Aspectos Introdutórios

A guerra às drogas foi desencadeada a partir de um erro que consiste em proibir indiscriminadamente substâncias tão distintas quanto maconha e heroína e tratar usuários como criminosos, esta proibição foi difundida em países do mundo todo, inclusive o Brasil.

Em 1937, a maconha foi proibida nos Estados Unidos e iniciou se o combate ao narcotráfico nos moldes atuais.

Como consequência disso, orçamentos bilionários jogados fora, violência intimamente ligada ao crime organizado e expansão das populações carcerárias, aumento da violência e mortes envolvendo policiais, enquanto o consumo de substâncias ilícitas não para de crescer.

CAPÍTULO I

Em meados do século XX o mundo decidiu declarar guerra ás drogas, sem nenhum critério, na legalidade, o que resultou em uma tentativa infrutífera de combate ao tráfico e consumo de drogas. Há que diga que o consumo até aumentou, o fato é que o mesmo jamais foi controlado. Além do mais a forma de combate imposta contra o mercado ilegal de entorpecentes gerou um violência incontrolável principalmente entre as classes sociais mais pobres. O choque entre os traficantes e as forças que reprimem o narcotráfico chega à beira de uma guerra civil.

Os americanos foram pioneiros na criação de políticas modernas para criminalizar o uso de drogas, no ano de 1914, tendo em vista o crescimento do número de dependentes de ópio e cocaína. Após quatro anos, em 1918, foi criada uma comissão para avaliar os efeitos das legislações que visavam colocar os entorpecentes na ilegalidade, e foi contatado que o mercado negro havia tido um crescimento considerável, e não apenas isso, ele estava organizado em todo o país praticando importação e exportação como nunca antes visto, e foi concluído que com a criminalização o consumo de drogas havia aumentado.

Esta repressão iniciada em 1914 que majorava o preço da droga, valorizava o tráfico que por sua vez estimulava o consumo o que aumentava ainda mais a repressão, sob influência americana o combate as drogas foi se multiplicando pelo mundo. Nesse contexto nasceram os cartéis colombianos de cocaína e a população carcerária dos EUA deu um salto de 50 mil para 500 mil entre as décadas de 1970 e 1990, o país chegou ao 1° lugar no ranking de consumidores de drogas.

CAPITULO II

Há uma clara falta de lógica em se criminalizar a cannabis e autorizar o comércio de bebidas alcoólicas e cigarros de nicotina. Há estudos científicos que provam que a substância proveniente da maconha é bem menos tóxica e gera menor dependência que as drogas legalizadas.

Há falta de coragem do legislador para enfrentar o senso comum é visível aliado a completa ignorância cientifica, temos neste caso dois grupos, os dos mal informados e o dos mal intencionados, é preciso iniciar um debate sério e honesto sobre  a legalização da cannabis. Nessa toada, leciona Túlio Vianna:

 

“A legalização da maconha não é de interesse somente dos seus usuários e comerciantes, mas de todos aqueles que não veem sentido em investir dinheiro público em um aparato policial e judiciário para coibir uma droga menos danosa que outras legalizadas. A ilegalidade sustenta parcela significativa dos traficantes brasileiros e, por consequência, boa parte da corrupção policial decorrente da existência destas quadrilhas. A legalização da cannabis não acabará, decerto, com o tráfico das drogas pesadas, mas reduzirá em muito a força das quadrilhas de traficantes que perderão grande parte de sua arrecadação com a venda da maconha.”

É ainda necessário destacar que a guerra às drogas criminalizada a pobreza e intensifica o genocídio da juventude pobre e negra tendo em vista que “bandido” é uma designação imposta pelo estado, feita por quem detêm o poder de definir quem pode ser bandido, é por essa razão que a população carcerária detida pelo crime de tráfico e porte de drogas são por sua maioria homens, negros e pobres, perfil tipicamente estigmatizado pela sociedade e preferido nas abordagens policiais, esse cidadão pobre, em sua maioria negro, percorre pelas ruas das cidades brasileiras sem ser percebido, ignorado pela comunidade, negligenciado pelo poder público, excluídos dos direitos e garantias estabelecidos na constituição federal, sobre esse cidadão paira a nuvem densa e escura da invisibilidade social, A falta de oportunidades socioeconômicas, proveniente de um problema estrutural brasileiro, é parte do cotidiano das pessoas que vivem em favelas e em regiões periféricas. Quando, em uma situação extrema, esse mesmo grupo ultrapassa a linha tênue que leva à criminalidade, a reinserção na sociedade é mais complexa. Paralelo a isso somos surpreendidos todos os dias com manchetes destacando escândalos de corrupção, aviões de milionários transportando toneladas de drogas, moradores de condomínio de classe média alta portando drogas ilícitas e esses atores permanecem impunes o que fortalece ainda mais a ideia de que o “bandido” é uma parcela da sociedade escolhida pela classe economicamente dominante para assumir esse papel. A lógica da guerra as drogas é muito cruel para ambos os lados, no sentido figurado, é como naqueles filmes de guerra onde é o campo de batalha é há tropas de lados opostos e os senhores da guerra montados em seus cavalos, apenas dão a ordem para que a batalha se inicie e aquela multidão se enfrenta, na cena seguinte há muitos corpos espalhados e ninguém pensa em quem são aquelas pessoas, quem pensa nelas na semana seguinte ? de que lado eles estavam? Quem são suas famílias? No Brasil temos a polícia que mais mata e também a que mais morre no mundo, a atuação da polícia no Brasil remonta o período da escravidão onde havia a figura do capitão do mato, que na maioria das vezes era um escravo que possuía alguns privilégios em detrimento dos outros e em razão disso, punia, torturava e perseguia em nome de uma pseudo vantagem socioeconômica, a lógica da segurança pública são homens de preto, matando homens pretos, quase todos pretos,  assistimos uma geração inteira sendo dizimada, quem é essa juventude que está morrendo? Os traficante e usuários de drogas no Brasil, não são condenados por descumprir a lei de drogas, são condenados pelo lugar, pela cor, são condenados por que já estavam condenados, não há lugar nenhum no mundo em que o sistema penitenciário tenha crescido que não tenha sido de forma seletiva, não se combate a pobreza, combate o pobre, a gente prende quem sobrou de um sistema político altamente perverso em um sistema penitenciário seletivo, opressor e racista. É só pobre que comete crime? Ou é só o crime cometido pelo pobre que gera privação de liberdade. Trago nessas linhas um debate e uma reflexão sobre a democracia, não é um debate técnico, não é um debate sobre a legislação é um debate sobre quem a gente quer na sociedade e quem a agente quer nas masmorras e no esquecimento social. A prisão anula qualquer resquício de dignidade, tranca, anula, transforma em número, transforma em coisa, despersonifica completamente. A guerra as drogas mata muito mais que o seu uso, de forma semelhante, escreve Túlio Vianna, in verbis:

