Conforme regra o art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.3/97), se sujeita à pena de detenção (seis meses a três anos) aquele que conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência.
Regra o próprio CTB que restará configurada a embriaguez ao volante quando houver concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue (constatado por meio do exame de sangue) ou igual ou superior a 0,3 miligramas de álcool por litro de ar alveolar (constatado pela realização do teste de alcoolemia/bafômetro). Também regra que tal constatação poderá ser realizada, alternativamente, por meio de sinais que indiquem a alteração da capacidade psicomotora do condutor.
Em relação ao primeiro instrumento posto à disposição das autoridades de trânsito, qual seja, teste do bafômetro, surge à primeira indagação: sou obrigado a produzir provas contra mim mesmo? A resposta é NÃO.
Prescreve o art. 8º, II, g do Pacto de San José da Costa Rica, Tratado Internacional aderido pelo Brasil, que toda pessoa tem direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada.
Já o art. 5º, LXIII da Constituição Federal prescreve que, dentre outros, o preso tem direito a permanecer calado. Apesar de não restar explícito, é extraído de tal regramento que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo, não sendo a recusa em realizar o teste do bafômetro suficiente para caracterização da infração penal em comento.[i]
Verifica-se que tal direito tem sido amplamente exercido, vide informativo da Polícia Militar do Estado de São Paulo divulgando que em 2017 um a cada dez motoristas abordados em blitz de trânsito se recusaram à realização do teste do bafômetro.[ii]
Ressalta-se ainda que a recusa na realização do teste, em atenção ao princípio da não autoincriminação, não pode ser caracterizado como crime de desobediência (art. 330 do Código Penal), já que o não cumprimento a ordem legal de funcionário público visa justamente a não produção probatória contra si.
Porém, conforme já exposto, o CTB prevê outros instrumentos para constatação de alteração da capacidade psicomotora do condutor veicular. E tal previsão se encontra regulamentada pela Resolução nº 432/2013 do CONTRAN, expondo que o agente de trânsito poderá detectar e expor em relatório, dentre outros, os seguintes sinais: sonolência, olhos vermelhos, vômito, soluços, odor de álcool no hálito, fala alterada.
Ou seja, caso um motorista embriagado se negue a realizar o teste do bafômetro, ainda poderá ser responsabilizado criminalmente caso sejam identificados pelo agente de trânsito sinais que caracterizem a alteração da capacidade psicomotora do condutor.
Lembrando que para efeitos penais não há a chamada “tolerância zero”, já que o crime de trânsito só resta configurado quando encontrada determinada quantidade mínima de álcool no organismo.
Podemos então concluir que a melhor alternativa para aqueles que insistem em dirigir após a ingestão de bebidas alcoólicas seria a recusa ao teste do bafômetro, já que não seria possível a prisão em flagrante do motorista, correto? ERRADO!
Além de poder ser constatada a embriaguez ao volante por outros meios que não os invasivos (exame de sangue e teste etílico), o motorista que se recusar à realização do teste se sujeita a uma multa de R$2.934,70 e à suspensão do direito de dirigir por 12 meses, já que a recusa, desde que o agente de trânsito constate sinais de embriaguez, consiste em infração gravíssima (vide artigos 165-A e 258, I, ambos do CTB).
Tal infração de trânsito foi inserida no CTB em 2016 (Lei nº 13.281), quando o art. 165-A tipificou a conduta do motorista que se recusar a ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa no organismo.
Verifica-se o seguinte contrassenso: apesar do princípio extraído da Constituição Federal de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo, a recusa na realização do teste do bafômetro caracteriza infração administrativa.
Apesar da aparente contradição, conclui-se então que não há ilegalidade na aplicação de multa e suspensão do direito de dirigir ao condutor que se recusar a realizar o teste do bafômetro, sendo aceito nos Tribunais pátrios a tese de que o princípio da não autoincriminação tem aplicação mitigada fora da esfera penal.
Assim, tem-se que, apesar de não ser obrigatória a realização do teste do bafômetro, a recomendação ao agente que ingere bebida alcoólica continua sendo a de não conduzir veículo automotor, já que além das possíveis sanções penais e administrativas em caso de flagrante na direção veicular, o sujeito coloca a sua vida e de terceiros em risco.
[i] Posicionamento exposto em HC nº 166.377 julgado no STJ em 10/06/2010.
[ii]FOLHA DE SÃO PAULO. Motoristas recusam cada vez mais o teste de bafômetro para evitar prisão. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/12/1942252-motoristas-recusam-cada-vez-maisoteste-de-bafômetro-para-evitar-prisão.shtml. Acesso em 26 de abril de 2020.