regra que possa ser extraída daquela decisão que serviu para a resolução de um caso específico e utilizada em outros que tenham semelhanças suficientes. (CPC completo)
Por outro lado, mesmo concordando com a aplicação de precedentes, deve o juiz poder auxiliar na formação dos precedentes, permitindo que apresente novos argumentos, para que o Tribunal possa apreciá-los, embora tenha a obrigação de aplicar o precedente adotado pelas Cortes Superiores.
Sabe-se que não há lógica, nem racionalidade no sistema de precedentes, se a aplicação do precedente for realizada sem o rigoroso comparativo entre as situações fáticas e as questões jurídicas que ensejaram a formação do precedente e as que são objeto de novo julgamento.
Lembremos que é indispensável, também, que o precedente invocado se ajuste ao caso concreto, não se justificando a mera invocação aleatória do precedente judicial como meio adequado para a fundamentação da decisão judicial.
Além disso, que a fundamentação deverá transcender ao caso concreto, pois a decisão judicial tem, por fim, galgar dimensão extraprocessual, tornando-se paradigmática e, em consequência, pautas de conduta à sociedade, a fim de garantir a segurança jurídica.
Ademais, a utilização de precedentes judiciais não significa somente alinhar julgados seja condensados ou não em súmulas) sem individualizar as suas origens, os seus significados e a pertinência que guardam com o caso concreto.
Duas são situações importantes, que devem ser examinadas pelo juiz, referidas nesta norma:
a) deixar de atender à força vinculante do precedente ou de jurisprudência formada mediante os incidentes próprios constitui violação do dever de fidelidade ao direito;
b) superar precedente ou jurisprudência vinculante sem a devida fundamentação constitui violação do dever de fundamentação.
Assim sendo, a decisão pelo uso ou não de súmulas e precedentes é uma tarefa complexa e que depende do caso que se está sendo julgado. Como uma norma pode ou não ser adequada à solução de um caso, súmulas e precedentes, também, não são meios que o julgador possa se utilizar para não ter o trabalho de fundamentar, de forma adequada, suas decisões.
Sobre a aplicação desta regra, há uma exceção a ser apreciada: no âmbito dos Juizados Especiais, as decisões proferidas não dependem de fundamentação (artigo 489/CPC), isto porque, naquele sistema, exige-se que se mencionem os elementos de convicção, seguido de um breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, sem referência ao relatório, e suscinta a fundamentação de decisão na turma recursal, acrescida de dispositivo.
Ressaltar a importância de o magistrado ao elaborar suas decisões não deve jamais ignorar os princípios constitucionais acolhidos no CPC vigente e na CF/1988.
Entre os poderes do juiz veio a possibilidade de impor medidas coercitivas também podem ser empregadas na execução por quantia certa, e inclusive nas ações que tem por objeto prestação pecuniária. Questiona-se quais seriam os critérios para se adotar eventuais medidas executivas atípicas e quais os limites destas sem ofender os direitos fundamentais do executado.
A boa doutrina já delineia o que seria a medida atípica descabida No rol das medidas descabidas, foram mencionadas a “prisão como medida atípica”, a “suspensão do passaporte do executado”, a “suspensão do CPF ou do CNPJ”, o “cancelamento ou suspensão do uso do cartão de crédito”, o “corte de água ou de energia elétrica”.
Como medidas admissíveis, chegou-se a mencionar “suspensão da CNH”, “suspensão de brevê e arrais”, “proibição de contratar com o Poder Judiciário”, “proibição de contratar com o Poder Público”, “multa coercitiva atípica”, intervenção na pessoa jurídica devedora (Luís Eduardo Simardi Fernandes, Poderes do juiz e efetividade da execução civil”, Curitiba: Editora de Direito Contemporâneo, 2022, p. 290-323).
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai definir, sob o rito dos recursos repetitivos, “se, com esteio no artigo 139, IV, do Código de Processo Civil (CPC), é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos”. Foram selecionados dois recursos como representativos da controvérsia, cadastrada como Tema 1.137: os recursos especiais 1.955.539 e 1.955.574, sendo que a relatoria é do ministro Marco Buzzi.