“A repressão policial à maconha em menos de 80 anos já causou mais mortes e prejuízos do que o uso da erva jamais poderia ter causado em toda a história da humanidade. Desde a Inquisição e a caça às bruxas o Direito Penal não vinha sendo usado com tanta ignorância no combate a um inimigo tão imaginário. Já é hora de os moralistas admitirem que sua guerra contra a maconha é ainda mais tola do que foi sua guerra contra o álcool na década de 1920. A legalização da maconha é o único armistício possível nesta guerra que já derramou tanto sangue e lágrimas para sustentar um simples tabu.”

No ano de 2006 fora instituído no país a lei 11.343/2006, a Lei de Drogas que veio em substituição ao regramento jurídico de 1976 e trazia uma inovação, a diferenciação entre usuário e traficante. Os crimes definidos pela nova lei também trazia novidades ao passo que a posse para uso pessoal passou a ser considerado um delito de menor potencial ofensivo e o tráfico passou a ser fortemente repreendido. Em relação a posse para uso próprio a lei trouxe uma penalidade diversa da prisão, como a advertência, prestação de serviços a comunidade ou a obrigação de cumprir medidas educativas, já o tráfico, em regra, seria punido com a prisão, com pena de 03 a 05 anos podendo chegar a 15.

O artigo 33 da legislação supramencionada traz como uma das condutas a cessão gratuita de drogas de uma pessoa pra outra, isso não pode ser considerado tráfico, tráfico envolve lucro, é necessário que haja ampla investigação com o escopo de analisar se de fato o sujeito está envolvido com o tráfico de drogas, o que traz a baila a problemática da seletividade penal. A lei deixou de definir o que seria o uso e o que seria o tráfico, trazendo uma disfuncionalidade a legislação e contribuindo ainda mais para o encarceramento em massa de pessoas pobres e em sua maioria negras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema prisional brasileiro retira do sujeito qualquer resquício de dignidade, o transforma em número, em estatísticas e não cumpre o seu papel ressocializador, é urgente que congresso nacional aprofunde o debate sobre a política de combate as drogas sob a ótica da saúde pública e da seletividade penal, enquanto jovens negros e pobres são encarcerados por portarem pequenas quantidades de drogas os verdadeiros traficantes circulam livremente pelos corredores das assembleias legislativas, congresso nacional e pelos espaços de poder do país.

Bibliografia

DESCRIMINALIZAÇÃO das drogas divide especialistas em audiência na Comissão de
Educação. Senado Notícias, Brasília, 18 mar. 2016.

PORTE de droga para consumo próprio não deve ser punido com prisão, diz STJ.
Consultor Jurídico, 21 jan. 2016.

VIANNA, Túlio. Um Outro Direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p.63-68.

______. Lei no 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas
Públicas sobre Drogas – Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido,
atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas
para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e
dá outras providências. Diário Oficial da União, 24 ago. 2006.

______. Decreto no 5.912, de 27 de setembro de 2006. Regulamenta a Lei nº 11.343, de
23 de agosto de 2006, que trata das políticas públicas sobre drogas e da instituição do
Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD, e dá outras providências..
Diário Oficial da União, 28 set. 2006.

 

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Felipe Ferreira dos Santos, Bacharel em Direito pela Faculdade Pitágoras campus Linhares -ES; Pós Graduando em Políticas Públicas e Municipalidade pela Unicesumar; Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil pela Faculdade Vale do Cricaré; Extensão em Formação e Gestão Política pelo Instituto Federal do Espírito Santo; Técnico em Logística pela Faculdade Multivix; Ex Secretário Municipal de Administração e Recursos Humanos, de Ciência, Tecnologia, Inovação, Educação Profissional e Trabalho, além de Gestor de Conta Única Previdenciária, ex Sub Secretário Municipal de Saúde para assuntos Administrativos e Financeiros na Prefeitura Municipal de São Mateus -ES e Advogado militante nas áreas cível, criminal e fazendária, onde adquiri sólida experiência no campo da administração pública e ciências sociais, na qual sou pesquisador. Plataforma Lattes : http://lattes.cnpq.br/3132198067870809