Interpelação x Notificação

Em primeiro lugar, se faz oportuno enunciar que ambos os institutos de interpelação e de notificação podem ser feitos extra ou judicialmente. Caso levados à apreciação do Poder Judiciário, são procedimentos de “jurisdição voluntária”, isto é, um tipo de processo que força o exercício da atividade jurisdicional, mesmo que não esteja caracterizado por um conflito de interesses.

Trata-se, portanto, de processos regidos pelas normas de direito, com vistas a tutelar um interesse subjetivo individual, sobre os quais incidem todos os princípios basilares do ordenamento jurídico que também recaem sobre os processos contenciosos, impondo-se ao juiz a obrigação de interpretar e aplicar o direito objetivo ao caso concreto, levando à sua efetivação.

Em sede de comparação, na “jurisdição contenciosa”, há o comparecimento de uma lide a ser deslindada, enquanto na “jurisdição voluntária”, existe um direito subjetivo individual que busca a tutela jurisdicional. Isso implica a mudança de papel a ser realizado pelo Estado-juiz, uma vez que, no primeiro caso, ele deve analisar qual interesse conflitante merece tutela, enquanto neste último, ele já sabe decerto qual direito colima sua efetivação, restando a ele apurar se os requisitos normativos de validade foram devidamente preenchidos, para que alcance tal direito seus efeitos diante do corpo social.

No que diz respeito aos conceitos de notificação, interpelação e protestos, lecionam Arenhart, Marinoni e Mitidiero que:

São técnicas processuais que servem para manifestação de vontade. Podem ser judiciais ou extrajudiciais. O protesto tem por finalidade afirmar a titularidade de um direito ou manifestar a intenção de exercê-lo. A notificação visa à comunicação de um fato determinado. A interpelação objetiva à produção de efeito jurídico a partir de uma ação ou omissão do interpelado.1

O artigo 726 do Código de Processo Civil preconiza, acerca da notificação, que “quem tiver interesse em manifestar formalmente sua vontade a outrem sobre assunto juridicamente relevante poderá notificar pessoas participantes da mesma relação jurídica, para dar-lhes ciência de seu propósito”.2

Na senda da interpelação, o artigo 727 do dito diploma legal demonstra que, mais do que uma mera notificação, a parte requerente pretende obrigar a parte requerida a fazer ou deixar de fazer o que deseja, de acordo com seu direito.3

Em síntese, a interpelação consiste em mais que cientificar sobre um fato juridicamente relevante (como é o caso da notificação) a alguém com quem mantenha relação jurídica prévia, mas de também induzir uma determinada conduta, a partir da ação ou da omissão do interpelado.

A título de exemplo, um locador de um imóvel pode notificar o locatário (extra ou judicialmente) quando deseja apenas cientificá-lo quanto à proximidade de encerramento do prazo do contrato de locação. Contudo, caso a intenção do locador seja a de que o inquilino deixe o imóvel, bem como seja a de constituí-lo em mora sobre eventuais dívidas, pode lançar mão da interpelação (extra ou judicial).

A regra em ambos os casos é a de ausência de oitiva da parte contrária. Contudo, o artigo 728 do CPC elege dois casos para que seja ouvido o requerido antes do deferimento da notificação: se houver suspeita de que o requerente pretende alcançar, por tal intimação, fim ilícito, ou se tiver sido requerida a averbação da notificação em registro público.4 É mais uma vitória do direito processual em busca de um processo justo, mediante a garantia do contraditório.

Os autores Arenhart, Marinoni e Mitidiero realçam que “realizada a intimação, exaure-se a função do protesto, notificação ou interpelação. (…) Não cabe recurso de apelação”5. Dessa forma, em consonância com o artigo 729, finda o procedimento de notificação ou de interpelação com a simples realização das mesmas, sendo encaminhados os autos ao requerente logo após tal ocorrência.

Referências

1 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sergio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 803.

2 DIDIER Jr., Fredie; PEIXOTO, Ravi Medeiros. Novo Código de Processo Civil de 2015 – Comparativo com o Código de 1973. 2ª ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2016. p. 388.

3 DIDIER Jr., Fredie; PEIXOTO, Ravi Medeiros. Novo Código de Processo Civil de 2015 – Comparativo com o Código de 1973. 2ª ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2016. p. 388.

4 DIDIER Jr., Fredie; PEIXOTO, Ravi Medeiros. Novo Código de Processo Civil de 2015 – Comparativo com o Código de 1973. 2ª ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2016. p. 388.

5 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sergio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 806.