Em resumo, os ensinamentos doutrinários deverão embasar os poderes do juiz seja na direção do processo, desde o exame da petição inicial até a decisão que determina encaminha processo à apreciação da segunda instância, bem como a descrição dos requisitos indispensáveis para a correta elaboração das decisões judiciais atendendo à sua fundamentação e motivação, especialmente, com referência no sentido de serem observados os precedentes judiciais aprovados pelos Tribunais brasileiros na feitura e prolação da sentença.
Referências
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DINAMARCO, Cândido Rangel; CARRILHO LOPES, Bruno Vasconcelos. Teoria Geral do Novo Processo Civil. São Paulo: Malheiros, 2016.
FAGUNDES CUNHA, José Sebastião; BOCHENEK, Antonio César; CAMBI, Eduardo. Novo Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT, 2015.
FERNANDES, Luís Eduardo Simardi. Poderes do juiz e efetividade da execução civil. Curitiba: Editora Direito Contemporâneo, 2022.
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THEODORO JÚNIOR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco; Pedron, Flávio Quinoud. NOVO CPC, Fundamentos e Sistematização. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Sentença. In: WAMBIER,
Luiz Rodrigues, WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Temas
Essenciais do novo CPC. São Paulo: Revista dos
Tribunais. 2. Tiragem.
iA duração razoável do processo visa garantir que os processos seja na área judicial ou administrativa tramitem em prazo razoável e que sejam assegurados os meios para efetivação de rápido andamento dos feitos. Trata-se de prazo temporal considerado adequado para a realização de determinada atividade ou cumprimento de uma obrigação. Trata-se de critério subjetivo podendo variar conforme o contexto e as circunstâncias envolvidas.
iiSujeitos processuais são os componentes da relação jurídica processual – são aqueles que praticam atos de qualquer natureza no processo. Podem tanto ser sujeitos imparciais (juiz, auxiliares da justiça) como sujeitos parciais (partes). Segundo a visão de Enrico Liebman apenas as partes e o juiz são sujeitos do processo. Afora os sujeitos essenciais à formação da relação jurídica processual, há de se considerar a existência de outros que atuam no processo e influenciam a relação entre as partes e o juiz. É o caso do assistente simples e do amicus curiae.
iii“Consagra o art. 6º, sobretudo, o princípio da primazia do julgamento de mérito, já que é por força dele que o Judiciário realiza a garantia constitucional do acesso à justiça, garantia que só se cumpre quando o provimento jurisdicional deságua em ”decisão de mérito justa e efetiva”. Daí por que a regra máxima é a resolução do litígio, e só por extrema impossibilidade de pronunciá-la é que se tolera a excepcional extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 282), a qual, por expressa recomendação do art. 317, nunca será decretada sem que antes se tenha concedido à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de Processo Civil Anotado, 22ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 8)
“Vale destacar que do art. 4o do CPC (e de uma grande série de outros dispositivos, como o art. 317 e o art. 488, entre muitos outros exemplos que poderiam ser indicados) se extrai um outro princípio – infraconstitucional – fundamental para o sistema processual brasileiro: o princípio da primazia da resolução do mérito. É que, como se vê pela leitura do art. 4o, ‘as partes têm o direito de obter [a] solução integral do mérito’. O processo é um método de resolução do caso concreto, e não um mecanismo destinado a impedir que o caso concreto seja solucionado. Assim, deve-se privilegiar, sempre, a resolução do mérito da causa. Extinguir o processo sem resolução do mérito (assim como decretar a nulidade de um ato processual ou não conhecer de um recurso) é algo que só pode ser admitido quando se estiver diante de vício que não se consiga sanar, ou por ser por natureza insanável, ou por se ter aberto a oportunidade para que o mesmo fosse sanado e isso não tenha acontecido. Deve haver, então, sempre que possível, a realização de um esforço para que sejam superados os obstáculos e se desenvolva atividade tendente a permitir a resolução do mérito da causa. É por isso, por exemplo, que se estabelece que no caso de se interpor recurso sem comprovação de recolhimento das custas devidas deve haver a intimação para efetivar o depósito (em dobro, para que não se estimule a prática apenas como mecanismo protelatório) do valor das custas, viabilizando-se deste modo o exame do mérito (art. 1.007, § 4o), ou se afirma que ‘desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485’. Há, pois, no moderno direito processual civil brasileiro, um princípio da primaziada resolução do mérito, o qual, espera-se, seja capaz de produzir resultados bastante positivos no funcionamento do sistema de prestação de justiça civil.”(CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro, 5ª edição, São Paulo: Atlas, 2019, p. 7)