Redação Jurídica
Que o conteúdo de uma peça processual é importante, todo mundo sabe. Estudamos durante bons anos várias vertentes do direito material, a fim de garantir que, quando adentrássemos no mundo da prática forense, nos tornaríamos bons profissionais através do conhecimento das normas jurídicas aplicáveis à vida cotidiana.
Na faculdade, nos é lecionada também a prática processual, que ensina, basicamente, o formato de uma petição jurídica. Aprendemos como deve se desenvolver uma petição inicial, uma contestação, um recurso.
Infelizmente, saber o direito material e o formal não vai, rigorosamente, assegurar que nos tornemos bons profissionais. Explico.
A maioria dos atos praticados na advocacia dentro de um processo é realizada na forma escrita. Dito isso, ainda que a tese apresentada possua respaldo legal ou jurisprudencial e que a peça preencha todos os requisitos formais que lhe são inerentes, é imprescindível que a mensagem que se queira transmitir chegue, de maneira clara e evidente, ao julgador.
Muitas vezes sabemos o que queremos expor, mas, ao transferirmos nossos pensamentos para o papel, o raciocínio se perde e se torna confuso para o leitor. A capacidade de transmitir as ideias na forma escrita é essencial ao profissional do Direito, pois é principalmente através do texto redigido que o processo se forma, tramita e chega ao fim, com o convencimento do julgador.
Além de uma redação “limpa” e objetiva, é importante que a peça processual seja atrativa, em termos visuais. Um bom alinhamento de texto, uma letra que proporcione uma leitura fluida (em forma e tamanho), uma organização dos parágrafos, dos títulos e dos tópicos, são pequenos detalhes que fazem a diferença no momento de convencer o leitor. E poucos param para refletir sobre isso!
A sobrecarga de processos no Poder Judiciário é um fator a ser levado em conta na hora de minutar a sua petição. Se ponha no lugar do julgador por um minuto: são incontáveis processos esperando para serem resolvidos e você passa todo o seu período de trabalho lendo peças processuais. Qual petição você vai se sentir mais confortável de ler: uma de escrita leve, objetiva e visualmente “limpa” ou uma confusa, desalinhada e desorganizada?
Pensando nisso, e considerando que a redação jurídica é uma matéria que, via de regra, não se ensina nas faculdades, desenvolvi 07 (sete) técnicas textuais e argumentativas a serem observadas durante a feitura de uma petição jurídica (ou, veja bem, de qualquer texto que venha a ser utilizado no âmbito da sua profissão). Dar atenção à maneira em que expomos os nossos conhecimentos através da escrita é essencial para atingirmos o resultado pretendido, que no caso da advocacia, é o acolhimento da tese por parte do órgão julgador. Então, vejamos:
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Revise a ortografia – sempre que terminar de redigir uma petição, a releia, no mínimo, duas vezes. Sempre escapam erros de ortografia, inclusive por descuido no momento da digitação, o que pode descredibilizar, ainda que em pequena escala, a sua frase e o sentido que ela queria transmitir. Uma petição sem erros ou descuidos de ortografia, com certeza, demonstra segurança e passa confiabilidade ao profissional.
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Justifique o texto – parece bobeira, mas não é. Um texto justificado transmite a sensação de organização e é visualmente atrativo de se ler. Experimente ler um livro todo sem alinhamento, com o espaçamento despadronizado e as linhas sem qualquer harmonia de formatação. A atenção dada a um texto assim é menor, simplesmente porque o desalinhamento já toma para si um pouco da concentração do leitor. Volto a dizer, um texto visualmente leve e “limpo” atrai maior devotamento e entusiasmo, o que é muito importante quando o que se quer é justamente persuadir o receptor.
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Utilize escrita objetiva e “sem rodeios” – foi-se o tempo em que ser prolixo era algo bom. Lembre-se que o julgador tem uma infinidade de processos para serem analisados, portanto escrever de forma complexa e prolongada não vai ser algo que vai contar ao seu favor. Tampouco rechear a petição de jurisprudência e de doutrina. Enxugue ao máximo a sua redação com ênfase nos seus argumentos principais, os quais, inclusive, podem ser repetidos de maneira resumida em uma conclusão ao final da peça. Assim, quando o julgador estiver sentenciando o processo, ele poderá voltar ao seu resumo e ter maior clareza dos fundamentos que lhe foram expostos durante a peça processual. Mantenha a linguagem simples e utilize exemplos que tragam a teoria ao caso concreto, como se estivesse em uma conversa com o julgador a fim de tentar convencê-lo. Dispense palavras difíceis e expressões confusas (por exemplo, com o uso de duas palavras negativas numa mesma sentença, como “isso não é incontestável” – prefira afirmações positivas, como “isso é contestável”). Lembre-se sempre que o intuito é persuadir o leitor, então use todas as ferramentas possíveis para facilitar o alcance do seu objetivo.
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Evite expressões apelativas – são muitas as vezes em que no bojo da petição se inserem expressões como “queremos justiça!” ou “senhor juiz, isso é caso de vida ou morte!”. Verdade seja dita: o julgador não vai formar o seu convencimento com base em frases prontas e apelativas. Concentre o seu discurso baseado em fortes argumentos jurídicos, pois são estes que vão te levar ao sucesso no fim do processo.
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Organize o seu texto – provavelmente, você vai perpassar por temas variados durante a sua peça processual. Por isso, é interessante o uso de tópicos, de títulos e subtítulos (divisões dos temas a serem abordados), de tabelas e cálculos quando necessário, dentre outros instrumentos de arranjo textual. Quanto mais “limpa” e organizada a sua petição, melhor.
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Dê destaque aos aspectos mais importantes – imagine que você é o julgador. São várias páginas para ler com a mesma letra dentro de um só processo (sem esquecer os demais que ainda aguardam a sua leitura). Decerto, se não houver qualquer destaque na peça, você poderá passar batido em aspectos e em detalhes possivelmente relevantes para a solução da questão. Portanto, quando a frase for extremamente relevante para a sua argumentação, dê-lhe o devido destaque, seja sublinhando, negritando ou grifando. Isso vai garantir que a ela seja conferida a atenção que merece.
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Explique as jurisprudências e as doutrinas utilizadas: como já dito, não adianta encher a petição de jurisprudência e de trechos de doutrina. De igual forma, não adianta apenas recortá-las e lançá-las à sua peça sem dizer o porquê de elas se encaixaram, exatamente, no caso concreto. Desenvolva o seu raciocínio a partir da jurisprudência ou da doutrina escolhida, traga-o à luz dos contornos da lide em questão, deixe evidente as razões pelas quais deve ser seguido (ou não) o entendimento apresentado. Não se esqueça, também, de procurar os entendimentos mais recentes dos tribunais!
Claro que não existe uma “receita pronta” para te levar ao sucesso no processo de convencimento do julgador. Igualmente, não posso afirmar que as técnicas apresentadas são infalíveis.
Mas, com certeza, uma redação jurídica caprichada e organizada, tanto em conteúdo quanto nos aspectos formais e textuais, torna mais acessível o objetivo do vencimento da causa.